“Os jovens precisam de ser munidos de uma linguagem emocional”. No ano passado, a PSP recebeu 2215 denúncias de violência no namoro.
Segundo o Público, as faixas etárias até aos 18 anos e dos 18 aos 25 anos constituem mais de um terço das denúncias feitas nos últimos três anos. As vítimas são sobretudo do sexo feminino.
O número de denúncias de violência no namoro que têm chegado à PSP nos últimos três anos não tem diferido muito, e isso traz boas e más notícias, diz o intendente Hugo Guinote, coordenador nacional do policiamento de proximidade.
“Há sempre duas interpretações quando temos uma estabilização de dados. Por um lado, percebemos que a sensibilização e a mensagem para que as pessoas não deixem de denunciar estão a passar, e isso é positivo. Por outro, também percebemos que o número de episódios de violência não está a evoluir“, diz.
Neste Dia de S. Valentim, a polícia apela, mais uma vez, à denúncia destes crimes.
Em 2021, chegaram à PSP 2215 denúncias de violência no namoro, a maior parte das quais (1279) relativa a situações entre ex-namorados.
As restantes 936 são referentes a relações que ainda decorriam. As vítimas são, na sua grande maioria, do sexo feminino. Em 2020 houve 2006 denúncias, e em 2019 os números chegaram a 2100.
Apesar de salientar que os casos são transversais a todas as faixas etárias, a PSP esclarece ainda que, das 6321 denúncias recebidas nos últimos três anos, mais de um terço (2266 casos) diz respeito a vítimas até aos 25 anos, sobretudo entre os 18 e os 25 anos — foi a este grupo que se referiram 643 denúncias recebidas em 2021.
“Os números a que chegámos também resultam de estarmos sempre a evoluir nesta matéria. Antes, a violência psicológica não era tão valorizada como hoje, assim como aquela praticada através das redes sociais. Ao termos novas formas de violência a serem consideradas, o número de participações tenderia a aumentar“, afirma o coordenador Hugo Guinote.
Mas nem sempre é fácil levar a vítima a denunciar o caso ou, sequer, a perceber que está a ser alvo de algum tipo de violência, esclarece o responsável da PSP.
“Infelizmente, não é fácil para um jovem de hoje distinguir a fronteira ente o que é um contacto físico que possa ser interpretado como uma brincadeira daquele que passa a ser uma agressão. É isso que tentamos desconstruir com as ações da Escola Segura. Na violência no namoro o problema é mais ou menos o mesmo“, acrescenta.
“Numa fase inicial, o comportamento de controlo e humilhação não é tão linear para quem está a ser vítima que o leve a promover a denúncia. Existe sempre a esperança de que, conversando, se vão entender, ou a ideia de perdoar, porque amanhã se invertem os papéis”, afirma o intendente Hugo Guinote.
E é por isso, considera, que as muitas ações de sensibilização que a Escola Segura tem vindo a desenvolver nos estabelecimentos de ensino há vários anos — entre o início de 2019 e o final de 2021, apenas 3062 foram dedicadas à violência no namoro, abrangendo um universo de 46.058 alunos — não são suficientes para começar a inverter este estado de coisas.
“Tem de ser trabalhado o lado emocional dos jovens. Eles precisam de ser munidos de um vocabulário emocional e, enquanto isso não for feito, vai sendo mais difícil encontrarmos formas de fazer diminuir os comportamentos deste tipo”, diz.
“E é preciso perceber que quem hoje pratica violência no namoro amanhã poderá ser autor de violência doméstica e de outros tipos de violência. Porque, não havendo intervenção sobre estes comportamentos, eles são normalizados”, refere.
Não banalizar a violência
Segundo a perceção deste responsável, os jovens apresentam problemas de relacionamento diferentes dos das gerações anteriores.
“Percebemos que esta geração de alunos está com algum défice no seu relacionamento e na gestão emocional e a nós preocupa-nos, pelo momento atual que vivem na escola e pelo que podem representar na sociedade no futuro. Para as gerações mais velhas, era normal pegar no telefone e conversar, ou cumprimentar um desconhecido na rua”, sublinha o responsável.
“São situações que não são tão fáceis para os jovens de hoje, assim como o estabelecimento de afetos e de gestos de afeto. Há uma reserva maior da parte deles, uma inabilidade em lidar com a frustração, uma insegurança nas relações; e pessoas com tendência introspetiva, com dificuldade em estabelecer relações com os outros, podem desenvolver comportamentos agressivos. E no namoro tudo isso é potenciado”, defende.
Assim, a PSP insiste que é necessária uma intervenção cada vez mais precoce, mesmo com crianças.
“A banalização da violência começa logo nas crianças mais novas, que, mesmo sem querer, facilmente acedem a conteúdos de enorme violência. Temos de refletir sobre se é isto que queremos”, alerta.
Hugo Guinote nota que “entre 40% e 50%” das denúncias de violência no namoro chegam à PSP através da Escola Segura”. A PSP é também o recipiente de 67% do total de queixas deste tipo de violência, sendo as restantes 33% reportadas à GNR.
Aproveitando, mais uma vez, o Dia de S. Valentim, que se comemora esta segunda feira, a PSP inicia a operação “No Namoro não Há Guerra“, que, até ao dia 25 de fevereiro, vai levar novas ações de sensibilização sobre a violência no namoro e doméstica aos jovens do 3.º ciclo e do secundário.
Em comunicado, a PSP relembra que atos de violência no namoro “são um indício da necessidade de intervenção especializada”, frisando que “a violência não é tolerável, nem desculpável, mas quem agride precisa de ser ajudado“.
Quem for vítima deste ou de outro tipo de violência deve denunciá-lo, insiste, apresentando queixa numa esquadra, pedindo ajuda às equipas da Escola Segura ou de Proteção e Apoio à Vítima.