O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, defendeu que deve existir uma separação orçamental entre gastos associados à pandemia de covid-19 e outros gastos correntes do Estado, de forma a apelar à compreensão dos mercados financeiros.
“Tem de ficar claro que há uma segregação de dívida que resulta de um facto particular, que não é recorrente e que vai ser absorvido de forma determinada por uma afetação de receitas futuras ao longo de um período longo, e assim o mercado compreende”, disse Carlos Costa, numa entrevista este sábado publicada no semanário Expresso.
Para o governador do Banco de Portugal, “o orçamento de 2021 não deve ter por base o orçamento de 2020 mais o retificativo, deve ter por base o orçamento de 2019 e deve ficar lá uma categoria à parte”, dedicada à pandemia de covid-19.
Caso essa segregação não aconteça, Carlos Costa adverte que se cria “um erro com graves consequências na perceção do mercado”.
“Tem de existir separação, segregação, que é para não haver contágio nem haver tentações de tomar o défice de 2020 como métrica dos défices seguintes. O défice de 2020 para os orçamentos seguintes deve ser aquele que está no orçamento atual. Há um outro orçamento, que é o orçamento de resposta ao meteorito que nos atingiu, que é uma espécie de despesa excecional”, prosseguiu.
Questionado sobre se deve existir uma dívida registada como impacto da pandemia e outra sem, Carlos Costa assinalou que se deve “explicar aos mercados isso para perceberem que não há nenhum risco”, dando a entender que na despesa corrente se forme, ao longo do tempo, “uma poupança para diluir ou para absorver a dívida que foi constituída” pela pandemia.
Carlos Costa defende a separação de orçamentos “para impedir que haja uma gestão irracional das finanças públicas no futuro, porque se vão confundir questões que resultam do choque com questões correntes”, acrescentando que isso “não significa política austeritária”, mas “apenas consolidação das finanças no horizonte que já vinha de trás”.
O governador do BdP considerou ainda que a resposta do Banco Central Europeu à crise foi “mais do que suficiente”, e defende que da parte da União Europeia “se concretize um programa que esteja à altura da dimensão do choque”.
“A aceitação da ideia europeia vai depender muito da forma como transmitirmos à população e aos cidadãos a noção de solidariedade e de pertença a uma casa comum”, assinalou.
A ideia da separação dos registos já tinha sido avançada pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), que apelou a “uma inovação no registo contabilístico que promova a segregação do relato financeiro das medidas covid-19 no seio das contas de cada subsetor e da conta consolidada das Administrações Públicas”. O Governo apresentará o orçamento suplementar durante o mês de junho.
// Lusa
Coronavírus / Covid-19
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