Perseguições e offshores: o “mete-medo” Ventura contra a “hipócrita” Mortágua

ZAP // Chega / Flickr, Filipe Amorim / Lusa

Habitação, imigração e próximo Governo. “Pegou fogo” mas foi complicado encontrar acordos num debate “mentiroso” – e um vencedor.

– Ninguém se quer sentar ao seu lado por causa das suas posições xenófobas e racistas, nomeadamente sobre imigração.
– Ainda bem. Eu quero-vos é longe o mais possível.

Este excerto de diálogo, já bem perto do fim, mostrou os extremos que se confrontaram na noite passada, no debate entre André Ventura e Mariana Mortágua. Que também foi mais longo do que os outros, tal como tinha acontecido na véspera entre o líder do Chega e Luís Montenegro.

O primeiro assunto na RTP foi habitação. A porta-voz do BE quer limites nas rendas e menos “procura de luxo”, por parte de milionários que não vivem em Portugal: “Essa procura de luxo vem porque houve um benefício fiscal, apoiado pelo Chega, e de vistos Gold. É surpreendente que o Chega queira reintroduzir os vistos Gold, uma porta aberta para a corrupção”. O líder do Chega acusa o Bloco de atacar o alojamento local e insiste que é melhor dar benefícios fiscais e assegura que o peso dos vistos Gold é 3% no investimento imobiliário, não tem nenhum impacto”.

Mortágua acusou Ventura de, durante a comissão parlamentar de inquérito à TAP, nunca ter dito que o Chega é financiado por accionistas privados da TAP. “Nós temos apoiantes ricos, pobres, de todas as classes”, respondeu o presidente do Chega.

Nessa sequência surgiu uma troca de acusações sobre quem está ou esteve nos partidos. “Não fui eu que tive um vereador (Ricardo Robles) em Lisboa a comprar casas à Segurança Social e a vender ao triplo dos preços. É preciso ter um pingo de vergonha. A isso chama-se hipocrisia e cara de pau”, atirou Ventura. A seguir falou-se sobre terroristas: “O seu partido é que tem como número dois um dirigente (Diogo Pacheco Amorim) da principal organização terrorista em Portugal que fez 600 atentados e foi responsável pela morte do Padre Max”. Ventura avisou: “Vai responder por isso. Mas Diogo Pacheco Amorim nunca foi condenado por terrorismo. Pelo menos dois candidatos seus foram condenados por terrorismo, um deles chama-se Abílio Neto” – a porta-voz do BE garantiu que Abílio Neto nunca foi candidato do BE.

Voltando a números e a propostas, Mortágua perguntou a Ventura porque quer “defender milionários”, dizendo que as propostas do Chega para a baixa do IRC resultam numa “borla de 50 milhões ao Santander, 25 de milhões ao BCP, à Galp 160 milhões, e EDP 180 milhões. A família de David Pedrosa recebe uma borla de 64 mil euros”.

Voltando ao assunto vistos gold: “Quando falei de vistos gold dei-lhe dados, a Mariana Mortágua só consegue rebater com acusações. Só quer perseguir, perseguir, perseguir. O Chega defende descida do IRC, não é só do IRC para as grandes”.

Depois, as offshores. Mariana Mortágua lamenta que não se consiga condenar em Portugal, por corrupção, “porque o dinheiro está escondido em offshores. Quer arrestar mas não se lembra que defende as offshores, onde os corruptos escondem o dinheiro. A maior ajuda à corrupção são os offshores. A palavra offshore aparece zero vezes no programa do Chega”. Ventura nega: “Isso é falso, o Chega não defende offshores” – foi uma palavra que foi dita muitas vezes no debate: “falso”.

André Ventura repetiu que é preciso controlar e regular a imigração, tendo em conta as necessidades da economia portuguesa, e voltou a criticar a extinção do SEF, “o maior erro dos últimos anos”, e os vistos facilitados para naturais dos países da CPLP. Mariana Mortágua atacou: “A política que o Chega defende para a imigração significa o caos em Portugal, na agricultura, nas pescas, nos lares, na construção. Há imigrantes porque há necessidade de trabalho imigrante em Portugal” e defende a regulamentação da imigração clandestina. Neste contexto (e não só) a deputada do BE acusou o deputado do Chega de estar “sempre a meter medo” aos portugueses.

Em relação ao próximo Governo, Mortágua acredita que está mais próxima de um acordo do que Ventura. Porquê? “Nunca vai conseguir fazer um acordo com alguém a quem chama prostituta política (PSD). Ninguém se quer sentar ao seu lado” – e foi aí que Ventura reagiu “ainda bem”.

Ainda houve espaço para um esclarecimento (parcial) sobre o caso da avó de Mariana Mortágua: “Eu não minto. A minha avó tinha 80 anos quando ficou a saber que aos 85 a renda podia saltar. Se acha que isto não mete medo a uma idosa, é porque defende uma lei cruel. Eu não minto”. Ventura acha que a história só seria real se houvesse um “fenómeno sobrenatural” em relação à idade da avó; sendo assim, é “uma grande treta”.

O Chega é a favor da igualdade de género mas é contra a “ideologia de género” e as “conteúdos aberrantes” que estão a ensinar a crianças pequenas nas escolas portuguesas; e quer fiscalizar o que associações e fundações fazem ao dinheiro. Mortágua não conhece casos de “ideologia de género” – e acha que Ventura também não conhece. “Está sempre com truques mas não consegue apagar o óbvio. Disse que ia cortar o apoio às vítimas de violência doméstica. O Chega é uma ameaça a toda a política que quer proteger as mulheres vítimas de violência”, atirou.

Foi um debate “difícil de avaliar”, lê-se na SIC Notícias, que também classificam este diálogo como “altamente demagógico e mentiroso, e pobre”. Foi um debate que “pegou fogo” e cheio de assuntos do passado, descreve o jornal Público. Já no Expresso, há quem tenha visto um empate mas no geral aponta-se para uma vitória evidente de Mortágua.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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