A maior parte das Testemunhas de Jeová não apresenta queixa em caso de abuso sexual. Mas uma nova lei pode alterar essa realidade

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Jonathan Ichikawa / Flickr

Testemunhas de Jeová

Em casos de abuso sexual dentro organização religiosa Testemunhas de Jeová, a maior parte das vítimas não acusa os agressores por receio de serem excluídas, revelou um artigo da Vice. Agora, uma nova lei norte-americana, criada depois do movimento #MeToo, permite-lhes acusar os molestadores, mesmo que tenham passado décadas dos algados crimes.

Em 2013, após ter abandonado a congregação das Testemunhas de Jeová em McAlester, Oklahoma, nos Estados Unidos (EUA), Debbie McDaniel dirigiu-se à polícia e contou que alguns membros da congregação permaneciam do lado de fora do seu apartamento, monitorizando todos os seus movimentos.

Esses indivíduos, disse, estavam a tentar provar que ela não estava apta para ser mãe por manter um relacionamento com uma mulher. Mas foi outra revelação que deixou os agentes chocados: segundo a mulher, a organização permitiu que fosse molestada durante anos, sem intervir.

Em poucas semanas, os agentes prenderam Ronald Lawrence, a quem Debbie McDaniel, agora com 50 anos, acusou de a ter molestado quando era menor de idade, informou o Reveal News, citado pela VICE.

Pelo menos duas outras pessoas apresentaram acusações semelhantes. De acordo com o Tulsa-World, Ronald Lawrence contou aos promotores que tinha sido expulso da congregação devido às alegações de abuso sexual, mas que havia admitido a sua má conduta para poder voltar. Na altura, a polícia não foi informada.

O homem negou ter abusado dos membros das Testemunhas de Jeová, incluindo Debbie McDaniel. Em 2014, as 19 acusações de abuso sexual que tinha contra si foram consideradas prescritas, acabando por ser libertado.

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Testemunha de Jeová

Durante o suposto abuso a Debbie McDaniel, Ronald Lawrence fazia parte de um grupo responsável por supervisionar várias congregações em todo o mundo, apesar de ter sido expulso duas vezes por alegações de abuso infantil.

Agora, graças à Lei das Vítimas Infantis de Nova Iorque, criada após o movimento #MeToo e que entrou em vigor em agosto, Debbie McDaniel resolveu agir. Esta nova medida permite que as vítimas cujos crimes estejam prescritos tenham uma janela de um ano para processar as instituições por negligência.

No início de 2020, os advogados que trabalham com Debbie McDaniel pretendem entrar com uma ação contra a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, a organização sem fins lucrativos encarregada da organização global das Testemunhas de Jeová no momento do suposto abuso, em nome das três vítimas.

Embora o suposto abuso de Debbie McDaniel tenha ocorrido em Oklahoma, os seus advogados pretendem acusar a Torre de Vigia, com sede em Nova Iorque, de ter permitido a conduta por meio de políticas negligentes.

Segundo explicou a VICE, através dessa lei, é possível abrir ações judiciais contra as Testemunhas de Jeová e a sua liderança. Mas, devido ao que os críticos descreveram como a propensão única das Testemunhas de Jeová para esconder as alegações de má conduta sexual, muitas vítimas podem recusar-se a procurar justiça.

De facto, a VICE conversou com sete ex-Testemunhas de Jeová que afirmaram ter sido abusadas sexualmente por membros da organização e seis dessas não planeavam entrar com ações judiciais porque temiam ser socialmente excluídas e não acreditavam ter evidências suficientes para vencer o caso.

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Watchtower – Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados

Com mais de 8,5 milhões de membros em todo o mundo, esta é uma das organizações religiosas mais devotas nos EUA, revelou o Pew Research Center. Os seus membros não celebram feriados, não votam e não aceitam transfusões de sangue. São também conhecidos por ir de porta em porta e pregar a outras pessoas.

