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Tribunal de Contas alerta para risco de incumprimento do PRR

Mário Cruz / Lusa

O Tribunal de Contas (TdC) alerta, esta terça-feira, para o risco de incumprimento do Programa de Recuperação e de Resiliência (PRR).

“No período compreendido entre 2014 e 2020, o PT2020 registou sempre baixas taxas de execução, motivadas por fatores de natureza corrente”, lê-se numa auditoria do Tribunal de Contas, que precisou que, em sete anos, foi concretizado perto de 60% dos cerca de 26 mil milhões de euros de financiamento europeu.

Neste sentido, o TdC alertou para o risco de absorção de mais de 60 mil milhões de euros nos próximos anos, “dos quais uma boa parte (PRR – Plano de Recuperação e Resiliência) tem que ser executada num período inferior ao dos normais períodos de programação e engloba investimentos complexos”, notando ser necessário “multiplicar exponencialmente” a capacidade de absorção do financiamento.

Conforme apontou, os baixos níveis de execução justificam-se com o “arranque tardio” dos programas operacionais, o que, por sua vez, se deve, nomeadamente, à respetiva aprovação tardia, complexidade e morosidade de designação das autoridades de gestão, atrasos na estabilização das competências a delegar e na negociação com os organismos intermédios e à “demorada definição” dos sistemas de informação.

A isto soma-se o facto do encerramento do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) ter sido operado pelos mesmos recursos humanos afetos às equipas de apoio às autoridades de gestão dos programas do PT2020.

Por outro lado, o TC identificou a falta de recursos humanos nas estruturas de apoio, a necessidade de aguardar por orientações centrais e de articular a “competência de atuação com entidades diversas”, morosidade nos avisos de abertura de concursos, complexidade na articulação de componentes de financiamento de fundos diferentes, “falta de atratividade” de apoios e desinteresse dos beneficiários.

Verificaram-se também atrasos na obtenção de autorizações, morosidade na análise dos pedidos de pagamento, dificuldades de operacionalização e dos organismos intermédios em dar resposta, dentro do prazo, às tarefas dadas pelas autoridades de gestão.

“As alterações legislativas entretanto introduzidas ao regime da obtenção de autorizações e pareceres prévios e da contratação pública podem gerar riscos acrescidos de redução da qualidade dos projetos e de fraude, que exigem a implementação de novos controlos”, acrescentou.

Em 2018, o PT2020 foi alvo de reprogramações tendo em vista o seu ajustamento ao contexto socioeconómico, bem como a reformulação dos indicadores do quadro de desempenho e respetivas metas.

Em virtude destas alterações, e até ao final do mesmo ano, foram retirados 54 indicadores aos 299 previstos, adicionados 45 e alteradas metas intermédias em 188 indicadores. Para o TC, esta alteração veio demonstrar que a programação inicial “não era nem rigorosa nem realizável”.

Apesar das reprogramações, os objetivos intermédios não foram totalmente cumpridos. De acordo com o tribunal, que citou dados da avaliação intermédia de 2019, com referência ao final de 2018, em 24,1% dos eixos e prioridades, os objetivos não foram cumpridos, percentagem que ascenderia a 62% caso as metas não tivessem sido revistas.

As metas foram alcançadas em 87,2% dos indicadores. No entanto, sem a revisão, “e partindo do princípio de que relativamente aos 54 indicadores retirados da reprogramação não existiam expectativas de cumprimento, apenas 51,5% das metas iniciais atingiram os níveis de execução necessários ao cumprimento dos objetivos intermédios”.

Por programa, no continente, apenas três cumpriram a totalidade dos objetivos intermédios – Programa de Desenvolvimento Rural (PDR), Programa Operacional Capital Humano (POCH) e Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso dos Recursos (POSEUR). Já nos programas regionais constatou-se o “maior incumprimento dos objetivos”, destacando-se, pela negativa, o Alentejo 2020.

No que concerne aos montantes afetados, o menor desempenho foi na promoção da inclusão social e no combate à pobreza e discriminação.

O incumprimento dos objetivos levou a uma penalização de 110,8 milhões de euros da reserva de desempenho do Fundo Social Europeu (FSE), 60,7 milhões de euros no Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e de 2,3 milhões de euros no Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP), realocação que ocorreu dentro de cada programa, evitando a perda de fundos em consequência da avaliação do desempenho.

O Tribunal de Contas recomendou ao ministro do Planeamento, Nelson de Souza, a adoção de medidas para mitigar as causas que impedem uma maior absorção dos fundos, a publicitação do calendário de avisos de abertura de concursos para que os beneficiários possam preparar as candidaturas atempadamente, a sensibilização das entidades para a necessidade de cumprimento dos requisitos procedimentais e uma melhor articulação entre os programas operacionais temáticos e regionais na definição dos critérios de seleção dos beneficiários.

Adicionalmente, recomendou que seja assegurada a “efetividade da contrapartida nacional dos investimentos cofinanciados pelos fundos europeus” e ainda a criação de condições para a implementação de um sistema de avaliação e gestão do desempenho dos fundos, “que contenha os estímulos necessários a uma adequada orientação para o resultado”.

À Agência para o Desenvolvimento e Coesão, que assegura a coordenação dos fundos europeus, é sugerida a identificação das causas e riscos do desajustamento dos indicadores e das metas, a análise e resolução da falta de atratividade e execução das medidas que não despertem o interesse dos beneficiários e a promoção de mecanismos ajustados de controlo e gestão da transparência na aplicação dos fundos.

Acresce ainda a recomendação para assegurar, desde o início do Portugal 2030 e do PRR, a “adequação, implementação e interoperabilidade” dos sistemas de informação associados à operacionalização dos fundos, bem como a identificação das causas e dificuldades associados à articulação de “componentes de financiamento provenientes de fundos diferentes e instituir procedimentos que os reduzam”.

Com uma dotação global de cerca de 26 mil milhões de euros, o programa Portugal 2020 consiste num acordo de parceria entre Portugal e a Comissão Europeia, “no qual se estabelecem os princípios e as prioridades de programação para a política de desenvolvimento económico, social e territorial de Portugal, entre 2014 e 2020”.

Os primeiros concursos do programa PT 2020 foram abertos em 2015.

Segundo o último boletim dos fundos da União Europeia, com informação reportada até ao final de junho, a taxa de execução do Portugal 2020 é de 64%, com destaque para o Programa de Desenvolvimento Rural, contabilizando-se três programas operacionais abaixo de 50%.

// Lusa

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