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Nick Cave abriu caminho para mais uma polémica. Cultura de cancelamento também o é quando há crime? E será assim tão errado desfrutar da prestação de Kevin Spacey em “American Beauty” ou ouvir uma canção de Jay Z?
Foi no programa da BBC “Desert Island Discs” que o cantor australiano Nick Cave mostrou a sua vontade de ter “I am a God“, de Kanye West, a ser tocada no seu funeral.
“Tornou-se numa espécie de canção de família“, disse. “Os meus filhos adoram-na, a minha mulher adora-a, eu adoro-a. É muito brincalhona, muito sombria e complexa. Ele apresenta-se como um Deus, mas no final da canção grita de terror”.
Kanye West tem sido alvo de sucessivas polémicas devido aos seus tweets de cariz nazi, que já lhe valeram uma expulsão da rede social X. Chegou mesmo a criar um site de venda de t-shirt com desenhos da cruz suástica.
Depois das declarações de Nick Cave, muitos foram os fãs que se revoltaram contra o autor de êxitos como “Into My Arms” ou “Red Right Hand” no próprio blogue do autor, o “The Red Hand Files”. Em resposta às questões que recebeu, por exempo, “como é que consegues ouvir a música sem ver o lixo de ser humano em que ele se tornou?”, decidiu escrever uma resposta, que publicou no site.
Nick Cave não acredita na separação entre a arte e o artista. “Um artista está fundamentalmente interligado com a sua arte; a arte é a essência do artista. A obra do artista diz: ‘Este sou eu, estou aqui, é isto que sou’. O grande dom da arte é o potencial dado ao artista para escavar o seu caos interior e transformá-lo em algo sublime. É isso que o Kanye faz e é isso o que tento fazer”, escreveu.
Ainda assim, e embora concorde que as opiniões do rapper norte-americano são “odiosas e desapontantes”, diz que “procura a beleza onde quer que ela esteja”. Lamenta ainda que tenhamos “noções erróneas, talvez a mais ilusória das quais seja a crença de que somos de alguma forma exclusiva e moralmente superiores a todos os outros”.
Este é um debate que tem sido exaustivamente escrutinado nas redes sociais. No Reddit, por exemplo, um utilizador pergunta aos outros a opinião que têm relativamente aos filmes de Roman Polanski, realizador franco-polaco que foi condenado por ter violado uma menor.
Autor de clássicos como “Rosemary’s Baby” ou “The Pianist”, Polanski é odiado por muitos pelas suas ações, mas na conversa do Reddit vários utilizadores dizem que “está tudo bem em separar a obra do artista”. Por outro lado, muitos consideram que “ficariam o tempo todo a pensar no caso” judicial que o envolveu, o que os impediria de desfrutar do filme.
Há uma panóplia incontável de artistas que acabam por ser “cancelados” (nas redes socais e na vida real) pelas ações consideradas politicamente, socialmente ou até legalmente incorretas. Na música, exemplos mais recentes passam pelo rapper P. Diddy ou Jay Z, acusados de violar uma rapariga.
Também o realizador Woody Allen é alvo de muitos “dislikes” após a acusação da sua própria filha adotiva de ter sido violada aos 7 anos pelo realizador de “Annie Hall” ou “Midnight in Paris”.
Do outro lado das câmaras, o ator Kevin Spacey continua a causar polémica com uma nova acusação de assédio sexual, de que tinha já sido alvo desde a década de 2010. Inconfundível continua a ser, 26 anos depois, a sua prestação em “American Beauty” ou, mais recentemente, em “House of Cards”.
Nem a literatura escapa: a autora do icónico “Harry Potter” tem sido alvo de críticas até de fãs, e mesmo do ator que interpreta a personagem principal que dá nome à sua saga de livros, Daniel Radcliffe. Em causa estão tweets polémicos sobre a comunidade LGBTQ+, nomeadamente quando escreveu que “pessoas que menstruam” são apenas mulheres.
Quer consigamos ou não separar os nossos valores primários e a arte que consumimos, vale sempre recordar os artistas mais cacelados da história. O IMDB fez mesmo uma lista. De quantos se lembra?