A Catedral de Notre-Dame de Paris ainda ardia e já se discutia a reconstrução. Será um processo longo. O Presidente francês, Emmanuel Macron, aponta para uma empreitada de cinco anos.
Especialistas de todo o mundo dividem-se sobre a natureza da intervenção: um restauro integral da catedral, recuperando até os elementos que não constavam do desenho original e que foram sendo acrescentados ao longo dos tempos ou uma obra que preserve parte das cicatrizes infligidas pelo incêndio, integrando-as na sua história.
Qualquer que seja a opção escolhida, os responsáveis pela empreitada podem ter ao seu dispor um recurso de valor imensurável: também nas primeiras horas do incêndio, houve quem se lembrasse de um nome, Andrew Tallon, e da obra da sua vida – o registo minucioso da catedral tal como era antes do incêndio, que está gravado num computador, como uma cópia do monumento pronta a ser descarregada.
Tallon morreu há apenas cinco meses, aos 49 anos, vítima de um cancro cerebral, e não assistirá à reconstrução da Notre-Dame, conta o Público. No entanto, o seu nome poderá ficar associado para sempre à catedral.
O historiador norte-americano nascido na Bélgica, conta a revista The Atlantic, era um inovador. “Quando se trabalha com edifícios medievais, é difícil achar que podemos dizer algo de novo, porque foram observados e estudados durante muito tempo”, explicava o pai de quatro filhos num documentário da National Geographic em 2015. “Tenho recorrido a tecnologia sofisticada para tentar arrancar novas respostas a estes edifícios.”
Em 2010, Tallon passou cinco dias a tirar uma espécie de ecografia a três dimensões da Catedral de Notre-Dame, através de um scanner laser da Leica montado num tripé e colocado em 50 pontos do monumento. O aparelho dispara feixes laser em direção à estrutura, medindo quanto tempo passa até receber o eco, ou o reflexo, de volta.
Juntando todos os dados recebidos através de um software sofisticado, o resultado é uma imagem a três dimensões de altíssima resolução da catedral, mais precisa do que qualquer planta original. O grau de exatidão milimétrica é tal que Tallon descobriu que as colunas interiores da catedral não estão alinhadas.
Tallon, que produziu uma cópia exata do monumento que cabe num disco portátil, já alertava para o estado de degradação da catedral anos antes do incêndio. O historiador foi co-fundador da Associação Americana dos Amigos da Notre-Dame e recolhia fundos para as obras de restauro que, aparentemente, podem ter estado na origem do fogo de segunda-feira.
Esta semana, e através de uma página de recolha de donativos para a família Tallon que tinha sido publicada durante a doença do investigador, Marie, a viúva, pede que novos contributos sejam entregues para a reconstrução da catedral.
Só através da Fundação Francesa do Património foram reunidos mais de 14 milhões de euros. A título individual, familiar ou corporativo, as maiores fortunas do mundo já contribuíram com quase mil milhões de euros para a reconstrução. O financiamento da empreitada parece estar garantido e conta com forte apoio do poder político.