O número de manifestantes mortos esta quarta-feira por tiros disparados pelas forças de segurança, para dispersar protestos contra a junta militar em Myanmar, subiu para pelo menos 33, o maior número desde o golpe de 1 de fevereiro.
Estes dados, principalmente recolhidos da imprensa local e publicações na rede social Facebook, foram compilados por um profissional das tecnologias de informação em Rangum e inclui os nomes das vítimas, idades, local de nascimento e onde e como foram mortas.
A agência Associated Press noticiou que não foi possível confirmar de fonte independente a maioria das mortes relatadas, mas uma amostra de publicações online correspondeu ao que está incluído na compilação.
Quem reuniu os dados em causa reforçou o pedido para não ser identificado por medo de represálias da junta militar, acrescentando que 18 pessoas foram mortas esta quarta-feira só em Rangum, a antiga capital do país.
As manifestações de repúdio ao golpe militar continuaram em todo o país, apesar da brutal repressão policial, que só no domingo custou a vida a 20 manifestantes, a maioria deles devido a tiros disparados pela polícia.
Além de munição real, as autoridades birmanesas reprimiram os protestos desta quarta-feira com gás lacrimogéneo, balas de borracha e granadas de choque.
No entanto, quando a situação acalmou, as pessoas voltaram às ruas para continuar o protesto.
Os manifestantes exigem que o exército, que governou o país com mão de ferro entre 1962 e 2011, restaure a democracia, reconheça os resultados das eleições de novembro e pedem a libertação de todos os detidos pelos militares, incluindo a líder de facto Aung San Suu Kyi.
Os ministros dos Negócios Estrangeiros das Filipinas, Indonésia, Malásia e Singapura condenaram na terça-feira o uso de força letal pelas autoridades birmanesas para reprimir o movimento pacífico de oposição que surgiu após o golpe militar.
Os ministros, reunidos por videoconferência durante uma sessão informal da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), na qual participou o ministro nomeado pela junta militar birmanesa, Wunna Maung Lwin, exortaram o exército a procurar uma solução de diálogo para a crise política e a libertação dos detidos.
O exército birmanês justificou a tomada do poder por uma alegada fraude eleitoral nas eleições de novembro, onde os observadores internacionais não detetaram qualquer fraude e em que a Liga Nacional pela Democracia, partido liderado por Suu Kyi, foi o vencedor, assim como já tinha ocorrido em 2015.
UE condena “repressão violenta contínua”
“A UE condena a repressão violenta contínua de manifestantes pacíficos pelas forças militares e de segurança birmanesas, que resultou em ainda mais mortes de civis inocentes hoje”, lê-se num comunicado da porta-voz do Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE), Nabila Massrali.
Enumerando as ocorrências que constituem “violações claras do direito internacional”, e que vão das “detenções de centenas de pessoas” a tiros disparados contra “civis desarmados e trabalhadores de saúde”, a porta-voz chama ainda a atenção para a repressão dos meios de comunicação no país, onde se tem testemunhado “um número crescente de jornalistas arbitrariamente presos, detidos e acusados”.
“A perseguição e intimidação de trabalhadores dos media, que estão apenas a fazer o seu trabalho, é inaceitável”, afirma Massrali.
A porta-voz diz assim que as “tentativas de silenciamento dos media” e de “erradicação da liberdade de expressão” não irão “impedir o mundo de testemunhar as ações do Exército do Myanmar nem a coragem do povo birmanês”, acrescentando também que não “darão nenhuma legitimidade ao golpe” militar que ocorreu no país a 1 de fevereiro.
“Tem de haver responsabilização [dos envolvidos] e um regresso à democracia no Myanmar”, aponta.
Papa pede diálogo e libertação de políticos
O Papa Francisco defendeu também esta quarta-feira o diálogo em vez da repressão em Myanmar após o golpe militar.
“Ainda recebo notícias tristes de Myanmar de confrontos sangrentos com perda de vidas humanas. Desejo chamar a atenção das autoridades envolvidas para que o diálogo prevaleça sobre a repressão e a harmonia sobre a discórdia”, disse o Papa após a audiência geral sem a presença de fiéis.
Fez ainda “um apelo à comunidade internacional para que as aspirações do povo birmanês não sejam abafadas pela violência e para que os jovens desta amada terra tenham esperança e um futuro”, segundo a agência noticiosa espanhola EFE.
Tal como aconteceu na audiência que concedeu no início do ano ao corpo diplomático creditado junto da Santa Sé, Francisco expressou o desejo de que “se possa regressar ao caminho para a democracia percorrido nos últimos anos por Myanmar com o gesto concreto da libertação dos vários líderes políticos presos”.
Francisco visitou Myanmar em novembro de 2017 e expressou a sua proximidade à minoria muçulmana rohingya perseguida no país.
ZAP // Lusa