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Talibãs declaram controlo do Afeganistão. Cinco mortos em caos no aeroporto

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Nawid Tanha / Lusa

Declaração surgiu depois da conquista de Cabul este domingo, que aconteceu sem qualquer resistência por parte das forças governamentais. Norte-americanos lutam contra o relógio para retirar o pessoal diplomático antes de uma esperada escalada de violência.

O mullah Baradar Akhund, chefe do gabinete político dos rebeldes no Qatar, anunciou o fim da guerra no Afeganistão, com a vitória dos insurgentes, após a fuga no domingo do Presidente Ashraf Ghani e a captura de Cabul.

“Conseguimos uma vitória que não era esperada (…), devemos mostrar humildade perante Alá”, disse o antigo número dois do movimento rebelde, numa mensagem de vídeo, citado pela agência Efe, na que é a primeira declaração pública de um líder talibã após a conquista do país.”Trata-se agora de como servimos e protegemos o nosso povo, e como asseguramos o seu futuro, para lhe proporcionarmos uma boa vida da melhor forma possível”, acrescentou.

No primeiro dia no Afeganistão sob controlo talibã desde a invasão dos Estados Unidos da América, em 2001, a segurança na capital afegã e na maior parte do país amanheceu nas mãos dos insurgentes, que patrulham as ruas e controlam a circulação. Os talibãs tomaram o controlo de Cabul no domingo, depois de entrarem na capital sem encontrar resistência, com quase todas as províncias debaixo do seu domínio.

“O Emirado Islâmico — como os Talibãs se autodenominam — deu ordens aos seus mujahideen e mais uma vez reitera que ninguém pode entrar em casa de ninguém sem autorização. A vida, a propriedade e a honra não serão prejudicadas”, escreveu no Twitter o porta-voz talibã, Suhail Saheen.

Fugas e evacuações de representações diplomáticas

Os meios de comunicação locais relataram imagens dramáticas de milhares de pessoas no aeroporto de Cabul a tentar fugir do país, apesar do cancelamento da maioria dos voos comerciais e das restrições. A Embaixada dos EUA em Cabul reiterou hoje o aviso aos seus cidadãos e às pessoas que aguardam o repatriamento para se manterem afastadas do aeroporto, devido à insegurança, até serem chamadas para embarcarem. Alguns órgãos de comunicação social avançam mesmo que as embaixadas dos Estados Unidos da América e de França foram transferidas para o aeroporto.

Ao longo dos últimos dias o envio de contingentes militares por parte dos países para assegurar a retirada do seu pessoal diplomático foi constante, com os EUA a liderar as operações, seguidos do Reino Unido, Alemanha, França, entre outros. Durante a última noite foram muitos os helicópteros e aviões militares que sobrevoaram Cabul, de forma a garantir que esta segunda-feira, quando são tomadas de posição mais forte e abrangente da comunidade internacional, já não estivessem em solo afegão cidadãos dos seus países.

Segundo o Público, a retirada de civis já estava prevista pelos EUA e pelo Reino Unido, embora sem data, pelo que teve de ser apressada devido ao rápido avanço dos talibãs em direção à capital do Afeganistão — de saída, nestes voos, estão também cidadãos afegãos que por terem colaborado com forças estrangeiras.

Nas últimas horas a Reuters avançou que também a Holanda e a Suécia estavam a preparar a saída dos seus diplomatas do Afeganistão. Ao final do dia, a agência de notícias saudita noticiava que a embaixada da Arábia Saudita estava a ser evacuada.

Reações da comunidade internacional

Boris Johnson, primeiro-ministo inglês, foi um dos primeiros políticos a pronunciar-se sobre a conquista de Cabul pelos talibãs, apelando à união dos diferentes países no que concerne ao reconhecimento do atual governo do Afeganistão. “Não queremos ninguém a reconhecer bilateralmente os talibã como enquanto autoridade do Afeganistão. Queremos uma posição tão unida quanto possível entre todos os que partilhem a nossa posição”, afirmou.

