Da geringonça ao tabu Chega. Carneiro contido “não diz nada sobre nada”

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Estela Silva/Lusa

O ministro da Administração Interna e candidato à liderança do PS, José Luís Carneiro

Sem inimizades, diz que o “carisma vê-se nos resultados”, mas as respostas despoletam mais perguntas. José Luís Carneiro não esclarece posição em relação à geringonça ou viabilização do governo minoritário do PSD — prioridade é ter “autonomia para decidir”.

Em entrevista à TVI/CNN, o candidato à liderança do PS mostrou-se confiante na força do PS nas urnas das próximas eleições e sublinhou que a prioridade é roubar votos à direita.

Entre elogios a António Costa e ao Governo, pediu com claridade uma reforma na justiça, mas não esclareceu os maiores tabus: uma eventual geringonça e se viabilizaria um Governo minoritário do PSD para afastar o Chega do poder.

‘Chapa três’? “Decisão não será só minha”

Mais uma vez, Carneiro não foi claro em relação a uma eventual geringonça à esquerda — que constitui uma possibilidade para o seu adversário Pedro Nuno Santos, que já disse que “não fecha portas à esquerda”.

Carneiro arrasta essa decisão para depois das eleições, recordando o exemplo de António Costa.

“Quando António Costa avançou para a geringonça, ouviu os órgãos do partido. Depois dos resultados eleitorais, vamos ouvir os órgãos do partido. A decisão nunca será só minha. Consultarei o meu partido. Na altura, Costa quis ver garantidos compromissos da NATO e da UE”, salientou, garantindo que se candidata “para ganhar”.

“Eu compreendo que os órgãos de comunicação social queiram a chamada ‘chapa três’. Mas os dirigentes políticos têm responsabilidades que estão para além da chapa três, ou seja, têm a responsabilidade de construírem soluções que sirvam o país — ou seja, mais do que discutir se é “geringonça” à esquerda ou à direita, o que é que os portugueses querem saber?”, questionou.

E lembrou: “Há matérias de reforma do sistema político, do sistema eleitoral, de justiça em que não podemos contar com a esquerda. Sabemos também que não contamos com a nossa esquerda para a reforma da descentralização e até do reforço dos poderes locais.”

A prioridade, neste momento, é obter uma “ampla maioria” nas urnas, que dê “autonomia para decidir”.

“Soluções em cada momento”

Se vier a ter um governo minoritário, Carneiro prefere negociar a cada Orçamento do Estado à esquerda, encontrando “as soluções em cada momento”.

Já em entrevista à Renascença, voltou a tentar explicar-se.

“O que eu disse foi que não seria por mim que o Chega chegaria ao poder. Quer dizer que estou convicto de que ganharei as eleições e, portanto, por mim, o Chega não chega ao poder.”

“Eu concorro às eleições do PS para ganhar as eleições e ser secretário-geral e concorrer a primeiro-ministro. E concorro para ganhar as eleições. Isto num momento em que o país está a viver num quadro internacional muito exigente, com duas guerras, com fatores de imprevisibilidade internacionais muito grandes, nomeadamente a polarização política e o excesso de radicalização social.”

O PSD é o nosso principal competidor eleitoral. Ora, eu não posso partir para uma eleição diminuindo aquela que é a capacidade de disputa e de vitória eleitoral do PS. Quando chegarmos às eleições, vamos ver o peso que cada um tem.

Tem de se avaliar, em primeiro lugar, as condições políticas que se tem, ou seja, os resultados eleitorais. Foi assim em 2015. Mas convém que fique claro que eu vou bater-me para garantir uma maioria estável.

Sem inimizades, também mostra carisma

A prioridade de Carneiro passa, assim, por “roubar” votos à direita e não à esquerda, e é por isso que Carneiro garante que não se candidata em oposição ao “seu camarada” Pedro Nuno.

“Não me candidato em oposição ao meu camarada Pedro Nuno. Sinto que tenho condições para garantir estabilidade ao país”, afirmou.

Mas se afasta inimizades, também lança farpas.

“Há um pressuposto que nos separa: eu não demonizo o centro político e social”, lembra.

Enfrentado pela ideia de que Pedro Nuno é o candidato mais carismático — e que o carisma conta muito na mesa de voto — Carneiro não se deixou ficar: “o carisma é importante mas vê-se nas eleições e resultados eleitorais. Venci eleições com 50,88%, 66,84% e 71,41”, gabou-se.

“Governo continua a merecer confiança dos portugueses”

A António Costa elogiou as capacidades de liderança — um “homem sereno, capaz”, de quem “nunca” imaginou poder a vir a ser substituto.

“O Governo continua a merecer a confiança dos portugueses, o que é surpreendente”, confessou.

“Em momentos excecionais do nosso país, tivemos na liderança do país um homem sereno e capaz que garantiu a salvaguarda das famílias e das empresas. Temos uma relação de lealdade e amizade“, vincou.

Reforma na justiça, excluindo o Chega

Sobre a Operação Influencer, disse que “não devemos comentar o que desconhecemos”, lembrou que existe “presunção de inocência e deve evitar-se formular juízos”.

“O caso merece todo o cuidado e rigor nos procedimentos. Como representantes políticos da sociedade desejamos que o processo seja tão célere quanto possível. As pessoas não podem ter a vida em suspenso. Este caso tem uma sensibilidade muito especial. Para salvaguardar o prestígio das instituições, o primeiro-ministro tomou a decisão que tomou”, acrescentou, acusando o Chega de procurar “minar a confiança dos cidadãos”.

Pede, também, um acordo político alargado para uma reforma da justiça, excluindo o Chega e incluindo o PSD.

“É muito relevante termos um debate alargado na sociedade portuguesa que deve envolver os partidos políticos democráticos, as forças políticas e sociais”.

“Como é do conhecimento público, o Chega tem procurado minar a confiança dos cidadãos nas instituições. Não pode ser uma reflexão com aqueles que procuram ser beneficiários da destruição da confiança nas instituições democráticas. Dito isto, há dimensões importantes da justiça. Nessa reforma, devem estar os atores do sistema judicial”, declarou.

Acerca da privatização da TAP, promete respeitar as “decisões que estão tomadas por parte do Conselho de Ministros” e diz que “manter o hub de Lisboa é fundamental, essa é a sua função estratégica”.

Estamos a “eleger um líder, não um ouvinte”

“Naturalmente que o PS tem órgãos que têm de ser ouvidos para tomar decisões importantes”, mas “é suposto estar-se a eleger um líder, não um ouvinte”, confessa Miguel Pinheiro, comentador da CNN, que acredita que Carneiro continua a esquivar-se das questões de maior relevo.

José Luís Carneiro tem de ter convicções, uma estratégia, senão bastava ter uma máquina de contar votos internos”, dispara.

“Ele percebeu que a hipótese de viabilizar um Governo minoritário do PSD não foi bem acolhida dentro do PS” e por isso “agora não diz nada sobre nada. Os outros que decidam por ele”, remata.

Tomás Guimarães, ZAP //

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