A batalha “na lama” entre Montenegro e Pedro Nuno Santos

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Miguel A. Lopes / LUSA

Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro

Em pleno Dia da Mulher, a política portuguesa foi dominada pelas trocas de críticas entre dois homens, com Montenegro e Pedro Nuno Santos a acusar-se mutuamente de atirar Portugal para a lama.

Por estas horas, há uma expressão que domina a política portuguesa: estar na lama. O mote foi lançado pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, que disse ontem que lhe parece não haver alternativa a eleições antecipadas, garantindo que é sua responsabilidade “evitar que Portugal seja um país envolto em lama”.

“A minha responsabilidade, e parece que não há alternativa a isso, é devolver aos portugueses a capacidade que só eles têm de escolher o que querem para Portugal”, disse Luís Montenegro num almoço do PSD no âmbito do Dia da Mulher, na Maia.

Abordando os “complexos” últimos dias, na sequência do caso envolvendo a empresa da sua família, e que recentemente foi passada aos filhos, o líder social-democrata disse que a sua responsabilidade era “evitar que Portugal seja um país envolto em lama”, “que as instituições portuguesas sejam corroídas pela irresponsabilidade de quem quer manter o espaço público permanentemente enlameado“.

“Nunca foi o meu desejo, nunca foi e tenho a noção que os portugueses nem sequer percebem porque é que isso vai acontecer, mas eu tenho a obrigação, pela responsabilidade que me está confiada, de saber antecipar os problemas”, afirmou.

O líder do PSD e chefe do Governo rejeitou deixar o país a viver “um ano ou um ano e meio de instabilidade quando pode resolver essa instabilidade em dois meses“.

“Acho que o primeiro-ministro não fez nem mais nem menos do que faz qualquer português”, considerou ainda Luís Montenegro ao concluir um raciocínio em que referiu não lhe parecer que fique mal “ter trabalhado”, “dizer em que é que trabalhou” e que “tenha decidido que uma parte do trabalho que lançou possa ser legado a membros da sua família”.

“Se é verdade que o primeiro-ministro tem responsabilidades que mais nenhum português tem, também quero que saibam que este primeiro-ministro se sente exatamente igual a qualquer outro português. Assumindo essas responsabilidades, mas sendo igual aos outros”, apontou.

Luís Montenegro voltou a reiterar que não cometeu qualquer ilegalidade ou ilicitude. “Imputam ao primeiro-ministro alguma ilegalidade? Parece que não. Imputam ao primeiro-ministro algum comportamento ilícito? Também não. Parece que o primeiro-ministro tem a responsabilidade de ter trabalhado“, ironizou.

O líder do PSD afirmou ainda que as acusações de ser “avençado de quem quer que seja” são “sem fundamento”, afirmando que cessou funções na empresa Spinumviva “não sendo obrigado a fazê-lo, antes de ser presidente do PSD, em 2022”.

A atual crise política teve início em fevereiro com a publicação de uma notícia, pelo Correio da Manhã, sobre a empresa familiar detida à altura pelos filhos e pela mulher de Montenegro, com quem é casado em comunhão de adquiridos, levantando dúvidas sobre o cumprimento do regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos públicos e políticos.

A empresa Spinumviva também recebia até há poucos dias uma avença mensal de 4500 euros do grupo Solverde, noticiou o Expresso na semana passada. Esta relação entre o primeiro-ministro e o grupo Solverde também levantou dúvidas de imparcialidade, dado que se antecipa que a concessionária de casinos vá negociar a renovação das licenças com o Governo no fim deste ano.

A empresa revelou depois que outros dos seus clientes foram o grupo Ferpinta, a Radio Popular ou o Colégio Luso-Internacional do Porto (CLIP). Na sexta-feira à noite, o Observador noticiou ainda que a Spinumviva recebeu 194 mil euros da empresa do pai do candidato do PSD à Câmara de Braga, João Rodrigues.

