Paula chegou a tribunal acusada de burla qualificada por ter deixado 84 clientes da agência de viagens que geria no Montijo com as férias ou viagens estragadas em agosto de 2016.
Chegou a ser detida pela Polícia Judiciária e alvo de ameaças por lesados. O vício do jogo online levou a jovem gerente da empresa dos pais, entretanto dissolvida por insolvência, a perder o controlo financeiro.
No total, o dinheiro em causa ultrapassava os 214 mil euros, com o Fundo de Garantia de Viagens e Turismo a pagar mais de 175 mil euros a quem ali recorreu. Era é este o valor de indemnização pedido por este organismo que existe para solucionar os problemas gerados com incumprimentos de agências de viagens.
Em tribunal, nada ficou provado, conta o Diário de Notícias. Paula Oliveira, 34 anos, foi absolvida de burla, já que não estavam preenchidos os pressupostos para uma condenação, e de pagar a indemnização ao fundo.
“Não há qualquer ato por parte da arguida que possa ser considerado astucioso ou ardiloso”, concluiu o Tribunal de Almada, no dia 12 de março. As juízas do coletivo consideram que a gerente não quis enganar ninguém. O que se verificou foi que não conseguiu satisfazer os pagamentos, por falta de liquidez só verificada em julho de 2016, mas alertou os clientes para recorrerem ao fundo, o que a maioria fez.
“Não há qualquer prova que permita concluir com certeza que a arguida, no momento em que contratava com os clientes uma viagem, já sabia que a viagem não iria ser realizada ou previa tal hipótese como muito possível”, lê-se na decisão do tribunal.
Apontam ainda as juízas que “não houve um perigo social”, já que o dano é individual para cada um dos ofendidos. “O dano era reparável pelo Fundo de Garantia constituído exatamente para precaver este tipo de situações de incumprimentos de agências de viagens.”
Em agosto de 2016, a Pacote Glamour teve de fechar portas por falta de liquidez. Nessa altura houve uma concentração de lesados às portas do estabelecimento. O Turismo de Portugal chegou a emitir um ofício a alertar “todos os consumidores que recorreram aos serviços da agência Pacote Glamour Viagens e Turismo” para estabelecerem “um contacto prévio com os respetivos fornecedores dos serviços no sentido de aferirem se as suas reservas, e respetivas condições, se encontram asseguradas”.
Para esse mês estavam previstas mais de 100 viagens. Entre os casos, o de uma família que viajou para Espanha. O voo de ida foi cumprido mas quando chegaram ao destino havia uma desagradável surpresa: a reserva no hotel não existia e o voo de regresso não estava marcado. Gastaram mais de 2500 euros, mas o Fundo de Garantia acabou a cobrir as despesas.
Outra situação refere-se a uma viagem de oito pessoas para os Açores. Foram pagos 7458 euros mas quando se dirigiram à agência para levantar as passagens já a encontraram fechada. Há casos de viagens para o México, férias na Tanzânia no valor de 12 mil euros e muitas outras. Muitas viagens envolviam famílias inteiras e até havia uma lua-de-mel em Punta Cana, cuja viagem não foi feita. Em algumas das situações estava só em causa o sinal pago, nunca devolvido.
As 84 queixas, em que as despesas foram cobertas pelo Fundo de Garantia de Turismo, são descritas na decisão do tribunal. Com a cobertura das despesas pelo fundo, muitos dos lesados consideraram ter a situação resolvida.
A gerente procedia à marcação das viagens e procedia ao pagamento após receber dos clientes – até ao dia 3 de agosto. Ficou provado que a agência contactou os lesados a informar do encerramento e a aconselhar o recurso ao Fundo de Garantia.
Paula, licenciada em Estudos Europeus e filha de um casal de reformados que criou a agência, não contestou a acusação nem apresentou testemunhas. Em tribunal explicou que a família a colocou como gerente da empresa de turismo em 2014. Mas um fator interferiu de forma decisiva: o vício ao jogo online. Perdeu o controlo, ficou viciada e deixou que conseguir cumprir os compromissos financeiros.
Na altura da crise, foi uma grande vergonha para a família. Recebeu ameaças de alguns dos clientes lesados e, com o caso a tornar-se público na comunicação social, optou por ir viver para outra região do país, em casa de outros familiares. Passou por tratamento psicológico e psiquiátrico que a certa altura abandonou por falta de condições financeiras.
Hoje, é empregada fabril e tem um companheiro estável. Paula tinha já uma condenação em Nelas, a uma pena de multa por falsificação de documento.