Bombardeamentos na rota da missão da AIEA para Zaporíjia. Radiação “não precisa de visto para atravessar a fronteira”

Sergei Ilnitsky / EPA

As tropas russas estavam a bombardear a rota planeada que a missão da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) deveria seguir para aceder à central nuclear de Zaporíjia, disse o responsável pela região, Oleksandr Starukh, esta quinta-feira.

“Os russos estão a bombardear a rota pré-acordada da missão da AIEA desde [a cidade de] Zaporíjia até à central nuclear de Zaporíjia. A equipa da ONU não pode continuar a deslocar-se devido a razões de segurança”, escreveu no Telegram.

O responsável continuou: “A Ucrânia continua a fazer todos os esforços para organizar o acesso seguro da missão internacional da AIEA à central nuclear. Exigimos que a Federação Russa acabe com as provocações e conceda à AIEA um acesso sem entraves à instalação”.

Também na passada terça-feira, um dia antes do início da missão da agência, o conselheiro presidencial ucraniano Mikhailo Podoliak, acusou a Rússia de atacar os corredores de passagem dos inspetores.

Face às acusações de Kiev, o Ministério da Defesa russo emitiu uma declaração onde apresenta um resumo do que aconteceu na região da central nuclear nas últimas horas, referiu o Guardian.

“Hoje, por volta das 06:00, hora de Moscovo [04:00 em Portugal], as tropas ucranianas desembarcaram na costa do reservatório de Kakhovka, a três quilómetros a nordeste da central nuclear, em dois grupos de até 60 pessoas em sete barcos e tentaram conquistar a central nuclear”, indicou o ministério.

“Foram tomadas medidas para destruir o inimigo, recorrendo até à utilização de aviação militar. Além disso, desde as 08:00, hora de Moscovo [06:00 em Portugal], que as forças armadas da Ucrânia têm vindo a bombardear o ponto de encontro da missão da AIEA”, informou.

Moscovo disse ainda que quatro bombas explodiram muito perto da central nuclear e acrescentou que o objetivo de Kiev é “perturbar a chegada do grupo de trabalho da AIEA” à central nuclear.

Entretanto, a operadora ucraniana Energoatom avançou que um dos dois reatores operacionais da central nuclear foi encerrado devido a bombardeamentos russos.

“Como resultado de outro bombardeamento por parte das forças russas no local da central nuclear de Zaporíjia, a proteção de emergência foi ativada e a quinta unidade operacional foi encerrada”, escreveu a operadora no Telegram.

A Energoatom acrescentou que “a unidade de energia n.º 6 continua a funcionar no sistema energético da Ucrânia” e está a fornecer eletricidade para as próprias necessidades da central.

UE mais preocupada com “vistos”

Na quarta-feira, a porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros russo, Maria Zakharova, criticou a União Europeia (UE) e a gestão que os Estados-membros têm feito do que se tem passado em Zaporíjia.

“As crescentes tensões em torno da maior central nuclear da Europa, a de Zaporíjia, são de extrema preocupação”, disse em conferência de imprensa, acusando os “neonazis ucranianos de usarem armas da NATO” para “bombardear a central nuclear”, cujas “consequências podem ser imprevisíveis”.

“Eu entendo que a UE está mais ocupada com o tópico mais importante para si – emitir ou não vistos aos cidadãos russos”, apontou, indicando que “a radiação não tem passaporte. A radiação não precisa de visto para atravessar a fronteira”.

“Se acontecer alguma coisa com a central nuclear de Zaporíjia, não dependerá dos vistos, nem de passaportes, nem de fronteiras”, afirmou Maria Zakharova, reforçando que a UE, “por alguma razão incompreensível”, “não está nem um pouco preocupada” com uma possível “catástrofe nuclear”.

No mesmo dia destas declarações, os chefes de diplomacia da UE alcançaram, em Praga, um acordo com vista ao fim do acordo de facilitação de vistos com a Rússia. Portugal já se tinha mostrado favorável. Os estados-membros decidiram não impor uma proibição geral da concessão de vistos a cidadãos russos.

UE “é primariamente um território de valores”

Sobre a emissão de vistos aos cidadãos russos, o Presidente da Ucrânia declarou que a UE “é primariamente um território de valores, não de consumo primitivo”.

“Quando os cidadãos do Estado que quer destruir os valores europeus usam a Europa para o seu entretenimento ou para compras, para as férias das suas amantes enquanto eles próprios trabalham para a guerra ou simplesmente esperam silenciosos a queda imortal da Rússia, que está acontecer agora mesmo, isto é completamente contrário a tudo aquilo pelo qual Europa foi unida”, destacou Volodymyr Zelenskyy.

No seu discurso diário, disse que a “Europa não pode tornar-se moralmente surda. E nenhum dos líderes poderá justificar o facto de que o dinheiro alegadamente não tem cheiro para eles devido às consequências da covid-19”, afirmou.

Para Zelenskyy, não existirá uma Europa pacífica caso se perca a capacidade para “distinguir o cheiro de sangue nas notas”. “Acho que é humilhante para a Europa quando é considerada apenas como uma grande loja ou restaurante”, frisou.

Russos cobrem cadáveres com cloro e cimento

As forças russas estarão a cobrir os cadáveres no teatro de Mariupol com cloco e cimento, revelou o conselheiro do governador da região, Petro Andriushchenko, indicando que o objetivo é eliminar provas. O local, que acolhia centenas de civis, incluindo menores, foi bombardeado a 16 de março.

“Os ocupantes estão a esconder os próprios crimes de guerra, o assassinato em massa de 600 civis no teatro de Mariupol”, afirmou o responsável, citado pela Ukrinform, notando que os russos estão com “pressa” para apagar as evidências.

Os invasores justificaram a reconstrução com o “valor histórico” do teatro, mas “o único valor histórico surgiu quando duas bombas foram largadas. E este é o valor histórico que os ocupantes estão agora a tentar esconder”, disse.

Na quarta-feira, o departamento de comunicação estratégico das Forças Armadas da Ucrânia denunciou, no Telegram, que as forças russas estão a cobrir a área do teatro com cloro, para disfarçar o cheiro dos cadáveres, e a “tapar os corpos das vítimas com cimento” para os esconder.

De acordo com os residentes locais, os construtores foram instruídos a não criar confusão, a deixar os corpos no local e a “trabalhar silenciosamente”.

Este foi o bombardeamento mais mortal desde o início da invasão russa. O número de vítimas é incerto, mas as autoridades ucranianas estimam que pelo menos 300 civis morreram. Uma investigação da Associated Press aponta para 600 vítimas mortais.

ZAP //

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