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“Voltamos ao drama de 2012”: Este Orçamento poderá despejar idosos?

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O Governo quer “corrigir as distorções” na legislação do arrendamento urbano, prometendo concluir os processos de transição dos contratos de arrendamento habitacional anteriores a 1990. As associações de idosos e pensionistas estão preocupadas.

No capítulo dedicado à habitação na proposta do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), que o Governo entregou esta quinta-feira, no Parlamento, pode ler-se que vão ser tomadas medidas para concluir a transição dos contratos de arrendamento antigos para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).

Segundo o documento, o Governo pretende “corrigir distorções criadas nos últimos anos na legislação relativa ao arrendamento urbano”, comprometendo-se a “tomar as medidas necessárias para a conclusão dos processos de transição dos contratos de arrendamento habitacional anteriores a 1990”.

Em causa estão os contratos antigos que, na sequência da nova lei do arrendamento, em 2012, transitaram para o NRAU no caso de famílias de rendimentos mais baixos, ou por o arrendatário ter mais de 65 anos ou deficiência com grau de incapacidade igual ou superior a 60%.

Mas essa transição foi um drama. Muitas pessoas que não teriam de transitar para o NRAU, fizeram-no por falta de conhecimentos. Em declarações à Antena 1, Maria do Rosário Gama, da Associação de Pensionistas e Reformados (APRe!), considera que esta medida pode voltar a ter graves consequências, como em 2012.

“São processos administrativos muito complicados e muitas vezes as próprias pessoas acabam por não conseguir resolvê-los, se não tiverem apoio. (…) Quando foi a lei de 2012 em que os senhorios enviavam cartas para os inquilinos para a transição para o novo regime de rendimento urbano; houve muitos inquilinos que não responderam no prazo, acabaram por ter de sair das casas e foi um drama muito grande. Esse drama pode vir a acentuar-se novamente, no caso de haver este descongelamento de rendas”, apontou.

O prazo para esta transição foi sendo prorrogado nos últimos anos, até que a lei do Mais Habitação, aprovada pelo governo de António Costa, em 2023, veio pôr um ponto final na questão, travando a passagem dos contratos antigos e com rendas congeladas para o NRAU.

Também em declarações à Antena 1, ex-ministra da habitação Marina Gonçalves admite que, mesmo que o modelo apresentado pelo atual Governo seja correto, a praticabilidade do mesmo já foi testada em 2012 e correu mal, porque o processo era complexo.

“Em 2012, o processo de transição para o NRAU, podendo os arrendatários opor-se à transição, muitos não o fizeram, porque o processo era complexo e implicava um conjunto de passos que é muito difícil de concretizar. Portanto, mesmo que esse modelo pudesse ser correto, a praticabilidade do mesmo já foi testada em 2012 e sabemos qual foi a consequência para muitas famílias portuguesas”, disse a deputada socialista, acrescentando que esta medida desprotege os mais idosos.

A “Lei Cristas”

O NRAU chegou a Portugal em 2012, com a liberalização do mercado de arrendamento (fruto de pressões externas, da troika), descongelando os contratos anteriores a 1990 e facilitando despejos de quem não pagasse. Os senhorios podiam enviar cartas com aumentos de rendas antigas, dando ao inquilino 30 dias para responder.

O advogado José Fernandes Martins, da Associação dos Inquilinos do Norte, disse, em agosto, ao Jornal de Notícias que a legislação de 2012, também conhecida como Lei Cristas, “tratou as pessoas de idade de forma muito desrespeitosa”.

Na mesma peça, o JN detalha que, em 2023 (últimos números conhecidos), foram feitos no balcão do arrendatário e do senhorio 2.672 pedidos especiais de despejo (mais 17% face a 2022). Na prática isso, resultou em 1.072 despejos.

A lei do arrendamento ainda não protege todos os inquilinos com mais de 65 anos. Para José Fernandes Martins, “só uma alteração legislativa que diga que uma pessoa com mais de 65 anos não pode ser despejada” é que poderá pôr fim a casos de despejo. “Não é o senhorio que tem de garantir o direito à habitação, e quem tem de compensá-lo é o Estado, e não o pobre do cidadão”, acrescentou.

Governo quer reajustar apoios

No novo relatório, o Governo sustenta que a conclusão dos processos de transição “visa repor a justiça no tratamento destas situações”.

O Executivo promete dar o apoio aos arrendatários “em situação de carência suportar a atualização das rendas”.

Mas os apoios “não chegam”

Maria do Rosário Gama afirma que, mesmo com o apoio dado pelo Estado, vai ser difícil suportar as novas rendas: “Essas rendas antigas atingem as pessoas mais velhas e, portanto, aquelas mais vulneráveis (…) Mesmo que haja um subsídio para os arrendatários, nunca cobre a totalidade da renda, portanto acaba por ser uma situação dramática. Eu não sei como é que vai ser resolvido, mas as pessoas mais velhas serão, de facto, muito afetadas”

Também na Antena 1, Isabel Gomes da Confederação Nacional de Reformados Pensionistas e Idosos (MURPI) aponta, igualmente, uma situação previsivelmente dramática: “Há coisas que foram contratualizadas há mais de 30 anos, portanto vai apanhar os reformados que, neste momento, já têm dificuldade em pagar ‘aquele pouco’; se aumentam, fica pior; e, portanto se só os bens é que aumentam e as reformas não, o problema cada vez vai ser maior“.