Um antigo membro sénior da congregação, que falou com a VICE com o pseudónimo James Alexander, por medo de represálias, afirmou ter presenciado a interação de alguns elementos da igreja com crianças, mesmo depois de serem feitas alegações de abuso sexual infantil contra os mesmos.

“As Testemunhas de Jeová encaram as coisas do ponto de vista espiritual e acreditam que um pedófilo pode se arrepender e depois voltar a lidar com o público”, disse. “Eu vi isso em primeira mão. Sabíamos que alguém tinha problemas, mas iam na mesma ministrar de porta em porta”.

Como muitos outros cristãos altamente religiosos, as Testemunhas de Jeová tendem a ser socialmente conservadoras, notou o Pew Research Center. E, tal como na Igreja Católica, os seus líderes querem proteger a reputação da organização, referiu Mathew Schmalz, professor de estudos religiosos no College of the Holy Cross, em Massachusetts, nos EUA.

Ao longo dos anos, Debbie McDaniel questionou os responsáveis da congregação sobre o facto de a polícia não ter investigado os seus testemunhos. Depois de deixar a organização e ir à polícia, percebeu que suas as alegações nunca foram relatadas.

Questionado sobre se a organização relata tais alegações à polícia e se os responsáveis alertam as congregações sobre agressores acusados, o balcão de informações da mesma enviou à VICE artigos da Torre de Vigia sobre abuso sexual infantil. Nestes, afirma que os responsáveis são denunciados e os pais dos menores alertados.

Nick Thompson / Flickr

Testemunhas de Jeová

No entanto, de acordo com James Alexander, os elementos mais antigos são treinados para ligar para a Torre de Vigia ao saber de uma alegação de abuso sexual infantil, que lhes indica como proceder. Numa dessas ocasiões, James Alexander recebeu instruções para permanecer calado. Meses depois, quando a mãe das crianças foi à polícia, a Torre de Vigia mandou-o destruir todas as suas anotações sobre o caso.

“Na época, eu estava totalmente doutrinado, então fiz exatamente o que me disseram para fazer, porque acreditava de verdade”, contou James Alexander.

Em casos de denúncia de abuso sexual infantil dentro da congregação, é exigida uma segunda testemunha para processo avance dentro da organização, o que representa um obstáculo para as vítimas. “O abuso infantil não ocorre em campo aberto”, afirmou Mathew Schmalz. “Acontece em segredo, por isso é improvável que existam duas testemunhas” dispostas a falar sobre o assunto.

A Torre de Vigia chegou a alegar, em ações judiciais anteriores, que os elementos mais antigos da organização representam um clero, sendo estes que ouvem as acusações de abuso infantil durante os atos de confissão, não tendo que as relatar à polícia.

“Eles defendem que não precisam denunciar porque as informações são obtidas sob privilégio eclesiástico”, disse Tod Mercer, outro dos advogado de Debbie McDaniel. “Defendem a separação entre a Igreja e Estado a nível constitucional”.

A relutância em revelar episódios de abuso sexual, ou de avançar com ações judiciais, não é algo exclusivo das Testemunhas de Jeová. Mas os especialistas acreditam que o medo de ser evitado pelos entes queridos pode ser especialmente difícil de superar na organização.

ZAP //

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11 Comments

  1. Sou a favor da liberdade religiosa porem isso acaba quando ,ao inves de se protegerem as vitimas ,protegem -se os agressores. Quando nao se cumprem as regras do país onde estao sediadas. Quando nao sao todos iguais e aceites como são. Quando há fanatismo. Tudo isto é inaceitável. Acabem com ditas ” religioes ” que querem é subjugar as mulheres ! Que forçam crianças a nao celebrarem o natal e o seu aniversário ,o carnaval etc e a fingirem ser felizes.Crescem tristes e ficam adultos frustrados como ja se viu em mts casos ( conheço pessoalmente alguns ). A nao levarem transfusões de sangue para salvarem as suas vidas ! Isso é fanatismo e deveria ser proibido,nao ” temos que respeitar” ,um adulto ainda vá, que faça o que entender mas uma criança nao deveria ser sujeita a esses abusos.

