“Pedagogia do impossível” de Pedro Nuno deixou Mortágua a ver navios russos. Afinal quem dá esmola à direita?

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ZAP // António Cotrim, Estela Silva / Lusa

O debate entre os líderes do PS e do Bloco de Esquerda ficou pautado por um só tom: o descrédito. Pedro Nuno tem uma “bala de prata”, atira Mortágua, mas votar Bloco é fazer perder votos à esquerda, dispara o socialista.

O debate entre Pedro Nuno Santos e Mariana Mortágua que esta terça feira às 21h estreou os confrontos na SIC foi pautado por “bocas” entre quem “não corre o risco de assumir responsabilidades governativas”, como atirou nos primeiros minutos o líder socialista, e quem tem como “bala de prata” Luís Montenegro, como disparou Mortágua.

Para quem esperava uma concordância em vários temas entre o secretário-geral do PS, tantas vezes apontado como representante da “ala mais à esquerda” do partido, e a coordenadora do BE, pode ter-se surpreendido.

E não foi para menos. O debate centrou-se em temas e propostas concretas, com dois cabeças de lista bem preparados, mas focados no passado, a ressacar dos tempos socialistas de há um par de anos no caso de um, e de tempos de paz mundial no caso de outro.

Com Pedro Nuno tímido com números e saudosista dos tempos de Costa, as críticas à aproximação do PS à direita também não convenceram — não falhou o ataque, faltou a capacidade de defesa da líder bloquista, que foi fácil de atacar com “banhos de água fria”. Bastava alguma proposta… quente.

Ainda que mais bem preparada, os argumentos da coordenadora do BE foram menos consistentes. No entanto, também o líder socialista se ficou por propostas rasas: ficamos sem perceber o que fará para se distanciar das medidas já aplicadas pelos sociais-democratas.

A disponibilidade do Bloco para um acordo ficou no ar, mas a possibilidade de entendimento nas áreas mais prementes desfaz alguns laços. E a cisão começou logo nos primeiros minutos, quando a moderadora Clara de Sousa abriu com o tema da defesa.

Portugal no mundo: soberania, defesa e tarifas

Pedro Nuno esteve sempre pouco à vontade com números ao longo de todo o debate, e recusou-se a admitir o que fará se for chefe de governo caso as diretrizes europeias para despesa com defesa sejam ainda maiores, dada a crescente ameaça russa na Europa.

O socialista manteve-se no cenário atual e assegurou que “é impensável o PS ficar à margem do esforço europeu” em defesa, cuja meta está atualmente nos 2% do PIB.

Reforçou, no entanto, que esse esforço não pode “comprometer o Estado Social”, e defendeu que o investimento na defesa deve ser sustentado “através da dívida europeia”. 

Mas a líder do Bloco não partilha da mesma visão: diz que a Europa já tem armas suficientes, a “corrida para a guerra” é indesejável, e a necessidade de armamento “é mentira, é propaganda”. “A União Europeia não precisa de mais armas, nem para se defender nem para apoiar a Ucrânia”, garante Mortágua, que diz que a UE tem um orçamento para defesa três vezes superior ao da Rússia.

E foi mesmo Mariana Mortágua quem puxou o tema das tarifas de Donald Trump, que entrarão em vigor a partir de amanhã e afetam a economia portuguesa. A líder bloquista diz que não pode haver uma resposta generalizada, mas sim direcionada a alguns setores, como os produtos farmacêuticos que Portugal exporta em grande quantidade para os EUA.

Portugal tem de manter a sua “soberania económica”, diz, ao que Pedro Nuno Santos não poupou uma “boquinha”: “A soberania depende também da capacidade de defesa“.

No que respeita às tarifas, os dois partidos têm apesar de tudo uma visão mais convergente: o governo foi lento a responder, e Pedro Nuno compara a falta de reação portuguesa com a resposta imediata de retaliação do governo socialista espanhol.

Já na questão da ameaça externa, é caso para dizer que Pedro Nuno Santos deu um “reality check” a Mortágua: ou Portugal acompanha a Europa, ou fica sozinho a ver navios russos.

Solução para as rendas: teto ou ajudas?

Clara de Sousa fez escalar a tensão com o tema da habitação, que  também divide os dois partidos de esquerda. Enquanto Pedro Nuno recordou as medidas que adotou quando tinha a pasta no governo de Costa, como o 1º Direito ou o Porta 65, ambos de apoio a famílias carenciadas, afirmou também que não põe de lado a classe média.

Garantiu também que se estiver no poder não vai reverter a isenção de IMT para os jovens, mas critica o governo por não ter feito acompanhar estas medidas pelo “outro lado” — o aumento de oferta e os preços acessíveis.

Mortágua mantém-se impassível no teto às rendas, invocando o governo socialista holandês que assim determinou. Pedro Nuno, mesmo sem dar números concretos, desacreditou a ideia de que limitar os preços resolve o problema: “pode até retirar casas do mercado”, que deixa de ser apelativo.

Assim ficou pautado o confronto entre os dois partidos de esquerda com maior representatividade no parlamento: Pedro Nuno a criticar a visão “romântica” do BE, Mortágua a acusar o PS de uma “pedagogia do impossível”.