António Guterres, secretário-geral da ONU, apelou este domingo “à maior contenção“. Num comunicado, a ONU afirmou que “o secretário-geral está particularmente preocupado com o futuro das mulheres e das meninas, cujos direitos duramente adquiridos devem ser protegidos”. Para esta segunda-feira está prevista uma reunião do Conselho de Segurança da ONU onde será debatida precisamente a situação afegã.

De acordo com a TSF, Guterres sublinhou também a importância de assegurar que “os trabalhadores humanitários têm acesso sem entraves para fornecer em tempo útil uma assistência que é essencial para salvar vidas“, com a Organização das Nações Unidas a afirmarem estar “determinadas a contribuir para uma situação pacífica do conflito”.

De acordo com a Agência da ONU para os Refugiados (ACNUR), mais 550 mil pessoas no Afeganistão fugiram de suas casas devido ao conflito desde o início deste ano e apelou a ajuda humanitária. Recentemente, uma atualização deste relatório, que inclui dados do mês anterior a 9 de agosto, mostrou que cerca de 126 mil pessoas foram deslocadas.

Também Emmanuel Macron preside esta segunda-feira ao Conselho da Defesa francês antes do se proferir as suas primeiras declarações sobre os mais recentes acontecimentos do Afeganistão.

Após o anúncio da União Europeia e da NATO de que irão ser executadas operações para proteger cidadãos no Afeganistão, Portugal, pela voz de João Gomes Cravinho, ministro da Defesa, revelou que irá integrá-las, com o Governo a afirmar que está a acompanhar a situação “com grande preocupação”.

“O nosso objetivo imediato é apoiar, criar condições para que possam sair do país em segurança os funcionários que trabalharam com a NATO, com a UE, com as Nações Unidas e nessa matéria Portugal participará evidentemente num esforço coletivo que se está agora a desenhar”, disse o ministro à RTP. João Gomes Cravinho afirmou que “neste primeiro momento” o Governo português está “a dar conta às autoridades da UE, da NATO e das Nações Unidas” da sua “disponibilidade para apoiar, para receber afegãos em território português”.

O Canadá foi o país que mais longe na ajuda humanitária, com o Governo de Trudeau a anunciar que está disposto a aceitar 20 mil refugiados afegãos que estão a tentar deixar o país. Na lista de indivíduos que preenchem o requisito para pedidos de asilo incluem-se jornalistas, ativistas dos direitos humanos, funcionários do Governo e membros de minorias religiosas.

O anúncio aconteceu poucas semanas depois de o Canadá ter prometido admitir vários milhares de intérpretes afegãos e outros trabalhadores locais, juntamente com as suas famílias, que eram empregados pelas autoridades canadianas. Segundo o Expresso, já chegaram ao Canadá quatro voos com antigos tradutores afegãos com as respetivas famílias, apesar de as autoridades se recusarem a fornecer dados exatos sobre o número exato de pessoas admitidas.

Presidente em parte incerta

A chegada dos talibã a Cabul precipitou a saída do país de Ashraf Ghani, presidente deposto, após terem tomado o controlo de 28 das 34 capitais provinciais em 10 dias, e sem grande resistência das forças de segurança governamentais, no âmbito de uma grande ofensiva iniciada em maio — altura em que começou a retirada das tropas norte-americanas e da NATO do país, que deverá ficar concluída no final deste mês.

O antigo Presidente afegão abandonou o Afeganistão quando os talibãs estavam às portas da capital, declarando ter fugido do país para “evitar um banho de sangue” e reconhecendo que “os talibãs ganharam”. Sem indicar para onde partiu, Ghani declarou-se convencido de que “inúmeros patriotas teriam sido mortos e Cabul teria sido destruída” se tivesse ficado no Afeganistão.

“Os talibã ganharam e são agora responsáveis pela honra, a posse e a autopreservação do seu país”, acrescentou, numa mensagem publicada na rede social Facebook. “Eles enfrentam presentemente um novo desafio histórico: ou preservam o nome e a honra do Afeganistão, ou dão prioridade a outros lugares e outras redes”, prosseguiu o chefe de Estado deposto. Apesar de o paradeiro de Ghani não ter sido divulgado pelo próprio ou por outra fonte oficial, o grupo de comunicação social afegão Tolo avançou que terá viajado para o Tajiquistão.