  2. Não é preciso nenhuma religião para promover o abuso sexual. O Estado é o primeiro a promover esse tipo de abuso, afinal a pedofilia está por todo o lado.

    A Maddie foi apenas um exemplo entre tantos outros.

  3. As testemunhas de jeová são mundialmente conhecidas pelo seu exemplo de honestidade e moral,não toleram a maldade no seu meio,porém seguem as orientações dadas por meio das escrituras que vem do supremo juiz do universo em como tratar problemas na congregação.

    infelizmente alguns fazem maldades e devem ser punidos,porém desde que haja comprovação de tal facto.
    As testemunhas de jeová tentam ao máximo seguir as orientações dadas por meio da biblia.

    • Para o seu bem, não seja tão ingénuo Josué… Muito poucos são aqueles que seguem as ordens à risca, que lhe são dadas pela religião E a maior parte é seguidora à base do medo… MEDO = CONTROLO/ MANIPULAÇÃO

      • Não são nem honestas nem seguem as escrituras, mas o maior problema é terem regras secretas para proteger os criminosos nojentos que abusam de crianças. Como provavelmente nem o fanático mais fanático sabe, quando há um caso de abuso de criança dentro dessa seita assassina eles pedem DUAS TESTEMUNHAS à pobre criança abusada e se não as tiver então o caso nem segue para a polícia.
        Moralidade? Sei….
        Um gangue de criminosos é o que é na realidade.
        ⚠ CUIDADO ⚠ SÃO GENTE PERIGOSA

        • Não há regras secretas. Há pouco tempo veio informações amplamente divulgadas a todas as testemunhas de Jeová do que fazer em casos de abuso e denunciar a policia pode ser feito pela pessoa ou responsável e não há nenhuma retaliação. Abuso sexual é encarado de forma séria pelas testemunhas de Jeová.
          As testemunhas de Jeová são pessoas comuns. Infelizmente, como em qualquer religião e ate mesmo em qualquer família, há aqueles que são maldosos e fazem o que é errado. Mas longe de chegar a falar que são perigosos. Sua afirmação é preconceituosa e maldosa.

  4. A matéria é tendenciosa e equivocada. Vamos aos fatos:

    1. Não existe um grupo responsável por supervisionar congregações no mundo todo. Existem superintendentes zonais, mas este obviamente não era um destes;
    2. A própria matéria cita que o abusador fora expulso devido às acusações que lhe foram feitas. Portanto foi feito o necessário para proteger os membros da congregação. Porém, é papel – e principalmente um DIREITO da vítima, buscar as autoridades e não de terceiros, ainda mais que frequentemente as vítimas voltam atrás em suas declarações;

  5. As TJ, levam extremamente a sério as palavras de Jesus “Mas eu lhes digo que todo aquele que persiste em olhar para uma mulher, a ponto de sentir paixão por ela, já cometeu no coração adultério com ela”. Isso se aplica a conduta e personalidade que deve se ater uma TJ, limpar de sua mente qualquer que seja a conduta imoral. No caso da pedofilia, é um crasso devio de personalidade, tal individuo excluído do rol, dificilmente é novamente aceito. Não é a congregação que processa a atos errados de um ex-membro que tenha praticado são os pais da vítima que deve levar aos tribunais, e tem apoio dos membros leais. Outro detalhe Jesus disse, Mas vocês não sejam chamados ‘Rabi’, pois um só é o seu Instrutor, e todos vocês são irmãos. 9 Além disso, não chamem a ninguém na terra de seu pai, pois um só é o seu Pai, o celestial. Não existe essa tal liderança que deve ser cobrada entre as TJ, todos são irmãos e iguais na congregação, os que tomam a dianteira é porque são voluntários, se esforçam e tem mais experiência.

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