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Na Suécia, há quem tenha “vergonha” de andar de avião

Jetstar / Flickr

Viajar de avião ou usar outro meio de transporte? Para muitos, essa pergunta vem de um dilema ético, de pessoas preocupadas com o impacto da aviação nas mudanças climáticas.

Nenhum país, contudo, levou esse dilema tão a sério como a Suécia, onde a expressão “flygskam” – “vergonha de voar” – se espalhou e se refere a um movimento, cada vez maior, que apela aos passageiros que procurem meios alternativos de transporte para reduzir emissões de carbono.

À medida que o movimento se populariza, outros termos têm-se popularizado. Os suecos já falam de “tagskryt” – “orgulho de andar de comboio”. Acompanhada de uma hashtag, “tagskryt” tem sido usada nas redes sociais por aqueles que viajam de comboio e querem incentivar outras pessoas a fazer o mesmo.

Existe ainda um novo termo para os que voam, mas preferem esconder isso: “smygflyga”, que significa “voar em segredo”.

A emissão de dióxido de carbono por quilometro de um comboio é de 14 gramas por passageiro, em comparação às 285 gramas emitidos numa viagem de avião. Os cálculos são da Agência Ambiental Europeia, que considera um comboio com 150 passageiros e um avião com 88.

Para aviões de maior porte, o nível de emissão pode chegar a 170 gramas por quilómetro por passageiro, de acordo com um estudo da universidade britânica London School of Economics. Um dos maiores problemas da aviação é que, além da emissão de CO2, há libertação de vapor de água e óxido nitroso, gás nocivo e de efeito estufa. Essas emissões em altitudes elevadas na atmosfera têm impacto maior devido a uma série de reações químicas.

Um dos primeiros suecos a impulsionar o movimento contra viagens de avião foi o medalhista olímpico dos Jogos de Inverno em Vancouver Bjorn Ferry, conhecido por viajar centenas de quilómetros de comboio para participar de eventos desportivos e recusar-se a voar devido às mudanças climáticas.

A ideia ganhou mais adeptos quando Malena Ernman, uma das mais famosas cantoras de ópera da Suécia, declarou publicamente a intenção de nunca mais voltar a voar. A decisão afetou significativamente os seus compromissos artísticos. Mas outras celebridades apoiaram a cantora e aderiram ao movimento.

Malena é mãe de Greta Thunberg, uma ativista adolescente que ficou conhecida por fazer uma viagem pela Europa de comboio em campanha em defesa do clima. A jovem recusou-se a voar e foi de trem ao Fórum Económico Mundial em Davos.

O movimento tem um impacto importante na Suécia, onde está a aumentar o uso do comboio e a diminuir o número de voos. Rickard Gustafson, chefe da companhia aérea sueca SAS, disse a um jornal norueguês estar convencido de que o movimento flygskam estava por trás da queda de 5% no tráfego aéreo da Suécia no primeiro trimestre de 2019. Por sua vez, a companhia ferroviária sueca SJ anunciou um número recorde de passageiros devido ao que descreve como “a preferência em viajar de forma inteligente pelo clima”.

Alguns comentaristas assinalam que a queda no número de voos na Suécia se deve também o impacto da onda de calor no verão de 2018, que gerou mais consciência na população sobe as mudanças climáticas. Em Estocolmo, onde a temperatura é registada mensalmente desde 1756, julho de 2018 foi considerado o mais quente da história. No resto do país, o calor provocou incêndios florestais que se estenderam até ao círculo ártico.

O movimento flygskam gera preocupação na indústria da aviação e foi um dos temas de um encontro de três dias em junho de 2019 na Coreia do Sul. “Se não oferecermos uma resposta, esse sentimento vai crescer e espalhar-se”, assinalou Alexandre de Juniac, presidente da Associação Internacional de Transporte Aéreo, segundo a agência Reuters.

Estima-se que os voos comerciais respondam aproximadamente por 2,5% das emissões globais de carbono e a expetativa é que essa percentagem deva aumentar consideravelmente devido à expansão de aeroportos e dos voos baratos.

A indústria da aviação anunciou planos para desenvolver motores menos poluentes e baixar as emissões, para que em 2050 sejam a metade das emissões de 2002. No entanto, alguns críticos assinalam que essas mudanças deveriam ser mais rápidas.

ZAP // BBC

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