Em apenas 2 semanas, já há 4 Comissões de Inquérito no Parlamento. Para que servem afinal?

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Tiago Petinga / Lusa

Os deputados eleitos para a Assembleia da República ainda não tomaram posse e já há quatro Comissões Parlamentares de Inquérito no horizonte.

O Bloco de Esquerda foi o primeiro partido a avançar com a proposta de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), logo depois de fechados os resultados das eleições legislativas de 10 de Março, para analisar a actuação do regulador no processo de reestruturação accionista do Global Media Group.

Depois disso, foi a vez do PAN, através da sua deputada única, Inês Sousa Real, pedir uma CPI ao processo de alteração da propriedade do grupo de media que detinha os jornais Diário de Notícias e Jornal de Notícias.

Entretanto, o Chega anunciou que vai pedir uma CPI ao caso das gémeas que envolve o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

E o PCP também referiu que vai avançar com uma CPI sobre a ANA – Aeroportos de Portugal.

O que é, afinal, uma CPI?

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito é uma investigação conduzida pelos deputados para “vigiar o cumprimento da Constituição e das leis”, e para “apreciar os actos do Governo e da Administração” Pública, realça o artigo 1 do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares.

Na prática, uma CPI é um inquérito realizado por deputados dos vários grupos parlamentares para apurar os factos sobre um determinado caso, envolvendo a audição das pessoas envolvidas e a análise de informação privilegiada, incluindo de documentos “confidenciais ou sigilosos”.

Quem pode convocar uma CPI?

A iniciativa dos inquéritos parlamentares cabe aos grupos parlamentares e aos respectivos deputados, mas também às comissões permanentes da Assembleia da República (AR).

A proposta para a realização de uma CPI precisa de ser aprovada por maioria simples no Parlamento, ou seja, por metade dos deputados mais um.

Mas também pode ser imposta pelo chamado “direito potestativo” com a aprovação de “um quinto dos deputados em efectividade de funções até ao limite de um por deputado e por sessão legislativa”, conforme consta do artigo 2 do Regime Jurídico.

Que tipo de assuntos pode analisar?

Uma CPI pode ser convocada para analisar qualquer “matéria de interesse público” relevante para o “exercício das atribuições” da AR, como destaca o artigo 1 do Regime Jurídico.

Mas só pode “ter por objecto actos do Governo ou da Administração ocorridos em legislaturas anteriores à que estiver em curso quando se reportarem a matérias ainda em apreciação, factos novos ou factos de conhecimento superveniente”, destaca o artigo 8 do Regimento Jurídico.

Mas para que servem?

Uma CPI é, acima de tudo, uma ferramenta de escrutínio do Governo e das instâncias da Administração Pública. Tem o intuito de detectar eventuais situações de ilegalidade, de abuso de poder, de favorecimento e de fraude.

Portanto, é um instrumento de fiscalização do poder legislativo que pode dar origem a processos judiciais.

As resoluções das CPIs podem ser comunicadas ao Procurador-Geral da República para este determinar a realização de um inquérito no Ministério Público (MP), como se explica no artigo 5 do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares.

As comissões parlamentares “gozam dos poderes de investigação das autoridades judiciais que a estas não estejam constitucionalmente reservados”, reforça-se ainda no artigo 13 do Regime Jurídico.

Também têm “direito à coadjuvação das autoridades judiciárias, dos órgãos da polícia criminal e das autoridades administrativas, nos mesmos termos que os tribunais”, aponta o mesmo artigo.

E se as pessoas chamadas à CPI faltarem? Ou mentirem?

“A falta de comparência, a recusa de depoimento ou o não cumprimento de ordens legítimas de uma CPI no exercício das suas funções constituem crime de desobediência qualificada, para os efeitos previstos no Código Penal”, nota-se no artigo 19 do Regime Jurídico.

Portanto, mentir numa CPI é o mesmo que mentir num tribunal e constitui crime.

Quanto às faltas, ou à recusa de prestar declarações, só podem ser justificadas “nos termos gerais da lei processual penal”. A “obrigação de comparecer” tem prioridade sobre “qualquer acto ou diligência oficial”, nota ainda o artigo 17.

Tem resultados práticos?

Nem sempre as CPI têm conclusões, ou efeitos, práticos.

A opinião pública tende a acreditar que as comissões parlamentares vão encontrar os “culpados” e levá-los a pagarem pelos seus actos ilegítimos. Mas o fundamento essencial das CPI não é condenar, nem aplicar a justiça. São um mero instrumento de investigação.

Assim, o resultado não é o mais importante para estes inquéritos parlamentares. Trata-se, acima de tudo, de descobrir a verdade sobre o que aconteceu, para explicar a situação aos cidadãos.

Porém, este escrutínio público pode dar origem a investigações judiciais que são sempre conduzidas pela MP.

Susana Valente, ZAP //

 

1 Comment

  1. Uma comissão de inquérito ao caso das gémeas brasileiras, penso ser fundamental para festejar os nossos 50 anos de democracia, e expor a podridão do “polvo” instalado.
    A seguir temos que ir ver o que aconteceu na Santa Casa da Misericórdia…

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