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Críticas de Costa ao BCE “são despropositadas. Quis agradar às famílias”

José Sena Goulão / Wikimedia

O ex-ministro das Finanças e da Economia, Teixeira dos Santos

Teixeira dos Santos, ex-ministro das Finanças, criticou António Costa, por fazer críticas “despropositadas” ao Banco Central Europeu, e alertou que a inflação não deverá desaparecer a curto prazo.

Em entrevista ao programa Hora da Verdade da rádio Renascença e do jornal Público Fernando Teixeira dos Santos, ex-ministro das Finanças dos Governos de José Sócrates, defendeu o papel do Banco Central Europeu (BCE).

Na semana passada, em Sintra, palco do fórum anual do BCE, Christine Lagarde avisou que o pico dos juros ainda não chegou, nem está próximo de chegar.

“Nestas condições, é improvável que, no curto prazo, o BCE tenha capacidade de afirmar com confiança que o pico dos juros foi alcançado. É por isso que a nossa política tem de ser decidida reunião a reunião e tem de se manter dependente dos dados. O nosso trabalho não está terminado“, disse Lagarde.

Teixeira dos Santos não se viu surpreendido com as declarações da presidente do BCE.

“Já tinha dito que este não ia ser o momento para invertermos a política monetária que tem vindo a ser prosseguida. Não temos ainda sinais que a inflação esteja a baixar de uma forma sustentada”, disse o ex-ministro das finanças.

“Tirando o conjunto de energia e bens alimentares, há um conjunto bens e serviços que teima em não baixar. É por isso que Christine Lagarde faz alertas. Ainda não estamos seguros que vamos ter a breve prazo uma aproximação da meta dos 2% de inflação. Isso só ocorrerá em 2025“, perspetivou.

Sobre os apelos que Christine Lagarde tem deixado, para que os governos voltem atrás nos apoios às empresas e às famílias, Teixeira dos Santos admite que é preciso ter “um pouco mais cuidado em seguir à letra aquilo que Lagarde recomenda”.

“As medidas de apoio têm de ser muito bem pensadas. São incontornáveis porque há famílias muito afetadas com esta conjuntura, com este agravamento de preços, com o aumento das taxas de juro. Não podemos é ter apoios para toda a gente, porque essas seriam contraproducentes para com a política monetária anti-inflacionista do Banco Central Europeu (BCE)”, advertiu o ex-ministro.

“As medidas no domínio dos combustíveis, da energia, já não se justificam. Agora, aqueles apoios às famílias de rendimentos mais baixos devem manter-se, enquanto houver pressão da inflação e da subida dos juros”, acrescentou.

Teixeira dos Santos diz que os apoios devem continuar em 2024, já que a inflação elevada e o agravamento de taxas de juro também se vão manter: “Não estou a ver que seja possível pura e simplesmente eliminá-los a curto prazo”.

Críticas a Costa

O economista também criticou as críticas do primeiro-ministro dirigidas a Christine Lagarde, que considerou “despropositadas“.

António Costa tinha acusado o BCE de não compreender nem esclarecer as origens da inflação, perspetiva da qual Teixeira dos Santos discorda: “O Banco Central Europeu está a compreender as origens desta inflação, está a analisar os seus desenvolvimentos, a fazer o diagnóstico e a adotar as medidas que acha adequadas”.

“Não tenho dúvidas quanto à competência e ao saber do Banco Central Europeu quanto ao processo inflacionário, a sua origem, as suas consequências e as terapias que são necessárias”, sublinhou.

Teixeira dos Santos redirecionou, por isso, a acusação para António Costa e os governantes portugueses: “Não parecem ter percebido bem o que está em jogo neste combate à inflação. Se até agora o BCE foi um fator estabilizador, não parece que esse seja o momento de questionar a sua missão, o seu papel e as medidas que deve tomar no sentido de assegurar a estabilidade dos preços”.

“Tem sido uma política que tem garantido a estabilidade de preços e também taxas de juro mais razoáveis para o financiamento das nossas economias”, acrescentou o ex-ministro, acusando António Costa de fazer essas insinuações “essencialmente para fins políticos“.

“Creio que o primeiro-ministro procurou com esta declaração agradar às famílias que estão a ser mais afetadas por estas medidas mas, em boa verdade, não há uma alternativa. Nem ele apresentou uma via alternativa para combatermos esta inflação”, atirou.

“Não há folga orçamental”

Quando questionado pelas jornalistas Susana Madureira Martins (Renascença) e Helena Pereira (Público) sobre o Estado estar a arrecadar em impostos bastante mais do que aquilo que previa, Teixeira dos Santos adverte que agora a primeira grande preocupação do Governo deve ser reduzir a dívida.

“A dívida que temos é um ónus muito pesado, não só sobre a geração presente, mas também sobre as gerações futuras. Não há folga orçamental, enquanto houver uma dívida elevada”, alertou.

Reconheceu, no entanto, que esse dinheiro pode ser uma ajuda importante aos portugueses: “Agora, é evidente que esta folga orçamental, devendo servir para reduzir o peso da dívida, também deve servir para algumas medidas como apoios sociais e alívio fiscal“.

Tenderia a privilegiar o IRS, uma vez que quem mais paga impostos neste país são as famílias. Não contra uma descida no IRC, mas faço um alerta: não estamos ainda em condições de termos descidas muito significativas dos impostos, porque precisamos dos impostos para pagar as despesas e as despesas com o envelhecimento da população tendem a ser maiores”, acrescentou.

Sobre Portugal chegar ao final do ano com um crescimento acima dos 3%, como se tem falado, Teixeira dos Santos diz que tudo vai depender do que acontecer no segundo semestre.

Não digo que seja impossível. Tivemos um bom crescimento no primeiro trimestre. Se conseguirmos recuperar para níveis de crescimento como o que tivemos no primeiro trimestre já será muito positivo”.

ZAP //

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