A facilidade de acesso a um novo teste que detecta os primeiros sinais da demência pode acabar por sobrecarregar os sistemas de saúde com pessoas ansiosas e em busca de tratamentos.
Um esquecimento que normalmente não aconteceria, ficar confundido com o lugar onde se está ou dificuldade na concentração são sintomas comuns da demência que costumam eventualmente levar a um diagnóstico. O desconhecimento generalizado sobre doenças neurodegenerativas como Alzheimer e demência tornam atractiva a ideia de criar um teste que rapidamente avalie o risco de cada um de nós desenvolver demência antes ainda dos sintomas aparecerem.
E esse teste já existe. A Avaliação Cognitiva Integrada (ICA) desenvolvida pela startup britânica Cognetivity Neurosciences até já foi aprovada nos Estados Unidos e está a ser usada pelo sistema nacional de saúde do Reino Unido. Mas será que vale a pena fazer um teste sobre uma doença que não tem cura e tem muitos poucos tratamentos eficazes?
Segundo escreve a Wired, o ICA é um teste semi-supervisionado que podem integrar um exame geral anual de rotina para os maiores de 50 anos e pode detectar os primeiros sinais ainda antes dos sintomas comportamentais serem notórios. O teste é feito num iPad e mostra imagens variadas, tendo os utilizadores de tocar no lado direito do ecrã quando veem um animal e na esquerda quando a imagem não é de um animal.
O teste é visto como uma forma rápida e fácil de detectar os primeiros sinais sem serem precisos os exercícios de papel e caneta que são frequentemente usados, avaliando a rapidez e precisão da pessoa através de Inteligência Artifical, combinada com informações sobre o estilo de vida, a idade e outros factores que contribuem para o maior risco.
No entanto, há preocupações de que, dada a falta de tratamentos comprovados para a demência, o uso generalizado destes testes rápidos possa levar a que o sistema de saúde seja entupido com pessoas ansiosas devido aos seus resultados, apesar de ainda não terem sintomas.
“Preocupo-me que isto terá enormes implicações para as pessoas. Não há a infraestrutura para suportar totalmente as famílias afectadas pela demência. Onde é que as pessoas vão para terem consultas pós-teste? Não temos a infraestrutura — e há uma obrigação moral para as apoiar”, revela Karen Harrison Dening, chefe da investigação e publicações da associação de caridade Dementia UK.
Já o psiquiatra Ivan Koychev, que usou o ICA nas suas investigações, refere que “têm havido muitos desenvolvimentos que tornam mais provável que haja um benefício no diagnóstico precoce do que haveria há 15 anos”.
Apesar das preocupações sobre a resposta dos sistemas de saúde a um crescente fluxo de doentes preocupados com as suas prospecções futuras de desenvolver demência, a facilidade do novo teste – que é apenas semi-supervisionado e pode ser feito em qualquer iPad – pode também ajudar a democratizar o acesso aos cuidados de saúde neurológicos, visto que pessoas que tradicionalmente são esquecidas nos estudos possam ser avaliadas.
Podemos ainda não ter tratamentos muito eficazes para a demência e o Alzheimer, mas a capacidade de as detectar cedo pode mudar a nossa atitude perante as doenças e reduzir o medo perante os resultados dos testos. “A saúde do cérebro vai tornar-se algo que as pessoas vão monitorizar e cuidar, tal como cuidam da sua saúde física”, remata Koychev.