Um “ovo Kinder” repõe regime de receitas do IUC

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Julien Warnand/EPA

Fernando Medina, ministro das Finanças

O projeto do PS que corrige o Orçamento do Estado (OE2024) evitando que os municípios percam para o Estado uma parcela da receita do IUC foi aprovado esta terça-feira, com o PSD a classificar de “ovo Kinder” a solução encontrada.

Em causa está uma questão suscitada durante o processo de fixação da redação final do Orçamento do Estado para 2024 e que tem origem na norma da proposta orçamental que previa um aumento de 25 euros em 2024 do IUC dos carros com matrícula anterior a julho de 2007 (categoria A) e dos motociclos e consequente mudança na afetação de uma parcela das receitas do imposto.

O aumento do IUC foi retirado do OE2024 por proposta do PS sem que, no entanto, tenha sido eliminada a parte da proposta do OE que procedia a mudanças na afetação das receitas, ao prever que 30% do IUC da categoria A na componente cilindrada passaria a reverter para o Estado.

Para resolver esta questão, PS e PSD divergiram na solução, com os socialistas a usarem um diploma sobre IRC que esteve esta terça-feira em discussão e votação final global para alterar aquela norma do OE2024, e os sociais-democratas a avançarem com um projeto autónomo para corrigir a referida norma.

O projeto do PS acabou por ser aprovado por unanimidade; já o do PSD foi rejeitado, com o voto contra do PS, não registando abstenções.

Durante o debate que antecedeu a votação, foram várias as críticas à solução encontrada pelo PS, com o deputado do PSD Duarte Pacheco a notar que o problema apenas se colocou porque os socialistas votaram contra as propostas do PSD e da IL que eliminavam do texto orçamental toda aquela parte do IUC — subida do imposto e consequente mudança na distribuição de receitas.

Um “ovo Kinder” para reverter a “asneira” do PS

“Quando há uma proposta da oposição, votam, contra, sem olharem para o conteúdo”, disse Duarte Pacheco, acusando o PS de ter recusado todas as sugestões para surgir agora “com o que se pode chamar o ovo Kinder” ao incluir “a retirada daquela norma do IUC”, numa proposta sobre alteração de regras do IRC.

Também João Cotrim Figueiredo atirou ao “enxerto” do IUC no diploma do IRC para reverter a “asneira” do PS que foi dar “um passo atrás no agravamento do IUC”, esquecendo-se os socialistas de apoiar as propostas do PSD e da IL para eliminar do artigo a parte das receitas.

Pelo PCP, o deputado Duarte Alves afirmou que, da mesma forma que o seu partido tinha votado contra o agravamento do IUC para os carros mais antigos, também agora acompanharia as várias propostas para eliminar “este abcesso” que ficou no OE2024.

Pedro Filipe Soares, do BE, referiu que a questão se colocou por, após saber que ia para eleições, o PS ter “rapidamente metido na gaveta” o agravamento do IUC, sublinhando que é aí que a medida deve continuar.

A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) expressou oposição a esta mudança, destacando a perda significativa de receitas. Atualmente, os municípios detêm a totalidade da receita sobre veículos das categorias A, E, F e G, e 70% da componente de cilindrada da categoria B. A proposta do Estado para o OE2024 significaria uma perda de cerca de 40 milhões de euros para os municípios.

Além disso, a ANMP alertou para a imposição de um teto de variação anual no IUC, que limitaria a receita municipal ao valor recebido em 2023, “congelando” assim a receita. Esta regra também foi mantida na versão final aprovada, adicionando outra camada de complexidade ao debate fiscal em curso.

Para evitar que a Lei do OE2024 se sobreponha à lei esta terça-feira aprovada, a proposta do PS sobre a afetação de receitas do IUC determina que esta entra em vigor em 1 de janeiro de 2024, “considerando-se prejudicadas as mesmas disposições aprovadas em momento anterior no âmbito do processo legislativo do Orçamento do Estado para 2024, independentemente da respetiva entrada em vigor”.

O diploma usado para solucionar a questão do IUC tem a ver com o IRC, nomeadamente sobre a adaptação do lucro tributável das empresas do setor segurador às novas regras contabilísticas, criando um regime transitório para o efeito.

O timing da discussão deste diploma mereceu várias críticas, nomeadamente por parte do deputado Rui Afonso, do Chega, tendo o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Santos Félix, salientado que o mesmo resulta de uma proposta do Governo remetida ao parlamento no início de outubro, antes de se saber que o país ia para eleições antecipadas.

Na prática, esta lei (que resulta de uma proposta aprovada em Conselho de Ministros no final de setembro) permite que empresas deste setor ‘diluam’ durante um período de 10 anos o impacto da implementação da norma contabilística IFRS 17 na determinação do lucro tributável para efeitos de IRC.

Foi também debatido e votado esta terça-feira um projeto do PAN, de alteração ao IRC visando a criação de incentivos fiscais para que as empresas promovam a mobilidade ciclável dos trabalhadores. A iniciativa, que não teve abstenções, foi chumbada com o voto contra do PS, PSD e PCP e o voto favorável dos restantes partidos.

ZAP // Lusa

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