Marino Gonçalves lembrou ainda, na rádio pública, que a estratégia do Executivo socialista é contrária àquela que o Governo da AD propõe agora, passando por apoiar monetariamente os senhorios em vez de “castigar” os arrendatários, com a subida das rendas: “Aquilo que está hoje em vigor é uma compensação aos senhorios, até um determinado valor, os senhorios já estão protegidos”.

Governo faz esclarecimento

Em declarações à agência Lusa, já nesta sexta-feira, o Governo esclareceu que não vai descongelar as rendas antigas, dos contratos anteriores a 1990, e que não pretende alterar o regime em vigor.

A secretária de Estado da Habitação Patrícia Gonçalves Costa a garantia de que haverá um “tratamento justo tanto para inquilinos como para senhorios” faz-se “assegurando a eficácia do mecanismo de compensação aos senhorios”.

O Governo acrescenta ainda que pretende “garantir um tratamento justo para ambas as partes – inquilinos e senhorios -, criando condições para que os imóveis se mantenham em bom estado e proporcionem melhor qualidade de vida aos inquilinos”.

Vários órgãos de informação e as associações de proprietários leram no relatório da proposta do OE2025 a intenção de se descongelar das rendas antigas, o que obrigou o governo a clarificar que isso não acontecerá.

“Meia” promessa aos pensionistas

O Governo demonstrou-se disponível para atribuir um suplemento extraordinário aos pensionistas no próximo ano, mas só “se houver margem orçamental”.

“Se no próximo ano houver margem orçamental, vamos repetir a medida que tomámos este ano e atribuir um suplemento extraordinário aos pensionistas”, disse o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, na conferência de imprensa de apresentação da proposta de Orçamento de Estado para 2025.

O governante especificou que essa avaliação irá ser feita “no verão”.

Esta intenção já tinha sido manifestada na contraproposta entregue ao PS na semana passada na qual o Governo indicava estar disponível para “atribuir, sempre que possível, aos pensionistas com pensões mais baixas, reforços extraordinários acima do valor da atualização legal”, tal como aconteceu este ano.

No final de agosto, o Governo aprovou a atribuição de um suplemento extraordinário aos pensionistas, cujo valor varia entre 200 e 100 euros e que é pago neste mês de outubro a cerca de 2,4 milhões de pessoas.

Miguel Esteves, ZAP // Lusa

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4 Comments

  1. Tanta complicação para uma situação provocada pelos sucessivos governos que congelam sempre as rendas antigas e cujos valores pagos pelos inquilinos são ridículos.
    Admite-se por T2 pagar rendas de 100€?? Depois vem reclamar que rendas atuais estão caras, poderá quem investiu nos anos 70 e 80 tem estas rendas ridículas e os inquilinos nunca de lá saíram. Só saem quando morrerem… Querem casas ? Comprem.

    • Agradeça à ilegal, criminosa, e inconstitucional “lei das rendas”, elaborada pela ex-Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território, Maria Graça, que congela os valores dos arrendamentos nos contratos anteriores a 1990, mas pior do que isso é existirem inquilinos a pagarem rendas de valores exorbitantes que não correspondem à realidade – devido a essa lei – e inquilinos a pagar rendas de valores muito baixos ou irrisórios que também não correspondem à realidade, tratando-se neste último caso de uma clara compra de votos, promovida por essa lei que congela os valores dos arrendamentos nos contratos anteriores a 1990.

  2. É preciso descongelar as rendas antigas de contratos anteriores a 1990 que foram congeladas pela ilegal, criminosa, e inconstitucional “lei das rendas”, elaborada pela ex-Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território, Maria Graça, que através deste esquema está a violar a Constituição da República de Portugal (CRP), a promover a desigualdade e descriminação com inquilinos a pagarem rendas de valores exorbitantes que não correspondem à realidade e inquilinos a pagar rendas de valores muito baixos ou irrisórios que também não correspondem à realidade, tratando-se neste último caso de uma clara compra de votos através da “lei das rendas” que congela os valores dos arrendamentos nos contratos anteriores a 1990.
    É igualmente urgente acabar com todo e qualquer subsídio que está a ser dado aos proprietários de imóveis ou a inquilinos, os Portugueses não podem andar a sustentar senhorios e a pagar as rendas dos outros, os Portugueses que se encontram em situação de carência económica e social (desemprego, baixos rendimentos, reformas baixas, etc.) têm de ser ajudados pelo Estado através das Câmaras Municipais e Juntas de Freguesias de onde são naturais.
    A “lei das rendas” tem patente no seu texto todas as ilegalidades, crime, e inconstitucionalidade, não sendo compreensível que a revogação da mesma ainda não tenha sido efectuada, assim como também não se compreende como é que a dr.ª Maria Graça (ex-Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território) ainda não foi presente a Tribunal para responder e ser condenada pelo seu acto, não se pode legislar ou mudar uma lei em causa própria ou para viabilizar/servir uma situação em concreto.

  3. O que mais me preocupa agora é se a avó da mortágua não escapa desta e é posta no olho da rua. Mas se todos pagamos tudo, alimentação, vestuário, gasolina, carros, and so on, a
    preços correntes, de mercado, por que carga de água alguns hão de estar a pagar rendas de mil nove e troca o passo???

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