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Junta militar quer acabar com “anarquia” em Myanmar. Mais de 600 detidos libertados

Jeon Heon-Kyun / EPA

A junta militar no poder em Myanmar disse esta terça-feira que quer “acabar com a anarquia no país”, numa conferência de imprensa onde apresentou um vídeo de um político a afirmar ter subornado a líder deposta, Aung San Suu Kyi.

Mostrando-se indiferente às sanções aprovadas na segunda-feira pela União Europeia (UE) e pelos Estados Unidos, o porta-voz do regime, Zaw Min Tun, garantiu sentir-se “triste” porque “os terroristas e as pessoas violentas que morreram” são “seus concidadãos”.

Mas “é preciso reprimir a anarquia. Que países do mundo aceitam a anarquia?“, acrescentou, especificando que o acesso à internet permanecerá restrito “por um certo período”.

A junta militar apresentou um vídeo com “a confissão” de um político, o ex-chefe da região de Rangum, Phyo Min Thein, afirmando ter entregado grandes quantias de dinheiro e vários quilos de ouro a Suu Kyi, detida desde o golpe de Estado de 1 de fevereiro.

“Dei-lhe [o dinheiro] com as minhas próprias mãos e disse-lhe para o usar para as suas necessidades pessoais e [que pretendia] apoio ao meu trabalho e funções na região de Rangum”, diz Phyo Min Thein no vídeo, que também cita o partido e uma fundação de Suu Kyi como possíveis destinos dos subornos.

Estas são as mesmas acusações que a junta militar tornou públicas há duas semanas, estimando que o alegado suborno ascendia a 600 mil dólares (cerca de 505 mil euros) e 11 quilos de ouro.

Muitos internautas descreveram o vídeo como uma fraude, apontando que o político não move os lábios e que a voz que se ouve não é sua.

Mais de 600 detidos libertados em Myanmar

Mais de 600 detidos pelos militares desde o golpe de Estado de 1 de fevereiro em Myanmar foram libertados, disse fonte prisional. “Libertámos hoje 360 homens e 268 mulheres da prisão de Insein” em Rangum, declarou um responsável do estabelecimento penitenciário que pediu para não ser identificado.

Um deles é o jornalista da Associated Press, preso no mês passado, durante os protestos contra o golpe militar de 1 de fevereiro. Thein Zaw disse, em contactos telefónicos com a Associated Press e familiares, que foi libertado depois de ter sido ouvido pela segunda vez em tribunal.

Enquanto se dirigia para casa, o jornalista disse que o juiz arquivou o caso, afirmando que tinha sido detido quando se encontrava a trabalhar. “Estou ansioso para me encontrar com os meus familiares”, disse Thein Zaw, lamentando que outros camaradas de profissão “ainda estejam presos”.

Thein Zaw tinha sido acusado de violação da ordem pública, que pode ser punida com três anos de prisão efetiva.

A Associated Press e várias organizações que lutam pela liberdade de expressão pediram de imediato a libertação de Thein Zaw e dos outros jornalistas presos.

“A Associated Press está profundamente aliviada com a libertação do jornalista da AP, Thein Zaw, preso na Birmânia”, disse Ian Phillips, vice-presidente da empresa. “O nosso alívio não é completo porque outros jornalistas continuam detidos. Nós pedimos à Birmânia para libertar todos os jornalistas e que lhes seja permitido reportar em segurança o que está a acontecer no país”.

Os militares justificam o golpe com uma alegada fraude eleitoral nas eleições de novembro passado, nas quais o partido de Suu Kyi ganhou por larga margem, considerada legítimas por observadores internacionais.

Desde a sua detenção, Suu Kyi, mantida incomunicável, foi acusada de vários crimes, incluindo a importação ilegal de walkie-talkies, violação das regras relativas à covid-19, de pôr em perigo a segurança do país e de aceitar subornos.

A polícia leal à junta militar tem reprimido com violência e tiros com balas reais os manifestantes que protestam diariamente contra o golpe de Estado, alem de terem bloqueado o sinal de internet móvel e fecharam vários órgãos de comunicação social, detendo e perseguindo jornalistas que noticiavam os protestos.

Pelo menos 261 pessoas morreram na repressão de manifestantes e ativistas contra o golpe e pelo menos 2.300 pessoas foram detidas.

Indiferente à condenação unânime da comunidade internacional da violência e dos presos políticos, a junta militar liderada por Min Aung Hlaing continua a sua repressão no país, onde governou com mão de ferro entre 1962 e 2011. Suu Kyi, que venceu o Prémio Nobel da Paz em 1991, passou um total de 15 anos em várias prisões domiciliares.

Em Rangum, parcialmente sujeita a lei marcial, a população voltou a manifestar-se para tentar impedir a resposta das forças de segurança. Médicos, ferroviários, professores, além de muitos funcionários públicos e do setor privado continuam em greve, paralisando setores inteiros da frágil economia.

A UE congelou os bens e proibiu a viagem de 11 funcionários, incluindo o chefe da junta, general Min Aung Hlaing. Essas são as primeiras medidas coercitivas desde 1 de fevereiro.  Os Estados Unidos, por sua vez, alargaram a sua lista de oficiais de alto escalão sujeitos a sanções, incluindo duas divisões do exército acusadas de ter participado “no assassinato de manifestantes”.

ZAP // Lusa

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