Impasse com os metadados. Juízes não deixam “entrar pela janela” quando o TC “fechou a porta”

O impasse tem levado a que os procuradores tentem usar os dados de facturação das empresas de telecomunicações como provas em tribunal, mas há juízes que não estão a aceitar e consideram que isso viola o chumbo do TC.

A falta de uma nova lei dos metadados, no seguimento do chumbo do Tribunal Constitucional à legislação anterior, está a causar muitas dores de cabeça aos juízes e procuradores.

Recorde-se que, em Abril de 2022, um acórdão do TC declarou inconstitucionais duas normas de 2009 que obrigavam as operadoras de telecomunicações a guardar os metadados das comunicações eletrónicas — como a data, a hora, o número, a duração da chamada ou o endereço IP — durante um ano.

Esta decisão, que veio no seguimento de um chumbo do Tribunal de Justiça da União Europeia, pôs em causa milhares de processos em que estas informações foram usadas como provas e pode mesmo levar à reversão de condenações.

O PS e PSD têm trabalhado na elaboração de uma nova lei que passe o crivo do Constitucional ou então em mexer no texto fundamental no âmbito da revisão à Constituição, mas por enquanto, ainda nada foi aprovado.

Dado este impasse, as autoridades tentaram contornar estas dificuldades usando as bases de dados de facturação das empresas de telecomunicações como provas em tribunal, que estão apenas disponíveis durante seis meses e têm menos informação à disposição, nota o Público.

O próprio Governo afirmou que esta é a solução temporária para contornar o chumbo enquanto não é aprovada uma nova legislação, mas a Comissão Nacional de Protecção de Dados já deu um parecer negativo à ideia.

No entanto, se há juízes que aceitam esta alternativa, há outros que não concordam e que não estão a permitir que estas informações sejam admitidas como provas por entenderem que os dados de facturação têm uma natureza estrita de protecção contratual.

Como refere um acórdão do Tribunal da Relação do Porto, os juízes não podem “deixar entrar pela janela” aquilo a que o Constitucional “fechou a porta” ao chumbar a conservação dos dados de toda a população

Neste processo, estavam em causa crimes de burla informática e acesso ilegítimo que lesaram uma mulher em oito mil euros, após a vítima ter atendido uma chamada de alguém que se fez passar por uma funcionária do seu banco. O Ministério Público pediu o uso da base de dados para facturação, mas o juiz negou.

Este é apenas um de muitos recentes exemplos que têm dificultado o trabalho dos investigadores. O caso do desaparecimento durante oito meses da adolescente de Leiria também se arrastou após o acesso à localização celular do seu telemóvel — que foi essencial para que a jovem fosse encontrada — ter sido negado duas vezes pelo tribunal local.

Adriana Peixoto, ZAP //

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