A modesta sanita parece o cenário menos provável para o drama. Mas ao longo da história, já derrubou reis, celebridades e foi palco de mortes prematuras que vão do trágico ao absolutamente bizarro. Atenção à manobra de Valsalva.
O que é que torna a divisão mais pequena da casa, por vezes, na mais perigosa?
No centro deste perigo está a manobra de Valsalva – o ato de expirar forçadamente contra as vias respiratórias fechadas durante um esforço, como o da defecação. Este esforço aumenta a pressão no tórax e reduz o fluxo sanguíneo de retorno ao coração.
Para a maioria das pessoas, é inofensivo. Mas para quem sofre de problemas cardíacos, este esforço pode causar “síncope por defecação” (desmaio), arritmias cardíacas e até morte súbita.
O nervo vago é um elemento-chave neste processo. Ajuda a controlar o ritmo cardíaco e, quando é subestimado – por esforço intenso ou pressão no reto –, pode provocar bradicardia (batimento cardíaco perigosamente lento), hipotensão e perda de consciência. Isto torna a defecação um ato surpreendentemente arriscado para quem tem condições cardíacas subjacentes.
Dois dos exemplos históricos mais frequentemente citados de mortes associadas à casa de banho – Elvis Presley e o rei Jorge II – oferecem estudos de caso reveladores sobre os perigos ocultos da defecação.
Presley, com apenas 42 anos, foi encontrado caído no chão da casa de banho de Graceland, a 16 de agosto de 1977. Embora os fãs tenham especulado sobre uma overdose e seja importante referir que o relatório completo estará selado até 2027, a narrativa da autópsia revela um quadro médico mais complexo e trágico.
Presley sofria de obstipação crónica, possivelmente agravada por uma dieta rica em gorduras e pobre em fibras, uso prolongado de opiáceos e um “megacólon” – um cólon patologicamente dilatado.
Na manhã da sua morte, estaria a fazer um esforço considerável para evacuar. A manobra de Valsalva pode ter desencadeado uma arritmia fatal num coração já comprometido por anos de abuso de medicamentos e má saúde.
Uma morte mais aristocrática ocorreu em 1760, quando o rei Jorge II da Grã-Bretanha morreu subitamente depois de visitar a sua casa de banho. O seu médico, Frank Nicholls, realizou uma rara autópsia real e concluiu que o rei sofrera uma rotura de um aneurisma da aorta torácica – uma dilatação anormal da principal artéria do corpo.
O evento terá ocorrido quando o rei se estava a levantar da sanita, momento em que a tensão arterial pode sofrer variações abruptas.
Historiadores e médicos acreditam hoje que o esforço para evacuar ou a mudança súbita de postura poderão ter sido o fator desencadeante. O coração do rei apresentava ainda sinais evidentes de doença, com calcificação significativa da válvula aórtica, o que agravava os riscos associados a qualquer esforço circulatório, mesmo ligeiro.
Mortes por afogamento (e pior) trouxeram-nos os esgotos
Embora desmaiar na sanita tenha riscos ainda hoje, o uso histórico de casas de banho envolvia consequências ainda mais mortais, sobretudo para quem utilizava latrinas e fossas, antes da chegada da canalização moderna.
Nos séculos XVIII e XIX, muitas casas dispunham de casas de banho exteriores construídas sobre fossas profundas destinadas a acumular resíduos humanos — e frequentemente instáveis, mal mantidas e perigosamente construídas.
Cair numa fossa não era apenas repugnante – podia ser fatal. Pessoas que perdiam o equilíbrio, especialmente no escuro ou sob o efeito do álcool, podiam afogar-se nos dejetos ou sucumbir aos gases tóxicos como metano e sulfureto de hidrogénio, libertados à medida que os resíduos se decompunham.
Jornais e relatórios de médicos legistas da época revelam um padrão sombrio: pessoas – sobretudo crianças e idosos – morriam com frequência após caírem nestas fossas de dejetos.
No seu clássico de 1851, London Labour and the London Poor, Henry Mayhew descreve com detalhe os riscos mortais enfrentados pelos trabalhadores que recolhiam dejetos, incluindo asfixia por gases tóxicos das fossas.
Estes acidentes trágicos impulsionaram reformas de saúde pública no século XIX e campanhas por uma melhor infraestrutura de saneamento, que acabariam por abrir caminho para os esgotos modernos em que hoje confiamos.
Mas o perigo não desapareceu. Em algumas regiões do mundo, as latrinas ainda são comuns e continuam a ocorrer quedas e afogamentos relacionados com a casa de banho, especialmente onde as instalações são mal construídas ou pouco mantidas.
Os perigos de levar o telemóvel para a casa de banho
Os hábitos modernos trazem novos riscos. Levar o telemóvel para a casa de banho muitas vezes prolonga o tempo passado sentado. Isso aumenta a pressão sobre o plexo venoso rectal (a rede de veias em torno do reto), elevando o risco de hemorróidas e fissuras anais.
O “scroll da sanita” também representa perigos microbiológicos. Estudos demonstram que os telemóveis usados na casa de banho podem transportar germes nocivos da sanita para as mãos – e eventualmente, para a boca. Podem albergar E. coli e outros agentes patogénicos muito depois de as mãos terem sido lavadas.
Há ainda a questão da postura. A sanita ocidental, em posição sentada, ao contrário das sanitas de cócoras comuns em partes da Ásia e África, posiciona o reto num ângulo que dificulta a evacuação, tornando o esforço mais provável. Por isso, algumas pessoas recorrem a bancos de apoio para os pés ou plataformas de cócoras para melhorar a posição e reduzir os riscos.
Quer se trate de morte cardíaca súbita, desmaios e quedas, ou exposição a microrganismos, a casa de banho nem sempre é o refúgio seguro que imaginamos. É um espaço onde anatomia, privacidade e risco se cruzam – muitas vezes despercebidos até que algo corra muito mal.
Por isso, da próxima vez que a natureza chamar, pense duas vezes antes de se instalar com o telemóvel. Sente-se de forma adequada, evite fazer força e lembre-se: mesmo na divisão mais pequena, o seu corpo pode estar a lidar com um assunto de grande risco.