Pranchas de surf e “esparguetes” de piscina. Assim eram as primeiras galáxias

Judy Schmidt / ESA / Hubble & NASA

A Via Láctea, a nossa galáxia, assemelhava-se a uma prancha de surf quando era mais nova

As galáxias, no início do Universo, são frequentemente planas e alongadas, tal como pranchas de surf ou “noodles” de natação. A Via Láctea seria, há milhares de milhões de anos, mais “surfista” do que “nadadora”.

Investigadores, que analisaram imagens do Telescópio Espacial James Webb da NASA, descobriram que as galáxias no início do Universo são frequentemente planas e alongadas, como pranchas de surf e “noodles” de piscina (ou esparguete de natação) — e raramente são redondas, como bolas de voleibol ou frisbees.

“Cerca de 50 a 80% das galáxias que estudámos parecem ser achatadas em duas dimensões”, explicou o autor principal Viraj Pandya, um bolseiro Hubble da NASA na Universidade de Columbia em Nova Iorque.

“As galáxias que se parecem com ‘noodles’ de piscina ou pranchas de surf parecem ser muito comuns no início do Universo, o que é surpreendente, uma vez que não são comuns nas nossas proximidades”, disse.

A equipa concentrou-se num vasto campo de imagens no infravermelho próximo fornecidas pelo Webb, conhecido como Levantamento CEERS (Cosmic Evolution Early Release Science), que permite identificar galáxias que se estima existirem quando o Universo tinha entre 600 milhões e 6 mil milhões de anos.

Enquanto as galáxias mais distantes se parecem com pranchas de surf e esparguetes de natação, outras têm a forma de frisbees e bolas de voleibol. As bolas de voleibol, ou galáxias em forma de esfera, parecem ser o tipo mais compacto no “oceano” cósmico e foram também as menos frequentemente identificadas.

Aquelas parecidas a frisbees são tão grandes como as galáxias em forma de prancha de surf — e de “noodle” de piscina — ao longo do “horizonte”, mas tornam-se mais comuns mais perto da “costa” no Universo próximo, como é possível comparar nesta ilustração do Webb.

Em que categoria se enquadraria a nossa Galáxia, a Via Láctea, se pudéssemos andar para trás no tempo milhares de milhões de anos?

“O nosso melhor palpite é que poderia ser mais parecida com uma prancha de surf“, disse o coautor Haowen Zhang, candidato a doutoramento na Universidade do Arizona em Tucson, EUA. Esta hipótese baseia-se em parte nas novas evidências do Webb — os teóricos “voltaram atrás no tempo” para estimar a massa da Via Láctea há milhares de milhões de anos, o que se correlaciona com a sua forma nessa altura.

NASA, ESA, CSA, Steve Finkelstein (Universidade do Texas em Austin), Micaela Bagley (Universidade do Texas em Austin), Rebecca Larson (Universidade do Texas em Austin)

Exemplos de galáxias distantes fotografadas pelo Telescópio Espacial James Webb da NASA no seu levantamento CEERS. As galáxias aparecem frequentemente planas e alongadas, como esparguete de natação ou pranchas de surf (linha superior). As galáxias finas e circulares, em forma de disco, que se assemelham a frisbees, são o grande grupo seguinte (visto no canto inferior esquerdo e no centro). As galáxias que têm a forma de esferas, ou bolas de voleibol, constituem a mais pequena fração das suas deteções (em baixo à direita). Estima-se que todas estas galáxias tenham existido quando o Universo tinha apenas 600 milhões a 6 mil milhões de anos.

Estas galáxias distantes são também muito menos massivas do que as espirais e elípticas próximas — são precursoras de galáxias mais massivas como a nossa.

“No início do Universo, as galáxias tinham tido muito menos tempo para crescer”, disse Kartheik Iyer, coautor e bolseiro Hubble da NASA, também da Universidade de Columbia.

“A identificação de categorias adicionais para as primeiras galáxias é excitante — há muito mais para analisar agora. Podemos agora estudar a relação entre a forma das galáxias e o seu aspeto e projetar melhor a sua formação com muito mais pormenor.”

Nada seria possível sem o Hubble

A sensibilidade do Webb, as imagens de alta resolução e a especialização no infravermelho permitiram à equipa caracterizar rapidamente muitas galáxias do CEERS e modelar as suas geometrias 3D. Pandya diz ainda que o seu trabalho não seria possível sem a extensa investigação que os astrónomos têm feito com o Telescópio Espacial Hubble da NASA.

Durante décadas, o Hubble impressionou-nos com imagens de algumas das galáxias mais antigas, começando com o seu primeiro “campo profundo” em 1995 e continuando com um levantamento seminal conhecido como CANDELS (Cosmic Assembly Near-infrared Deep Extragalactic Legacy Survey).

Levantamentos do céu profundo como estes permitiram estatísticas muito maiores, ajudando os astrónomos a criar modelos 3D robustos de galáxias distantes ao longo de todo o tempo cósmico. Atualmente, o Webb está a ajudar a melhorar estes esforços, acrescentando uma grande quantidade de galáxias distantes para lá do alcance do Hubble e revelando o início do Universo com muito mais pormenor do que era possível anteriormente.

As imagens do Universo primitivo, obtidas pelo Webb, atuaram como uma “tempestade no mar” — fornecendo novas ondas de evidências.

“O Hubble há muito que mostrava um excesso de galáxias alongadas”, explicou o coautor Marc Huertas-Company, cientista do Instituto de Astrofísica das Canárias. Mas os investigadores ainda se interrogavam: será que os pormenores adicionais apareceriam melhor com a sensibilidade à luz infravermelha?

“O Webb confirmou que o Hubble não deixou escapar quaisquer características adicionais nas galáxias que ambos observaram. Além disso, o Webb mostrou-nos muitas outras galáxias distantes com formas semelhantes, todas com grande pormenor.”

Ainda há lacunas no nosso conhecimento — os investigadores não só precisam de uma amostra ainda maior do Webb para aperfeiçoar as propriedades e localizações precisas das galáxias distantes, como também terão de passar muito tempo a ajustar e a atualizar os seus modelos para refletir melhor as geometrias precisas das galáxias distantes.

“Estes são os primeiros resultados”, disse a coautora Elizabeth McGrath, professora associada do Colby College em Waterville, Maine, EUA. “Precisamos de aprofundar os dados para perceber o que se está a passar, mas estamos muito entusiasmados com estas primeiras tendências.”

// CCVAlg

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