Luís Montenegro anunciou no dia 1 de março que a Spinumviva passaria a ser detida apenas pelos filhos e deu algumas explicações sobre a empresa. Na mesma declaração admitiu apresentar uma moção de confiança caso os partidos não dessem garantias de que o executivo teria condições para governar. O PCP anunciou logo de seguida a apresentação de uma moção de censura, que foi chumbada, apenas 12 dias depois de o parlamento ter rejeitado uma outra, do Chega.

“Foi Montenegro quem criou a lama”

Em resposta a Montenegro, o secretário-geral do PS acusou o primeiro-ministro de “estar na lama” para a qual arrastou PSD, Governo e agora querer levar também o país, voltando a sugerir que Montenegro “esteve avençado” durante quase um ano.

À entrada para a apresentação da candidatura à presidência da Câmara de Lisboa de Alexandra Leitão, Pedro Nuno Santos foi questionado sobre as palavras do presidente do PSD.

“Não deixa de ser caricato, porque quem criou a lama foi Luís Montenegro. Luís Montenegro está na lama, arrastou o PSD e o seu governo para a lama e agora quer atirar o país para a lama”, acusou.

Pedro Nuno Santos considerou que Montenegro “só se pode mesmo queixar de si próprio e não é dos portugueses, não é dos partidos políticos”.

Tem que se deixar de vitimizar, assumir as responsabilidades, porque aquilo que nós precisamos é de um primeiro-ministro com coragem, com frontalidade, com transparência e não alguém que se esconda sempre atrás dos outros, que responsabiliza toda a gente e revela ainda não ter percebido que nós infelizmente estamos nesta situação por causa dele e de mais ninguém”, acusou.

Questionado se também não vê alternativa a eleições antecipadas, o líder do PS acusou Luís Montenegro de fugir “do apuramento da verdade, como o diabo foge da cruz”.

“E, portanto, tudo vale para evitar o inquérito, nomeadamente a Comissão Parlamentar de Inquérito e o esclarecimento. Já não basta dar respostas. É preciso conseguir convencer-nos a todos de que nós não tivemos, o que já é cada vez mais difícil, não tivemos um primeiro-ministro avençado durante quase um ano”, avisou.

Pedro Nuno não foi o único líder partidário a contestar a atitude de Montenegro. Em declarações aos jornalistas à margem de vários eventos que assinalaram o Dia da Mulher, os partidos de esquerda também criticaram o primeiro-ministro.

“O que se sabe hoje é suficiente para concluir que o primeiro-ministro teve uma atuação incompatível com o cargo de governação que tinha, e daí não querer explicar mais, porque há coisas que não têm explicação”, considera Paulo Raimundo, líder do PCP.

Do lado do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua acusa Montenegro de procurar muito “um motivo, uma oportunidade para eleições, mas escolheu o pior momento para o fazer, porque é um motivo que põe em causa a sua própria legitimidade enquanto primeiro-ministro”.

Já Inês de Sousa Real, do PAN, afirma que Portugal “está a assistir a um braço de ferro entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos” e lamenta “que o primeiro-ministro não tenha dado os esclarecimentos necessários ao país e ao Parlamento no tempo certo”.

A deputada do Livre Isabel Mendes Lopes acusa Montenegro de “não prestar esclarecimentos no tempo devido” e não perceber que “tem um grande problema de confiança do país”.

O parlamento debate na próxima terça-feira a moção de confiança apresentada pelo Governo, que tem chumbo anunciado, com o PS, que tinha anunciado dois dias antes uma comissão de inquérito ao caso, a advertir que não a viabilizará. A rejeição de um voto de confiança implica a demissão do Governo. O Presidente da República, face a este cenário, já antecipou que as datas possíveis para realizar legislativas antecipadas o mais breve possível é em 11 ou 18 de maio.

ZAP // Lusa

1 Comment

  1. Quem quer atirar o país para a lama é quem derrubar o governo, por votação no parlamento. Se PNS não quer eleições é só fazer como fez com a moção de censura do PCP: alterar o sentido de voto para abstenção. De contrário, será ele o rosto do bota-abaixo.

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