O Estado quer ter acesso às bases de dados das empresas de contabilidade. O decreto-lei do Governo obriga as empresas a facultarem ao fisco as bases de dados da contabilidade.
Para a Associação Nacional de Contabilistas, a medida pode representar um autêntico “big brother”, uma vez que poderá expor informação detalhada sobre a vida das empresas e de particulares.
“Através das bases de dados das contabilidades de empresas, empresários em nome individual e, em princípio, também dos bancos e das seguradoras, o Estado ter toda a informação financeira de todos nós e até muitas das nossas relações económicas e sociais”, diz Vítor Vicente, presidente da Associação Nacional de Contabilistas, à Renascença.
Vítor Vicente alerta que esta intenção do Estado, que pode pôr a descoberto toda a vida de pessoas e empresas põe em risco liberdades e garantias em matéria de privacidade.
“Muito daquilo que se faz neste país e que é registado nas bases de dados das empresas, também tem a ver com a nossa vida social. Se o Estado ficar com estas bases de dados todas, passará a ter acesso a toda a movimentação bancária de todas as pessoas, de todos os movimentos neste país”, afirma em entrevista.
A Associação Nacional de Contabilistas divulgou uma petição, que conta já com mais de 2.200 assinaturas, para que o Parlamento revogue o decreto-lei de Governo. A petição acusa o Estado de estar a criar um “Big Brother para toda a sociedade portuguesa”.
“O acesso do Estado a estas bases de dados viola seguramente liberdades, direitos e garantias fundamentais de todos os cidadãos em matéria de privacidade, do RGPD, do sigilo bancário, de muitos outros interesses relevantes e até da propriedade privada das pessoas e das empresas.” Além disso, lê-se na petição, a existência do decreto-lei contraria a lei n.º 17/2019, publicada em fevereiro, “que apenas concede à AT a informação sobre os saldos (e não os movimentos) bancários de fim de ano de valor superior 50 mil euros”.
O presidente da associação alega que o Governo legislou à margem da Assembleia da República e sem debate. Vítor Vicente afirma que esta medida não tem paralelo em nenhum país europeu. “Nem quero imaginar o que é que pode ser feito com este tipo de informação”, remata.