O novo diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), o tenente-general Luís Francisco Botelho Miguel, respondeu por escrito ao tribunal e revelou que o serviço desconhece quantas armas não letais estavam distribuídas pelos seus elementos.
De acordo com o jornal Público, o tenente-general Luís Francisco Botelho Miguel disse, em tribunal, que só em novembro passado, na sequência de um relatório do inventário determinado em agosto pela então diretora nacional, Cristina Gatões, é o que o SEF concluiu que não havia rasto das armas que não eram de fogo.
Assim, o SEF desconhece quantas armas não letais – como aerossóis, bastões extensíveis ou armas elétricas – estavam distribuídas pelos seus elementos.
O relatório “conseguiu fazer apenas o registo de todas as armas de fogo desde as primeiras aquisições em 1990”. Contudo, “inexistia semelhante registo de armas de outras classes”. Segundo Botelho Miguel, o armazenamento, registo e a sua distribuição “obedeciam às regras do economato”.
“A sua distribuição era alvo de registo individualizado (por funcionário), constatando-se, da escassa documentação existente a respeito das mesmas, que a sua remessa para as unidades orgânicas era feita nos mesmos moldes do demais material tático (lanternas, algemas, coletes), sem que exista registo centralizado da distribuição individual”, escreveu o diretor do SEF.
Além disso, “foi apurado que este tipo de armas não tinha um número de série e não eram alvo de qualquer sistema de inventariação por parte do serviço, sendo gerido numa lógica de consumível”.
Por causa disto, quatro dias depois de assumir o cargo, Botelho Miguel quis “alargar o inventário das armas de outras classes sujeitando todas, independentemente da sua natureza, à mesma disciplina de armazenamento, cadastro e arquivo centralizado vigente para as armas de fogo, assim como verificação da validade de todas as classes de armas”.
Em dezembro passado, a direção nacional do SEF determinou “a recolha geral de todas as armas de todas as classes, e respetivos acessórios e recargas” até 15 de janeiro, expecto as armas de fogo sobre as quais tinha registo. Desde então, o SEF recebeu 199 armas e apenas dois bastões.
Estas revelações foram feitas durante o julgamento dos três inspetores — Duarte Laja, Bruno Sousa e Luís Silva — acusados do homicídio qualificado do ucraniano Ihor Homenyuk a 12 de março do ano passado, no centro de instalação temporária do aeroporto de Lisboa.
Segundo o Ministério Público (MP), em março de 2020, Ihor Homeniuk, foi conduzido à sala do Estabelecimento Equiparado a Centro de Instalação, no Aeroporto de Lisboa, para aguardar pelo embarque num voo com destino a Istambul, tendo-se recusado a fazê-lo.
Perante a agitação que apresentava, Ihor Homenyuk acabou por ser isolado dos restantes passageiros estrangeiros, onde permaneceu até ao dia seguinte, tendo sido “atado nas pernas e braços”, mas acabou por ficar “apenas imobilizado nos tornozelos”.
Os inspetores ter-lhe-ão algemado as mãos atrás das costas, amarrado os cotovelos com ligaduras e desferido um número indeterminado de socos e pontapés no corpo.
Horas depois, e depois de a vítima não reagir, acabou por ser acionado o INEM e uma viatura médica de emergência, tendo o médico de serviço da tripulação verificado o óbito.
As agressões cometidas pelos inspetores do SEF, que agiram em comunhão de esforços e intentos, provocaram a Ihor Homenyuk “diversas lesões traumáticas que foram causa direta” da sua morte.
O MP defende que um bastão – arma classificada como “não letal” e cuja utilização estava interditada aos inspetores do SEF a não ser que tivessem uma autorização especial – terá sido usada para agredir Ihor, contribuindo para a sua morte.