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Governo fica com colecção de arte de Rendeiro para pagar 35 milhões da dívida do BPP

Tiago Petinga / Lusa

O ex-presidente do BPP, João Rendeiro

O Governo português vai trocar parte das dívidas do antigo BPP por duas colecções de arte contemporânea que foram reunidas por João Rendeiro, ex-presidente do banco. A “troca de créditos” está orçada em quase 35 milhões de euros.

O anúncio de compra foi feito pelo primeiro-ministro António Costa no Porto, no final de uma visita à exposição de Paula Rego na Fundação de Serralves.

A Colecção Ellipse e a Colecção BPP vão passar, assim, para a tutela pública, por via de uma troca de créditos, no valor de 34,86 milhões de euros, junto da comissão liquidatária do BPP, conforme anunciou o governante.

“Após uma negociação muito difícil com a comissão liquidatária do BPP, o Estado chegou finalmente a acordo para adquirir” as “duas importantes colecções de arte”, referiu António Costa no Porto, como cita o Público.

As duas colecções passarão a integrar a Colecção de Arte Contemporânea do Estado (CACE), ficando depositadas no Centro Cultural de Belém e em Serralves.

Algumas das obras da Colecção BPP poderão ser vistas pelos portugueses já em Abril do próximo ano, numa exposição em Serralves, revelou o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, em declarações à Agência Lusa.

O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, afirmou à Lusa que a colecção de arte do BPP passa a ser tutela do Estado para impedir que esta saia da Fundação de Serralves, onde está depositada.

“Se o Estado não ficasse com esta coleção [do BPP], ela poderia ser vendida“, referiu ainda Adão e Silva, notando que será celebrado “um protocolo de depósito para que se mantenha em Serralves o que está em Serralves”. “Não sairá de Serralves“, garantiu ainda o ministro.

Não é uma compra, mas “uma troca de créditos”

Adão e Silva revelou que a comissão liquidatária do BPP aceitou, na segunda-feira, a proposta do Estado de troca de créditos por aquelas duas colecções de arte, num valor total de 34,86 milhões de euros: 30,1 milhões de euros pela colecção Ellipse, e 4,76 milhões de euros pela colecção BPP.

Esta operação não é formalmente uma aquisição, mas uma “cessão de créditos”, referiu ainda o ministro. “Não é como se nós deixássemos de usar este dinheiro em outras coisas para comprar isto. São créditos que o Estado tem junto do BPP. É uma troca de créditos”, reforçou.

A dívida do BPP ao Estado ainda ronda os cerca de 43 milhões de euros, aos quais acrescem mais de 150 milhões em juros de mora no âmbito da garantia estatal prestada ao Banco. As obras de arte vão, assim, abater parte desta dívida.

O colapso do BPP que estava vocacionado para a gestão de fortunas, deu-se em 2010 depois de se ter iniciado com a crise financeira de 2008. Apesar da pequena dimensão do banco, a sua falência lesou milhares de clientes e o Estado.

O fundador e antigo presidente do BPP, João Rendeiro, bem como outros ex-administradores, foram acusados de crimes económico-financeiros ocorridos entre 2003 e 2008, após se terem atribuído a si mesmos prémios e de se terem apropriado de dinheiro do banco de forma indevida.

Rendeiro acabaria por morrer a 12 de Maio deste ano numa prisão na África do Sul, onde estava desde o final de 2021, após três meses de fuga à justiça portuguesa para não cumprir pena em Portugal.

“Valorização significativa” da colecção de arte do Estado

A passagem das obras de arte para a tutela do Estado acontece após uma actualização das avaliações e das condições de conservação das obras que foi feita por um grupo de trabalho composto pela curadora da CACE, Sandra Vieira Jurgens, e pelos historiadores e professores Pedro Lapa e Luís Urbano Afonso.

O contrato de transferência de propriedade ainda não foi assinado e “está condicionado à avaliação do estado de conservação peça a peça” das duas colecções de arte, explicou ainda Adão e Silva.

“O grupo de trabalho conhecia as colecções e fez uma avaliação com base na descrição da avaliação que conhecia”, mas falta ainda avaliar cada uma das obras de arte individualmente, referiu.

A colecção Ellipse inclui 860 obras de arte e a colecção BPP tem 385 obras. Assim, a CACE passará a ter 3.146 obras de arte portuguesa e estrangeira dos séculos XX e XXI. “Um crescimento muito significativo, como a uma valorização muito significativa da CACE”, como realçou o ministro da Cultura.

A colecção de arte do Estado passará a ter “um núcleo muito importante de arte portuguesa, que é a colecção BPP, e um núcleo muito importante de uma colecção internacional“, que é a Ellipse, sustentou também Adão e Silva.

As obras da colecção Ellipse estão atualmente depositadas num armazém em Alcabideche (Cascais) e vão ser transferidas para o futuro museu de arte contemporânea no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, juntamente com a colecção Berardo. Em 2023, já haverá a possibilidade de as obras de arte serem mostradas ao público no CCB.

A colecção Ellipse foi criada em 2004, inicialmente como um fundo de investimento internacional que representou cerca de 20 milhões de euros, patrocinado por um grupo de trinta investidores portugueses e estrangeiros. Integra 860 obras de 175 artistas, como Félix Gonzalez-Torres, Nan Goldin, William Kentridge, Stan Douglas e Steve McQueen.

Já a Colecção BPP foi constituída entre 1996 e 2008 e integra 385 obras de 153 autores, incluindo obras, entre outros, de Helena Almeida, Lourdes Castro, Pedro Calapez e Julião Sarmento.

ZAP // Lusa

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