Morgue para 400 pessoas em Valência. Infeções vão matar mais gente

CHEMA MOYA/EPA

Lixo acumulado, água suja e esgotos que vieram à superfície — e que provavelmente entraram em contacto com cadáveres — levaram ao uso obrigatório de máscara e luvas na cidade. “Temos estado sozinhos”.

Uma semana depois de a tragédia se ter instalado em Valência, o exército espanhol está a preparar uma morgue com capacidade para 400 corpos, numa altura em que o número de mortos confirmados se situa nos 215, de acordo com o Centro de Coordenação de Emergências da Generalitat de Valência.

“No início havia uma morgue montada para cerca de 100 vítimas, mas rapidamente percebemos que isso não seria suficiente”, disse Javier Marcos, chefe da Unidade Militar de Emergência (UME), durante uma conferência de imprensa esta segunda-feira.

Não se sabe quantas pessoas estão desaparecidas

As buscas pelos desaparecidos — cujo número oficial continua por divulgar — concentrou-se esta segunda-feira nas garagens e parques de estacionamento da cidade afetada pelas catastróficas cheias, onde centenas de veículos ainda se encontram submersos. À superfície, já não há mortos, garantem as autoridades.

Os militares, acompanhados de equipas de mergulho, focam-se neste momento em drenar a água de dois grandes parques de estacionamentos de centros comerciais nas localidades de Aldaia e Alfadar, segundo o jornal espanhol El Diario.

Outros desaparecidos podem estar agora debaixo de água, dentro de habitações ou cobertos de lama, cuja acumulação tem dificultado os trabalhos de resgate.

“Tudo indica que muitas pessoas morreram quando foram buscar o carro“, disse a presidente da Câmara de Paiporta, epicentro da tragédia: “Ainda não conseguimos aceder às garagens”.

Muitos ficaram com água até o pescoço, muitos idosos que moravam no rés-do-chão e que foram apanhados pela chuva e não conseguiram sair também morreram”, acrescentou Maria Albalat.

Lixo e água suja ameaçam saúde: “haverá mais mortos”

Além dos mortos ainda por confirmar, a saúde dos vivos já começa a preocupar seriamente as autoridades.

São as pessoas quem mais se esforça, com os seus próprios meios, para retirar os destroços e drenar a água, com bombas, e o lixo acumulado, água suja e esgotos que vieram à superfície — e que entraram em contacto com cadáveres — levaram à obrigatoriedade de usar máscara e luvas na cidade.

“Encontrámos muitos mortos e recomendaram-nos que puséssemos máscaras para as toxinas não nos infetaram. Luvas também”, disse uma local à CNN Portugal.

Haverá mais mortos por causa das infeções que vamos apanhar“, acredita outra moradora.

Sentimento de abandono. Valência em guerra com o Governo

O sentimento é de abandono. “Temos estado sozinhos”, diz uma moradora local, que confessa ter passado fome.

Por enquanto, ninguém assume responsabilidades pela falta de eletricidade, água ou rede móvel: o Governo regional e o Governo central trocam apenas acusações.

De um lado, Carlos Mazón, presidente da Comunidade Valenciana, que atribui a responsabilidade pela gestão da crise da DANA ao governo central e aos comandos militares, culpando-os pelo envio tardio do alerta para os telemóveis da população.

Do lado da Unidade Militar de Emergências (UME), o chefe-general explica: “desde o primeiro momento, todas as capacidades das Forças Armadas foram postas ao serviço da comunidade valenciana”: até “posso ter 1.000 soldados na porta de emergência, mas não posso entrar legalmente até que o diretor da emergência me autorize”.

Resposta à tragédia. Três crimes sob investigação

O Governo espanhol aprovou esta terça-feira declaração de zona de catástrofe, de modo a canalizar ajudas de Estado para começar a reconstruir as zonas afetadas pela DANA.

Um total de 17 mil militares, guardas civis e polícias foram mobilizados para ajudar a população valenciana, mas o Governo de Valência já pediu mais quatro mil agentes, estes destinados a garantir a ordem pública na sequência dos protestos violentos que levaram lama à cara do rei, rainha e primeiro-ministro de Espanha.

A justiça espanhola abriu ainda um inquérito sobre os incidentes, durante a visita dos responsáveis da monarquia e do governo. A investigação centra-se na possibilidade de existência de três crimes: atentado, desordem pública e danos, contam fontes judiciais citadas por diversos meios de comunicação social espanhóis.

O temporal causou muito provavelmente as maiores inundações europeias do século, segundo o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, que reconheceu que a situação é “trágica”.

Tomás Guimarães, ZAP //

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