Pães, massas e queijos dos supermercados e padarias passaram a poder conter farinha das larvas do besouro tenébrio – uma fonte sustentável de proteínas e outros nutrientes. Mas, para muitos, a ideia continua a causar repulsa.
Muita gente perde o apetite só de pensar em “bichos” na comida. Essa reação é o que os cientistas apelidam de “tabu alimentar”: certos animais, plantas ou fungos, embora comestíveis, são considerados inaceitáveis no contexto de um determinado espaço cultural ou grupo social e, portanto, não são consumidos.
Hindus praticantes não comem carne de vaca, muçulmanos e judeus rejeitam carne suína; e nas culturas ocidentais, muitos têm aversão a insetos. No entanto, eles fazem parte da alimentação de cerca de dois mil milhões de seres humanos, sobretudo em partes da África, Ásia, América Central e do Sul, segundo estimativas da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) — mais de duas mil espécies de insetos são consideradas comestíveis.
Agora, pela primeira vez na União Europeia (UE), será possível incluir farinha feita com larvas em alimentos para consumo humano. Trata-se do estado larval do besouro Tenebrio molitor, mais conhecido como larva-da-farinha, pulverizado. Não se preocupe: o seu pão não vem com vermes, lagartas inteiras ou grilos fritos.
A farinha de alto teor proteico poderá ser adicionada em pequenas quantidades a pães, bolos e produtos semelhantes, massas e produtos processados de batata ou queijo.
Para cada inseto adicionado aos seus produtos, os fabricantes devem requerer uma licença no âmbito da regulamentação de “Novel Food” — alimentos que não tinham sido consumidos de forma significativa por seres humanos na UE antes de 15 de maio de 1997. Depois, a Autoridade Europeia para Segurança Alimentar (EFSA) faz uma avaliação científica exaustiva.
As quantidades máximas de farinha de larvas são modestas: em pães e bolos, só são permitidos quatro gramas para cada 100 gramas do produto final; em queijo, não mais de um grama. A irradiação com raios ultravioleta elimina eventuais patógenos, além de aumentar a taxa de vitamina D3 no pó.
Alimento milagroso?
As larvas deste besouro contêm nutrientes importantes como ferro, zinco e vitaminas do complexo B. A farinha recém-liberada tem um conteúdo proteico de 50% a 55%, incluindo todos os nove aminoácidos essenciais, gorduras saudáveis e fibras alimentares.
Além disso, a produção da farinha de larvas é menos prejudicial para o clima do que a de fontes de proteína tradicionais, como vacas, porcos ou galinhas. Os insetos requerem menos água, menos ração e menos espaço, além de emitirem menos gases de efeito de estufa.
Mas… o pão e o queijo já são feitos com animais?
Uma crítica à autorização da farinha de larvas é a sua origem animal, mas há muito tempo que componentes animais estão presentes nos produtos de panificação, massas e queijos. Só que não é fácil identificá-los, pois ficam ocultos por trás de aditivos ou de termos técnicos.
Para tornar a massa mais maleável, por exemplo, as padarias industriais utilizam l-cisteína (E920), um aminoácido frequentemente extraído de pelos de porcos ou de penas, que não tem de ser declarado.
Cerca de 35% do queijo vendido contém coalho líquido, um conjunto de enzimas provenientes do estômago de ruminantes, geralmente bezerros, que decompõem as proteínas lácticas, espessando o leite, sem torná-lo ácido, ao separar os componentes sólidos dos líquidos.
Muitos alimentos contêm, ainda, gelatina. Essa mistura proteica, retirada da pele e ossos de bovinos e suínos, estabiliza molhos e cozidos, engrossa queijos frescos e aglutina os flocos e grãos das barras de cereais.
Insetos foram autorizados na UE em 2021
Desde 2021, quatro insetos estão autorizados para consumo humano na União Europeia, geralmente em forma desidratada e pulverizada: as larvas dos besouros Tenebrio molitor e Alphitobius diaperinus, o gafanhoto-migratório (Locusta migratoria) e o grilo doméstico (Acheta domesticus).
Estes já são encontrados, entre muitos outros, em produtos de carne e panificação, massas, misturas para pão e pizza, salgadinhos de pacote, chocolate, queijo, geleias, muesli e granola ou barras de cereais.
E “atualmente, existem 5 pedidos para insetos destinados a serem comercializados em diferentes formas, que estão sujeitos a uma avaliação de segurança pela AESA”, diz o comunicado europeu.
Quem faz questão de evitá-los deve ler cuidadosamente a lista de ingredientes, pois, segundo as regulamentações da UE, os insetos presentes nos alimentos têm de ser declarados especificamente, assim como a forma como são utilizados. Por último, a embalagem deve conter uma advertência sobre eventuais reações em consumidores alérgicos a crustáceos, moluscos e ácaros domésticos.
ZAP // DW
” je suis Bear Grills”