Na Rússia, o passado está sempre em mudança. A “política da memória” é o que tem ajudado a reforçar a influência de Vladimir Putin – não só na Rússia, como em todo o Mundo.
A “política da memória” é o processo de seleção, interpretação e difusão de eventos passados, que pode ser usado para desafiar narrativas e/ou, noutros casos, legitimar e promover determinados valores.
A história da Guerra Fria recontada, por exemplo, “expõe, sem querer as distorções russas do passado”. É o que escreve Jaroslaw Kuisz.
“Na Rússia, os monumentos a pessoas responsáveis por assassínios em massa e outros crimes da era soviética estão a surgir como cogumelos depois de uma chuva de outono”, escreveu o analista político, num artigo no Foreing Policy.
Por exemplo, em maio, o “Fantasma de Estaline” voltou a Moscovo, com a inauguração de uma estátua do ditador inaugurada no metro da capital russa.
Como escreve a Foreing Policy, à medida que são erguidas, por todo o país, estátuas comemorativas de figuras que vão de Joseph Estaline ao fundador da polícia secreta bolchevique, são muitos russos que reagem com pouco mais do que um “encolher de ombros”.
É evidente que a história nunca é fixa. Está sempre sujeita a mudança. Mas, na Rússia, especialmente, o passado parece estar sempre a mudar; e, por seu turno, Putin parece conseguir usar sempre este facto para seu proveito.
Como escreve o Foreing Policy, o atual regime da Rússia embarcou num grande projeto de “reformulação do passado” (especialmente da era soviética) para legitimar o seu governo e, por exemplo, justificar a invasão da Ucrânia.
Jade McGlynn, conceituada especialista em assuntos da Rússia, da King’s College London (Reino Unido), tem focado os seus estudos, precisamente, sobre a forma como a política da memória está a moldar a guerra da Rússia e as perceções da e sobre Ucrânia.
Também num artigo no Foreing Policy, Jade McGlynn alega que Putin está a “promover a história revisionista russa para reforçar não só a sua influência e legitimidade do Kremlin na Rússia, como também no estrangeiro”.
E, mais do que um “encolher de ombros”, outra prova de que o povo russo está alinhado com esta “política de memória” é o facto de cada vez mais russos comuns apoiarem “inquietantemente” a invasão e ocupação da Ucrânia.
No fundo, “a Ucrânia não é a guerra de Putin, mas sim a guerra da Rússia”, escreveu o especialista Keir Giles, num artigo de 2024, no mesmo jornal.
O “cancelamento” da Wikipédia no país é outro exemplo de que a Rússia é forte em contar o passado à sua maneira. O Kremlin usa agora, como arma, uma versão alternativa à Wikipédia, onde escreve os (seus) factos da guerra na Ucrânia.