De facto, por mais do que uma vez, Pedro Nuno atacou pela raiz as ideias do Bloco, chamando-lhes de idealistas e típicas de quem “não corre o risco de assumir responsabilidades governativas”.

Por seu lado, Mortágua foi tentando colar o PS à direita, atirando que está a “abdicar dos valores de esquerda”, nomeadamente no que respeita à imigração.

Imigração: via verde ou manifestação de interesse?

Também na imigração há uma clima de “agree to disagree” entre os dois líderes, com o Bloco de Esquerda a defender o retorno à manifestação de interesse, agora extinta para dar lugar à “via verde” para imigrantes.

Pedro Nuno voltou a jogar a cartada da realidade, argumentando que a manifestação de interesse “foi útil durante algum tempo, mas está agora “desajustada”. Nesta temática assistimos a um Pedro Nuno mudado, menos agressivo e mais recetivo às medidas sociais-democratas.

Mariana Mortágua pôs neste tópico o dedo na ferida, relembrando que a extinção da manifestação de interesse pode agravar situações como a das máfias. “É o pior que podemos fazer do ponto de vista dos princípios”, argumentou, invocando os ideais de esquerda.

Acordo ficou no ar

Para fechar, o socialista voltou a apelar ao voto útil, como já tinha feito ao longo dos últimos dias. Argumentou que “o PS até podia estar no governo”, não fossem os votos noutros partidos políticos de esquerda. Relembrou que o PS perdeu por apenas cerca de 50 mil votos há um ano, e deixou a sugestão de que votar noutro partido de esquerda é dar uma esmola à direita.

“Mariana, foi assim há um ano. A esquerda teve mais votos do que AD mas foi a AD que governou, não podemos correr esse risco”, argumentou. Deixou também o apelo: “só haverá alternativa à AD se o PS vencer as eleições”.

Já Mortágua aludiu à “bala de prata” de Pedro Nuno: Luís Montenegro. Apesar da troca de farpas, em resposta sobre a possibilidade de um acordo pós-eleitoral, “há sempre disponibilidade” da parte do Bloco de Esquerda.

Mas o caldo já estava entornado: o tom foi mais de discórdia e descrédito do que de união contra o governo — Pedro Nuno, calmo, sem “flertar” com a esquerda, não deu abébias, e só tem um pedido para os portugueses: “Não dispersem votos”.

Carolina Bastos Pereira, ZAP //

6 Comments

  1. Em Portugal, é tradição dos políticos portugueses não reconhecerem e não valorizarem a DEFESA NACIONAL portuguesa como função Constitucional de soberania, de segurança e económica estratégica do Estado de direito de democracia. A minha ideia é a seguinte: UM REFERENDO SOBRE A RAZÃO DE SER DO SERVIÇOS MILITAR OBRIGATÓRIO EM PORTUGAL seria uma excelente decisão política e coletiva. Outra coisa é: A questão fundamental de sobrevivência estratégica para o Portugal Democrático é a seguinte: Quais devem ser as atribuições legais e qual deve ser a missão das Forças Armadas em território português? Qual o Papel das Forças Armadas portuguesas num contexto da necessidade do “Estado de Sítio” em caso de ameaça interna ou ameaça externa grave? Qual o Papel das Forças Armadas portuguesas num contexto de Catástrofes Naturais (i.e., incêndios, inundações, tsunamis, terramoto/sismo, etc.), Nucleares e Bioquímicas em território português – nomeadamente evacuação de aldeais, de povoações e de pessoas, defesa de perímetro de segurança militar, zonas restritas, implantação de instalações militares , de proteção civil e de emergência médica e hospitalar em situações de guerra ou catástrofes. MUITA GENTE NÃO SABE, mas, o SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE (SNS) de Portugal, também tem uma Função Constitucional de Soberania, de Defesa e de Segurança dos residentes em território português no contexto da Organização e Funcionamento da REDE DE EMERGÊNCIA MÉDICA, PROTEÇÃO CIVIL, BUSCA E SALVAMENTO DE VIDAS HUMANAS em Terra e no Mar no contexto de GUERRA, CATÁSTROFES NATURAIS, PANDEMIAS, ACIDENTES RODOVIÁRIOS, FERROVIÁRIOS, AÉREOS E NAUFRÁGIOS NO MAR. O SNS tem na sua génese e na base Constitucional uma verdadeira Função de Soberania, de Existência da Vida Coletiva e de Sobrevivência de um Estado de Direito em democracia com valores humanitários e princípios democráticos universais (i.e. O BEM JURÍDICO COMUM – A PROTEÇÃO DA VIDA HUMANA) .

  2. Na imagem acima, o gajo tem todo o olhar de bandido. O radicalismo está sempre presente, mesmo que tente esforçar-se para ocultá-lo.

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  3. Definitivamente Mortágua não é uma Europeísta. Acusa a União Europeia de não querer a Paz e não subscreve as políticas da UE que defendem o apoio à Ucrânia e o investimento militar em armamento e soldados agora que não pode contar com o ex-Aliado Americano, Trump que se aproximou do amigo Putin.

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