O Hemisfério Sul está a secar mais do que o Hemisfério Norte nas últimas duas décadas.
Apenas cerca de 1% da água doce do planeta está disponível para os seres humanos, plantas e animais. O resto está nos oceanos ou encarcerado em camadas de gelo e rochas polares.
Num mundo a braços com uma mudança climática, a distribuição global desse 1% de água assume um significado totalmente novo.
É num artigo publicado no The Conversation que Kevin Collins, professor da The Open University, dá a conhecer um novo estudo que demonstrou que o Hemisfério Sul está a secar mais do que o Hemisfério Norte nas últimas duas décadas (2001 – 2020).
A principal causa é o El Niño, que ocorre de tempos a tempos quando a água do oceano no Pacífico oriental é mais quente do que o habitual.
Para chegar a esta conclusão, os cientistas usaram dados de satélites e medições de caudais de rios e ribeiros, que permitiram modelar e calcular as alterações na disponibilidade de água, isto é, a diferença líquida entre a quantidade de água fornecida à paisagem, sob a forma de precipitação em terra, e a água removida para a atmosfera por evaporação geral ou pelas plantas através das folhas.
Apesar de o Hemisfério Sul ter apenas um quarto da área terrestre (excluindo a Antártida), parece ter um efeito substancialmente maior na disponibilidade global de água do que o Hemisfério Norte.
O artigo científico, publicado na Science, revela uma diminuição da disponibilidade de água na América do Sul, na maior parte de África e no centro e noroeste da Austrália. Ainda assim, em algumas regiões, nomeadamente a parte sul da América do Sul, terão mais água disponível.
Apesar destas variações, a disponibilidade de água no Hemisfério Norte é mais ou menos equilibrada, devido em grande parte às influências humanas, como a irrigação, as barragens e a produção alimentar. Estes fatores são mais relevantes no Hemisfério Norte, uma vez que cerca de 90% da população mundial vive aí.
Que implicações teremos de enfrentar?
A América do Sul alberga a floresta tropical da Amazónia, que, além de ser um regulador fundamental do clima, é também um habitat de importância mundial para as espécies e lar de muitas comunidades indígenas.
Isto significa que a seca desta floresta tropical poderá reduzir a vegetação e aumentar o risco de incêndio, um fenómeno que libertará milhares de milhões de toneladas de carbono atualmente bloqueado na vegetação e nos solos da floresta.
A América do Sul é também um importante exportador agrícola de soja, açúcar, carne, café e frutas para o mercado mundial, pelo que as alterações na disponibilidade de água aumentarão a pressão sobre os sistemas alimentares.
Já África tem muitas zonas climáticas e contrastes socioeconómicos, com recursos limitados para mitigar e adaptar-se.
Por último, o Noroeste da Austrália que, embora seja uma das grandes regiões selvagens do país, não é de descartar, dado que considerar a região “vazia” e, portanto, sem importância em termos de seca pode mesmo ser um perigo.