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Guterres escolheria Sócrates se tivesse indicado um sucessor para primeiro-ministro

José Cruz/ABr

O ex-primeiro-ministro António Guterres (foto: José Cruz/ABr)

O ex-primeiro-ministro António Guterres (foto: José Cruz/ABr)


O ex-primeiro-ministro António Guterres indicaria José Sócrates ao então Presidente da República, Jorge Sampaio, caso tivesse optado em Dezembro de 2001 por escolher um sucessor para a chefia do Governo na sequência da sua demissão.

Esta ideia consta de uma biografia de António Guterres, da autoria do jornalista Adelino Cunha, intitulada “Os segredos do poder”, da editora “Aletheia” – livro que será apresentado na próxima quarta-feira.

Após António Guterres ter anunciado a sua demissão do cargo de primeiro-ministro, em resultado da derrota do PS nas eleições autárquicas do final de 2001, o autor descreve alegadas movimentações do sector socialista “sampaísta” no sentido de que se indicasse um novo líder de executivo sem recurso a eleições legislativas antecipadas.

No entanto, de acordo com a tese apresentada, o actual comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) rejeitou esse cenário, temendo que Jorge Sampaio viabilizasse uma aliança governativa entre o PS e o PCP, e defendeu em contrapartida que o novo primeiro-ministro teria de ser legitimado pelo voto popular em eleições.

“Se eu concordasse com indigitações teria proposto naquele momento José Sócrates para me suceder como primeiro-ministro, mas era preciso haver eleições no PS e no país”, justifica António Guterres (página 568) em entrevista ao autor.

Neste livro de Adelino Cunha, que foi assessor do ex-ministro Miguel Relvas, o ex-primeiro-ministro José Sócrates volta a ser destacado na controvérsia em torno dos “orçamentos do queijo” [de 2001 e 2002], viabilizados pelo voto isolado do deputado do CDS e à data presidente da Câmara de Ponte Lima, Daniel Campelo.

Numa conjuntura em que havia no Parlamento um empate de 115 deputados entre o PS e a oposição, o segundo Governo de Guterres necessitava de, pelo menos, uma abstenção entre as bancadas da oposição para que os seus orçamentos passassem.

José Sócrates sempre negou ter possuído especiais responsabilidades na captação do voto de Daniel Campelo, mas, no livro de Adelino Cunha, Campelo “garante ter negociado secretamente” um processo de contrapartidas para investimentos em Ponte de Lima com o então ministro do Ambiente e com Jorge Coelho.

“Cometi um erro político ao permitir a aprovação do chamado ‘orçamento limiano’; devia ter dito que um chumbo na Assembleia da República levaria à minha demissão. Se isso acontecesse, candidatava-me novamente a primeiro-ministro. Já o último Orçamento [2002] quis que fosse aprovado para salvaguardar os interesses do país. Foi uma medida cautelar para tomar as medidas que quisesse depois das eleições, incluindo a minha demissão”, justifica Guterres.

Ao longo das 600 páginas, o livro apresenta alguns factos duvidosos e algumas imprecisões.

Nas imprecisões, apontam-se as referências erradas à Fundação para a Prevenção Rodoviária, quando se pretendia abordar a entidade criada por Armando Vara, a Fundação para Prevenção e Segurança (FPS); e o processo de aproximação entre o PS e o Movimento Humanismo e Democracia (MHD), que aconteceu em 1994, antes de Guterres ser primeiro-ministro e não depois, como se afirma no livro.

No primeiro capítulo da primeira parte, refere-se uma palestra do “maçon” António Reis a que assistiu o jovem estudante do Instituto Superior Técnico António Guterres.

Só que António Reis terá sido iniciado no Grande Oriente Lusitano (GOL) (Loja Estrela de Alva) nos finais da década de 90, portanto alguns anos depois de o jovem Guterres ter concluído os seus estudos no Instituto Superior Técnico.

Também duvidosa é a colocação do antigo dirigente comunista Luís Sá – principal protagonista do movimento “Novo Impulso”, na década de 90 – num grupo juntamente com João Amaral, Edgar Correia e Carlos Brito, que acabaram por sair deste partido.

Esse não foi o caso de Luís Sá, que morreu em 1999 no seu gabinete de trabalho na Soeiro Pereira Gomes, na plenitude das suas funções como membro da Comissão Política do PCP, sendo considerado próximo de personalidades como Octávio Teixeira e Carlos Carvalhas, que não abandonaram o PCP.

Na capa do livro fala-se “na militância na Mocidade Portuguesa” e nas “relações com o Opus Dei” de António Guterres – conexões que o próprio sempre negou com veemência e em relação às quais nunca apareceu qualquer prova de vinculação.

/Lusa

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