Quatro dos 13 juízes do Constitucional consideram que “a decisão de uma pessoa se prostituir pode constituir uma expressão plena da sua liberdade sexual” e dizem ser inconstitucional punir quem lucra com a prostituição alheia.
Depois de há dois anos ter entendido que o proxenetismo deve permanecer crime, o Tribunal Constitucional está agora a dar sinais de defender a sua despenalização. Quatro dos 13 juízes consideram que é inconstitucional prender quem lucra com a prostituição praticada de livre vontade
O processo em causa é sobre um bar de alterne em Valpaços onde trabalham 10 mulheres e que foi alvo de uma rusga do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras em 2016. As mulheres ganhavam à comissão pelas bebidas que os clientes pediam e cobravam 40 euros por cada serviço sexual e 10 dos quais eram pagos ao casal que geria o bar, relata o Público.
As decisões anteriores baseiam-se na ideia de que as pessoas prostituídas são de alguma forma coagidas, havendo uma associação a priori entre o lenocínio e a exploração sexual. Até 1998, no entanto, a lei era diferente e os proxenetas só eram condenados se ficasse provado que estavam a aproveitar-se de pessoas em situações vulneráveis para lucrarem.
A juíza de Vila Real que analisou o caso do bar de alterne recusou condenado o casal, invocando um argumento de um ex-presidente do Tribunal Constitucional, Costa Andrade, na sua sentença, que refere que condenar proxenetas que não violaram a liberdade sexual de ninguém constitui “um exercício de moralismo atávico”.
Até hoje, esta posição foi minoritária no Constitucional. A mudança de postura é inédita, dado que a estabilidade jurisprudencial costuma ser um princípio importante para os magistrados. Lino Ribeiro, o relator do mais recente acórdão, explica esta mudança dizendo que vários dos juízes a favor da punição do proxenetismo em 2021 já saíram do TC.
O juíz alega ainda que, não estando os tribunais de primeira instância a seguir todos o entendimento do Constitucional, se chegou a uma situação de “jurisprudência com força suficientemente mitigada” que dá legitimidade aos quatro conselheiros para contrariarem aquilo que foi decidido há menos de dois anos.
Ainda não se sabe se o crime de lenocício continuará a existir. Se houver mais duas decisões de inconstitucionalidade, o plenário terá de se reunir novamente sobre o assunto. Ainda não é conhecida a posição dos três novos conselheiros que tomaram posse há menos de um mês.
O conceito de prostituição abrange também o servilismo degradante (não apenas sexual). E nesta descrição, anda meio mundo laboral, sendo que os proxenetas são quem gere esses negócios/empresas que empregam esses trabalhadores abusados.
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