Onde são armazenadas as nossas memórias? A ciência desvenda finalmente o mistério

O cérebro é responsável por controlar a maioria das atividades do corpo humano. A sua capacidade de processar informação é o que nos permite aprender e guardar memórias. Mas como é que se formam memórias e onde é que estas são armazenadas? Ciência desvenda finalmente o mistério.

Ao longo das últimas décadas, os neurocientistas têm procurado identificar as zonas do cérebro responsáveis pelo armazenamento de memória.

Sabe-se que o hipocampo, o neocórtex da camada superior do cérebro e o cerebelo na base do crânio desempenham um papel fundamental no processo de armazenamento.

No entanto, faltava ainda compreender e identificar as estruturas moleculares responsáveis pelo processo de memória e aprendizagem.

Um novo estudo, publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences, sugere que a memória pode estar localizada nas membranas dos neurónios.

Os neurónios são as unidades fundamentais do Sistema Nervoso. São células diferenciadas capazes de transmitir informações entre si, de modo a manter o funcionamento do corpo.

A comunicação entre dois neurónios é realizada através de sinapses, um processo químico e elétrico, que ocorre na junção entre dois neurónios, região conhecida como fenda sináptica.

De acordo com o novo estudo, é na fenda sináptica que ocorre o processo de memória e aprendizagem.

Durante uma sinapse há a comunicação entre dois neurónios – o neurónio pré-sináptico, que transmite a informação, e o neurónio pós-sináptico, que recebe a informação. Ambos os neurónios comunicam através de uma membrana lipídica que contém proteínas e outras biomoléculas.

As alterações que ocorrem nestas duas membranas, em resposta à atividade neuronal, é designada por plasticidade sináptica.

A plasticidade sináptica desempenha um papel essencial na memória e aprendizagem uma vez que permite que certas conexões entre neurónios se fortaleçam ou enfraqueçam, com base nas experiências vivenciadas.

Até então pensava-se que estas alterações estavam associadas a diferentes quantidades de proteínas na membrana, bem como na estrutura da própria.

A plasticidade sináptica pode ser classificada como plasticidade de curto prazo, com uma duração entre os milissegundos e alguns minutos, e a plasticidade de longo prazo, que pode durar desde alguns minutos a várias horas.

Os eventos químicos que ocorrem durante a plasticidade de curto prazo podem eventualmente levar à plasticidade de longo prazo.

Esta equipa de investigação partiu do princípio que a forma como o cérebro processa e armazena informações é através das mudanças de longo prazo e colocou a hipótese de este armazenamento de memória ocorrer ao nível da membrana lipídica.

Para validar a hipótese, sujeitaram um modelo de membrana lipídica simples a uma estimulação elétrica similar àquela que acontece no cérebro, por forma a desencadear alterações de longo prazo.

Os resultados mostraram que as alterações introduzidas através da plasticidade sinápica persistiram no modelo testado durante pelo menos 24 horas, sem nenhuma estimulação elétrica adicional.

Além disso, o modelo de membrana lipídica utilizado era desprovido de proteínas, o que sugere que o processo de armazenamento de memória é da responsabilidade da membrana neuronal e não das proteínas que dela fazem parte.

“A nossa descoberta apoia o uso da bicamada lipídica como modelo para entender a base molecular da memória biológica”, afirma John Katsaras, autor correspondente do estudo, num artigo no The Conversation.

“Além disso, esta pode também servir como uma plataforma para computação neuromórfica, na qual os componentes de memória de um computador são modelados de acordo com a estrutura e função do cérebro humano”, acrescenta Katsaras.

Neste sentido, a membrana lipídica dos neurónios pode ser um potencial alvo terapêutico para tratar várias condições neurológicas.

Identificar onde e como a memória é armazenada poderá revolucionar não só a forma como entendemos estes processos, mas poderá também orientar-nos no desenvolvimento de novas terapêuticas para doenças como o Parkinson e Alzheimer.

Patrícia Carvalho, ZAP //

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