Com a partida de Ghani, um grupo de líderes políticos formou o Conselho de Coordenação para a transição de poder para os talibãs, composto pelo ex-presidente afegão Hamid Karzai, o presidente do Alto Conselho para a Reconciliação, Abdullah Abdullah, e o líder do partido Hizb-e-Islami e antigo senhor da guerra, Gulbuddin Hekmatyar. No entanto, os insurgentes não deram até agora informações sobre como funcionará o processo de transição ou a tomada do poder.

O exército norte-americano — com cerca de 6 mil soldados — anunciou hoje que assumiu o controlo do tráfego aéreo no aeroporto, “para permitir a partida segura do pessoal norte-americano e aliado no Afeganistão em voos civis e militares”. De acordo com a agência de notícias France-Presse, as forças norte-americanas dispararam para o ar no aeroporto de Cabul, depois de milhares de afegãos terem invadido a pista, procurando fugir do país, após a tomada de poder pelos talibã.

Esta manhã, a Reuters noticia que o caos no aeroporto já resultou em cinco mortos, apesar de nenhuma fonte oficial confirmar o contexto em que estas aconteceram.

O Pentágono estima em 30.000 o número total de pessoas a retirar do país, entre diplomatas e outros cidadãos norte-americanos ou afegãos que ajudaram os Estados Unidos e temem agora pela vida.

Um porta-voz do movimento islâmico radical, que governou no Afeganistão entre 1996 e 2001, disse à televisão pública britânica BBC que os talibãs pretendem assumir o poder no Afeganistão “nos próximos dias”, através de uma “transição pacífica”, 20 anos após terem sido derrubados por uma coligação liderada pelos Estados Unidos, pela sua recusa em entregar o líder da Al-Qaida, Usama bin Laden, após os atentados de 11 de setembro de 2001.

ZAP, LUSA //

12 Comments

  1. O que me arrepia é a idéia de que Portugal foi cúmplice deste desastre, tendo enviado tropas para servir os negros desígnios dos EUA. A idéia de que portugueses poderiam ter morrido ou sido feridos numa aventura destas é horripilante. É tempo de acabar com a NATO e entregar à UE a missão de defesa da Europa. E de acabar a servidão face aos EUA.

    • Os EUA como primeira potência arregimentam sempre os seus aliados nas suas aventuras suicidárias e criminosas em nome da democracia em pacote, como se a democracia foi tão fácil como de cozinhar como fazem os americanos com as suas refeições de pacote, que enfiam num imenso microondas ou forno e voilá, pronta a servir.
      Deste modo a União Europeia, faz sempre o frete ao Império Americano, que chantajea politicamente e economicamente os europeus. Veja-se o que sucedeu com Nord Stream 2, desde o seu inicio, chantageou a Alemanha e EU, com ameaças de retaliações económicas. Isto entre tantos outros comportamentos tipo bulling.

      • Por acaso, no Nord Stream 2, os EUA têm toda a razão e a Alemanha continua a ser “cumplice” do Putin…

  2. gostava saber se fosse num país rico em diamantes e energias em que os americanos ganhasse muito, ou outro tipo de riqueza, será que os americanos iam assim embora?

  3. A intervenção militar internacional, foi necessária e importante para limitar a barbárie e o extremismo, que chegou ao ponto de atacar vários países, por puro ódio religioso a tudo que não fosse do seu grupo ou fação religiosa!
    Contudo, pensar que se democratiza e educa todo um país em pouco tempo é erro repetido.
    Assistimos ao que não deveria acontecer, uma má estratégia, concertação e decisão das politicas sobre os objectivos a atingir e a estratégia de retirar, cumpridos que foram estes objectivos. O que também é um erro muito repetido!
    Quanto á NATO ela fatalmente terá de evoluir acompanhando as mudanças na geo-estratégia e no paradigma actual da globalidade. Fala-se em esta integrar as forças internacionais que se opõem ás investidas militaristas da China fora do seus territórios, além do seu papel tradicional e crucial na contenção das ameaças externas á Europa. E sobre isto, muito haverá por certo a dizer.

