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Quem é que ganha com os incêndios?

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Paulo Cunha / Lusa

Os incêndios que, todos os anos, afectam Portugal causam perdas de muitos milhões de euros em sectores como o turismo e o emprego, mas também são lucrativos para algumas actividades económicas.

As empresas de combate a incêndios estão no topo dos negócios que mais lucram com os incêndios, fornecendo meios aéreos e terrestres. Quantos mais fogos houver, mais procura haverá pelos seus serviços, o que garante milhares de euros.

Cada hora de voo de um Kamov, os helicópteros mais usados no combate a incêndios em Portugal, pela grande capacidade de armazenamento de água, pode custar entre 30.000 a 35.000 euros.

Os bombeiros também recebem compensações financeiras adicionais pelas horas extra que passam no combate a incêndios. Trata-se de uma forma de compensar o seu esforço e dedicação durante situações de emergência.

Contudo, os valores recebidos pelos bombeiros são irrisórios quando comparados com as verbas pagas pelos helicópteros.

A indústria da madeira também é beneficiada pela tragédia dos incêndios, uma vez que a madeira queimada é vendida a preços mais baixos, beneficiando as empresas que actuam nesta área.

Os fogos provocam um excesso de oferta de madeira que precisa de ser vendida o quanto antes, para não se degradar. Tudo isso faz com que o preço de venda diminua.

Em 2018, a TVI lançou a reportagem “A máfia do Pinhal” que revelou uma alegada conspiração de madeireiros para incendiar a Mata Nacional de Leiria, embora essa tese não tenha sido oficialmente confirmada, com alguns especialistas a rebaterem as “provas” apresentadas pelo canal.

Porém, os madeireiros que têm os seus próprios pinhais acabam também por perder uma boa parte do investimento nos fogos. Precisamente porque a madeira queimada tem menor valor económico.

As seguradoras são outro sector económico que lucra com esta tragédia, uma vez que podem aumentar as vendas de apólices de seguro contra incêndios – isto apesar de também poderem ter perdas avultadas devido aos fogos.

Há ainda que considerar as empresas de recuperação e reflorestação, uma vez que, depois dos incêndios, é preciso cuidar das áreas afectadas. Nesses casos, saem beneficiadas as empresas especializadas em reflorestação e recuperação ambiental.

Navigator e Altri reduzem custos e obtêm subsídios

A indústria da celulose, com empresas como Navigator e Altri à cabeça, também podem lucrar indirectamente com os incêndios florestais, mesmo que também sofram perdas significativas, nomeadamente com os imensos eucaliptais queimados em zonas como Albergaria-A-Velha e Sever do Vouga.

Contudo, os fogos permitem acesso a madeira queimada mais barata a resíduos, sobras e biomassa que podem ser utilizados como fontes de energia renovável para alimentar as indústrias de papel e celulose.

Habitualmente, a produção de papel e celulose exige madeira de alta qualidade. Porém, algumas árvores não chegam a arder totalmente durante os incêndios, podendo preservar o tronco quase intacto.

Assim, as empresas conseguem uma redução de custos na produção.

No âmbito da reflorestação, estas empresas também podem receber subsídios e apoios governamentais para replantarem as áreas afectadas. E, habitualmente, fazem-no com eucaliptos, árvores de crescimento rápido que também ardem muito depressa. Não é à toa que a espécie é conhecida como a “árvore do fogo”.

A Navigator e a Altri têm o seu próprio agrupamento de prevenção e combate a incêndios, a AFOCELCA, que visa proteger os activos florestais das empresas, mas que também actua nas propriedades vizinhas.

As duas empresas gastam, todos os anos, milhares de euros na prevenção de incêndios e na gestão dos seus espaços florestais.

Incêndios têm forte impacto negativo na economia

Apesar de tudo, é importante reforçar que os incêndios causam elevados prejuízos a particulares, empresas e ao Estado.

Além das vidas humanas e do património perdido após anos de lutas e sacrifícios, há um impacto directo na qualidade de vida das populações das zonas afectadas e na agricultura.

Mas o turismo e o emprego também são fortemente afectados, com custos económicos que se reflectem no longo prazo na vida das pessoas.

Prevê-se que “os custos anuais para a economia portuguesa devido ao impacto das áreas ardidas em 2030, variem entre 17 milhões e 24,2 milhões de euros para as chegadas de turistas domésticos, e entre 18,3 e 38,1 milhões de euros para as chegadas de turistas internacionais”, avança um estudo de 2021 publicado na revista Environment and Development Economics e que analisou dados de 278 municípios entre os anos de 2000 e 2016.

“Quando a área ardida é superior a 33,3% de um município, o impacto negativo imediato na actividade económica é de cerca de 1,4%. Se a área ardida ultrapassar os 50%, o efeito negativo chega aos 2,5% no ano do incêndio e agrava-se para 3% no ano seguinte“, avança a investigadora Joana Filipa Henriques e Sousa no âmbito da sua tese de mestrado em Estatística e Gestão da Informação realizada em 2021, na Universidade Nova.

Susana Valente, ZAP //

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7 Comments

  1. É triste, toda a gente sabe disto e ningu´rm faz nada; proibir a compra de madeira queimada era já um bom começo. O lamentável são as pessoas que ficam sem os seis bens!

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  2. Numa audição parlamentar na comissão de Agricultura e Pescas, a 27 de julho, o presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), Tiago Oliveira, questionou o porquê de “os bombeiros continuarem a receber em função da área ardida”

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  3. O Dinheiro que gastaram com o Papa, podiam dar preferência, em limpar os terrenos do Estado Português, quem lucra com isto é muita gente, Hectómetros a receber 30 a 40mil euros p/hora, Madeireiros a comprar lenha Queimada, Bombeiros?, e muito mais, enfim… os nossos Políticos que andam a dormir e só lhes interessam é mostrar a Gravata, na Comunicação Social

  4. Não há limite para a estupidez humana! Quando tudo ficar ardido, só vai ficar mato rasteiro de tojos, giestas e outras espécies arbustivas. A floresta reduz-se a umas manchinhas isoladas. A paisagem muda drásticamente com todas as consequências inerentes a essa mudança. Ficamos todos a perder!

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