A revisão à lei dos metadados e a votação a novas propostas para a legalização da eutanásia são dois temas que vão marcar a agenda do Parlamento nas próximas semanas.
Com o Orçamento de Estado aprovado na especialidade, a Assembleia da República fica finalmente livre para discutir outros temas antes do encerramento para férias parlamentares em Agosto.
Já amanhã, 1 de Junho, os deputados vão realizar um debate de urgência pedido pelo Chega sobre o acolhimento de refugiados ucranianos em Setúbal, que foram recebidos por russos acusados de serem próximos do Kremlin. A constituição de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar este caso também vai ser debatida amanhã, outra iniciativa que partiu do Chega.
Outro tema que promete aquecer o Parlamento é o desenho de uma nova lei dos metadados, depois do acórdão do Tribunal Constitucional (TC) ter declarado a actual legislação inconstitucional.
Em causa está uma norma de 2009 que obriga as operadoras a guardar os metadados dos clientes (como a localização, quem contactam ou o endereço IP) durante um ano, caso estes sejam úteis em investigações criminais.
O TC declarou a lei inconstitucional devido a preocupações com a privacidade dos cidadãos e há agora preocupações de que este acórdão possa ter efeitos retroactivos e levar a que sejam revertidas condenações em casos onde os metadados foram provas importantes, como o roubo de armas em Tancos ou o homicídio de Luís Grilo.
O chumbo dos juízes já levantou preocupações sobre uma possível revisão constitucional, uma hipótese que António Costa inicialmente defendeu, mas que entretanto abandonou — isto porque uma mexida à Constituição não chega devido à decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, que em 2014 considerou que a lei portuguesa violava o princípio da proporcionalidade.
Ou seja, a lei continua a ser ilegal no plano europeu mesmo que se mexa na Constituição portuguesa, pelo que é preciso mudar-se a legislação. Neste sentido, o Governo e vários partidos já apresentaram propostas de alteração à lei que vão a votos na sexta-feira.
Do lado do PS, o documento estipula que deixe de existir uma base de dados criada especificamente para as investigações criminais e que as autoridades passem antes a aceder às bases das operadoras criadas no âmbito da sua actividade comercial.
A Ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, fala numa “mudança de paradigma” e esclarece que as investigações passarão a usar “os dados de que hoje, correntemente, as operadoras já dispõem”.
A proposta do PSD mantém a base específica para as autoridades, mas limita o período de conservação dos dados, que passa de um ano para 12 semanas, e proíbe a transferência destes dados para fora da UE, sendo que o titular deve ser informado de qualquer transmissão das suas informações privadas desde que esta notificação não ponha em causa uma investigação criminal.
O Chega também sugeriu mudanças à lei, como um período de limite de seis meses para as operadoras guardarem os dados e uma proibição à recolha de informações relativas à localização, abrindo uma excepção se um juiz pedir a recolha destes dados em casos específicos.
Os comunistas defendem, tal como o PSD e o Chega, o encurtamento do prazo de conservação dos dados para 90 dias. Independentemente da versão final da lei, o diploma terá de ser novamente averiguado pelos juízes do Palácio Ratton antes de ser promulgado pelo Presidente da República.
Eutanásia de volta ao plenário
A morte medicamente assistida vai também voltar a ser discutida e irá a votos pela quarta vez nos últimos quatro anos. O tema foi inicialmente chumbado por cinco votos em Maio de 2018, mas a lei foi depois aprovada na legislatura seguinte, em 2020. Marcelo Rebelo de Sousa pediu uma fiscalização sucessiva ao documento ao Tribunal Constitucional, que fez algumas recomendações de alteração aos deputados.
O Parlamento aprovou assim uma nova proposta em Novembro de 2021, que foi vetada pelo Presidente da República. Os partidos vão agora tornar a apresentar propostas para a legalização da eutanásia, com textos do PS, do BE, do PAN e da IL — os mesmos grupos parlamentares que escreveram a proposta que caiu perante o veto de Belém.
Devido à maioria absoluta do PS, antecipa-se já uma aprovação do diploma, apesar de os socialistas e de os sociais-democratas darem liberdade de voto aos deputados neste tema fracturante, lembra o DN.
Mesmo que haja dissidentes no PS, os votos dos deputados dos outros partidos favoráveis à legalização da eutanásia devem ser suficientes para a aprovação da lei. Luís Montenegro, o recém-eleito líder do PSD, é favor de a convocação de um referendo a este tema, mas esta ideia já está condenada ao chumbo.
O diploma deve sair da Assembleia da República em Setembro. A posição de Marcelo Rebelo de Sousa ainda não é clara, podendo o Presidente voltar a vetar a lei, enviá-la para o TC ou decidir promulgar.