    • Quando fala em NATO, fala nos EUA, certo?
      A estratégia da China é militarista, mas são os EUA que têm espalhadas pelo globo, mais de 700 bases militares.
      São os EUA quem mais bombardeia e invade países terceiros e apoia ditaduras e regimes autocráticos, tal como as monarquias arcaicas e repressivas do Golfo e o estado étnico de Israel, único no mundo criado por uma etnia.
      Foram os americanos o único país do mundo a detonar sobre milhões de civis bombas atómicas, tudo não para acabar com uma guerra, mas para se vingarem de Port Arbour, que foi um ataque a uma BASE MILITAR e não uma cidade.
      Aqui nada tem a ver com implantar democracias, tem tudo a ver com estratégia económica e militar, que veste a palavra tão elegante de “geo-estratégia” que referiu.
      É tão comodo defender os fortes contra os fracos, que matam milhares de inocentes ao telecomando de uma Jostic e a milhares de quilometros, para matar um suspeito de supostamente poderia hipoteticamente ser autor de um atentado terrorista.
      E tanto poder militar, com as tecnologias mais avançadas do mundo, são expulsos por uns militantes sem proteção Hi-Tech no corpo, visão noturna, etc, trajados do que nós ocidentais diríamos, maltrapilhos, armados de AK47 dos anos 40 e lança granadas, chegam através de acordos com os senhores da guerra até à capital Cabul, envergonhando uma vez mais, os americanos e seus lacaios europeus designados por NATO, que tal como no Vietnam, perderam com os ratos descalços que saiam literalmente debaixo da terra, após mais um enorme bombardeamento com Napalm e gás laranja e chegam até Saigon e pasme-se, os ratos eram nesse momento histórico, os americanos a fugirem pelo telhado da sua embaixada.
      O mais engraçado, sem ter graça alguma, é que quando os americanos invadiram o Afeganistão, este não tinha aviação militar, agora, os EUA deixam lá uma força aérea e toneladas de equipamento militar ultra moderno, desde armamento ligeiro a pesado, veiculos de transporte militar de todo o tipo e tanques de guerra.
      Esta ânsia de deixar para trás uma guerra que foi há 20 anos declarada logo como ganha por Bush e reafirmada por Obama, tem como objetivo, tentar, tentar fazer frente à China e Rússia, mas já vão tarde.
      Pena que os americano, verdadeiramente os donos de isto tudo, estejam isentos de um tribunal de crimes de guerra, tal como fizeram com os criminosos nazis.
      Geo-estratégia……pois

      • Boa parte do que diz está errado e outra incorrecta ou parcial!
        Assim a NATO não é só os EUA, isso é errado, embora seja o maior contribuidor, tal como é quanto á maior parte das outros organizações internacionais em que participa. As bombas atómicas sobre o Japão terminaram com uma guerra em que morreram ~40 milhões de civis e ~20 milhões de militares, o horror vivido ali foi da mesma dimensão do vivido noutros locais da ultima guerra mundial, e se é horrivel terem morrido nesses eventos ou das consequências deles cerca de 40 mil militares e mais de 100 mil civis as mais conservadoras estimativas de mortes se isso não tivesse ocorrido até o Japão se render eram superiores a mais de 20 vezes!
        Quanto ao resto da narrativa dispenso-me de comentar, pois não passa de uma visão romanesca e falsa dos acontecimentos e dos Talibãs!

  4. A auto-estrada do ópio está aberta, os taliãs têm o seu país para viver, democraticamente, sem ódios, respeitando as boas regras de convivência, enfim… todos viveremos em paz e amor. E a China não tem interesse nenhum, o Afeganistão só produz papoilas que os ocidentais adoram…

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