Como pode o Chega ir a eleições com órgãos ilegais? “É uma situação juridicamente obtusa”

Luís Forra / Lusa

Apesar de ter estatutos e órgãos declarados ilegais pelo Tribunal Constitucional, o Chega continua a concorrer a eleições devido a falhas na lei, que não prevê consequências práticas.

O Volt apresentou 26 pedidos de impugnação às listas do Chega para as eleições autárquicas em Lisboa, mas a esmagadora maioria tem sido recusada pelos tribunais. Segundo o próprio partido, já foram contabilizados 36 indeferimentos, com diferentes juízes a justificarem as decisões de forma diversa: alguns consideram que o Volt não tem legitimidade para contestar listas em freguesias onde não apresenta candidatos; outros remetem a avaliação para instâncias superiores. Vários processos continuam ainda em aberto.

No centro da contestação está a situação interna do Chega. Desde 2020, o Tribunal Constitucional (TC) tem considerado inválidas várias alterações aos estatutos e eleições internas, por concentrarem excessivos poderes na figura do presidente e por falhas nas convocatórias das convenções. Em 2023 e 2024, o TC voltou a chumbar os órgãos dirigentes. Ainda assim, estas deliberações não têm impedido o partido de concorrer em sucessivas eleições.

A mais recente decisão, proferida em setembro pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, clarifica que não compete aos tribunais de comarca avaliar deliberações internas dos partidos, mas apenas verificar a autenticidade dos documentos e a elegibilidade dos candidatos.

O constitucionalista Vitalino Canas, ouvido pelo Público, considera que esta leitura poderá ter ignorado as decisões do TC, já que “a lei exige que as candidaturas sejam aprovadas por órgãos estatutariamente competentes e regularmente constituídos”.

Outros especialistas sublinham a complexidade do problema. Teresa Violante fala num “berbicacho” e numa “situação juridicamente obtusa”, lembrando que a lei não prevê efeitos automáticos para as decisões do TC.

Pedro Bacelar de Vasconcelos acrescenta que, sem ação do Ministério Público ou de outras entidades competentes, as ilegalidades acabam por não ter consequências práticas.

O resultado é uma situação paradoxal: embora o Chega esteja formalmente em incumprimento estatutário há cinco anos, continua a concorrer a eleições. As eleições autárquicas realizam-se a 12 de outubro e, apesar das impugnações, tudo indica que as listas do Chega se manterão válidas em Lisboa.

ZAP //

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