O Ministério Público (MP) está a investigar os contornos que envolveram a construção do Centro POAO, o megacentro comercial chinês grossista, no Porto Alto, Samora Correia, concelho de Benavente, que foi anunciado em 2016 como um investimento de 40 milhões de euros.
Este centro funciona como entreposto comercial onde as lojas chinesas se podem abastecer. Em causa, revela o Público, estão várias denúncias, entregues ao MP e à PSP, por investidores chineses que alegam que foram vitimas de burla e que entraram no negócio para conseguir um visto gold.
Também conhecido como Golden Visa, criado pelas autoridades portuguesas em outubro de 2012, este documento consiste numa autorização de residência para atividade de investimento concedida a nacionais de Estados que não integrem a UE, atribuída mediante a realização de investimento, empresarial ou imobiliário, em território português.
As queixas foram apresentadas contra a empresa promotora do investimento, a POAO II – investimentos imobiliários, os seus sócios e gerentes, os advogados que a representam, Rui Cunha, Glória & Associados, assim como a tradutora que surge com o nome de Viviane.
Jin Wenjun e o marido, Cao Wei, estão entre os queixosos, assim como Xiaochen Jia e a mãe, Yawei Zhang. De acordo com Jin Wenjun, “terão investido neste negócio, desde 2014 até 2017, cerca de 50 famílias chinesas”. “Estamos a falar de investimentos mínimos de 500 mil euros. Estamos falar de mais de 20 milhões de euros no total”.
A maior parte das queixas refere-se ao facto de, no contrato de promessa compra e venda, que foi redigido em português e chinês, existirem duas palavras diferentes para definir o tipo de imóvel que estariam a adquirir. “Em português, está escrito armazém, mas em chinês está loja”, explica Jin Wenjun, que garante que jamais compraria um armazém.
A investidora diz que o que lhe foi apresentado como negócio e o que acreditava que estava a comprar “eram duas lojas num conceituado centro comercial, perto de Lisboa por mais de 551 mil euros” e não “dois armazéns num centro grossista, onde só podem ir lojistas e que neste momento parece um local fantasma porque são poucos os armazéns que estão ocupados”.
“Senti-me enganada, isto é uma burla. E tive de esperar quatro anos, além do previsto, para ter os armazéns em meu nome”, conta, sublinhando que em março de 2015, além do contrato de promessa compra e venda, foram assinados mais dois: “Um contrato de promessa de arrendamento para fins não habitacionais e outro de promessa de recompra dos imóveis”.
De acordo com os documentos, a POAO II- Investimentos Imobiliários comprometia-se a arrendar à compradora os armazéns, pagando 1.500 euros por mês durante cerca de cinco anos e após este período comprometia-se a recomprar os imóveis pelo valor que tinham sido adquiridos.
Além da questão da tradução, os investidores levantam dúvidas sobre os valores pagos e referem mesmo que os preços atuais das lojas em Samora Correia ascendem, no máximo, a 750 euros o metro quadrado e que, por isso, os preços dos armazéns na mesma localidade devem estar por metade do valor das lojas.
Os denunciados acompanhavam os clientes à Caixa Geral de Depósitos onde abriam uma conta bancária e onde os investidores colocavam os capitais necessários ao investimento. Essas contas seriam depois movimentadas pela advogada Glória Ribeiro, algo que não lhes terá sido dito quando abriam a conta.
Na assinatura dos contratos de promessa compra e venda, era pago o sinal e a advogada, que movimentava a conta, transferia também a totalidade do valor da compra. A POAO II contraía empréstimos e hipotecava as frações que já estariam vendidas. Estes contratos com hipoteca para a concessão de crédito não eram do conhecimento dos compradores.
Para já, chegaram oito queixas ao MP e referem que estão a ser denunciados factos suscetíveis de integrar os crimes de burla qualificada e de falsificação de documento.