Romain Jean-Jaques

Ilustração da estrutura interna de um planeta de lava num estado frio, mostrando um oceano de magma no lado diurno coberto por uma atmosfera mineral
Através de simulações numéricas sem precedentes, novo estudo prevê dois estados evolutivos extremos.
Um novo estudo publicado na revista Nature Astronomy introduz uma estrutura teórica simples para descrever a evolução do sistema acoplado interior-atmosfera de exoplanetas rochosos quentes conhecidos como “planetas de lava”.
“Os planetas de lava estão em configurações orbitais tão extremas que o nosso conhecimento sobre planetas rochosos no Sistema Solar não se aplica diretamente, deixando os cientistas incertos sobre o que esperar ao observar planetas de lava”, diz o primeiro autor Charles-Édouard Boukaré, professor assistente no Departamento de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade York, no Canadá.
“As nossas simulações propõem um quadro conceptual para interpretar a sua evolução e fornecem cenários para investigar a sua dinâmica interna e as alterações químicas ao longo do tempo. Estes processos, embora ampliados nos planetas de lava, são fundamentalmente os mesmos que moldam os planetas rochosos do nosso próprio Sistema Solar”.
Mundos exóticos podem revelar processos que impulsionam a evolução planetária
Os planetas de lava são mundos com tamanhos que variam entre o da Terra e o de uma super-Terra, orbitando extremamente perto das suas estrelas hospedeiras e completando uma órbita em menos de um dia terrestre.
Muito semelhantes à Lua da Terra, espera-se que sofram acoplamento de maré, mostrando sempre a mesma face à sua estrela.
As suas superfícies diurnas atingem temperaturas tão extremas que as rochas silicatadas são derretidas — e até vaporizadas —, criando condições diferentes de tudo o que existe no nosso Sistema Solar. Estes mundos exóticos, facilmente observáveis devido ao seu período orbital ultracurto, fornecem informações únicas sobre os processos fundamentais que moldam a evolução planetária.
Investigando os interiores planetários através das propriedades da atmosfera e da superfície
O estudo combina conhecimentos em mecânica dos fluidos geofísicos, atmosferas exoplanetárias e mineralogia para explorar como as composições dos planetas de lava evoluem através de um processo semelhante à destilação.
Quando as rochas derretem ou vaporizam, elementos como magnésio, ferro, silício, oxigénio, sódio e potássio distribuem-se de forma diferente entre as fases vapor, líquida e sólida.
A configuração orbital única dos planetas de lava mantém os equilíbrios vapor-líquido e sólido-líquido ao longo de milhares de milhões de anos, impulsionando a evolução química a longo prazo.
Usando simulações numéricas sem precedentes, a equipa prevê dois estados evolutivos extremos:
- Interior totalmente derretido (provavelmente planetas jovens): a atmosfera reflete a composição planetária geral, e o transporte de calor dentro do interior derretido mantém a superfície do lado noturno quente e dinâmica;
- Interior predominantemente sólido (provavelmente planetas mais antigos): apenas permanece um oceano de lava raso no lado diurno, e a atmosfera fica empobrecida em elementos como sódio, potássio e ferro.
Testando hipóteses com o James Webb
Boukaré explica que esta investigação sobre exoplanetas de lava começou como um esforço altamente exploratório, com poucas expetativas iniciais. Baseia-se numa nova abordagem de modelação que ele desenvolveu para estudar planetas rochosos derretidos, em colaboração com colegas do IPGP (Institut de physique du globe de Paris), Universidade de Paris, publicada na revista Nature no início deste ano.
O que começou como um estudo exploratório abriu uma nova e promissora linha de investigação. As previsões descritas neste trabalho ajudaram a garantir 100 horas de tempo de observação no Telescópio Espacial James Webb (JWST) – o observatório infravermelho mais avançado já construído, com um espelho segmentado de 6,5 metros e instrumentos ultrassensíveis capazes de sondar as galáxias mais antigas e as atmosferas de exoplanetas distantes com uma precisão sem precedentes. Estas próximas observações do JWST, lideradas pela coautora Lisa Dang, da Universidade de Waterloo, irão testar diretamente o quadro teórico proposto neste estudo.
“Esperamos realmente poder observar e distinguir planetas de lava antigos de planetas de lava jovens. Se conseguirmos fazer isso, será um passo importante para ir além da tradicional visão instantânea dos exoplanetas”, afirma Boukaré.
// CCVAlg