O que alimenta o poderoso motor das fusões de estrelas de neutrões? O enredo complica-se

Universidade de Warwick/Mark Garlick/ESO

Impressão de artista que mostra duas estrelas de neutrões, pequenas mas muito densas, no ponto de fusão e explosão como quilonova.

A fusão e a colisão de estrelas de neutrões produzem poderosas explosões de quilonova e erupções de raios gama.

Há muito que os cientistas suspeitam que um campo magnético grande e ultraforte é o motor por detrás destes fenómenos altamente energéticos. No entanto, o processo que gera este campo magnético tem sido um mistério até agora.

Recentemente, investigadores do Instituto Max Planck de Física Gravitacional e das universidades de Quioto e Toho revelaram o mecanismo subjacente graças a uma simulação computorizada de alta resolução que tem em conta toda a física fundamental.

No seu estudo, publicado a semana passada na Nature Astronomy,  investigadores mostraram que as estrelas de neutrões altamente magnetizadas, também conhecidas como magnetares, causam explosões de quilonova muito brilhantes. Observações telescópicas poderão testar esta previsão no futuro.

As estrelas de neutrões são remanescentes compactos de explosões de supernova e são constituídas por matéria extremamente densa. Têm cerca de 20 quilómetros de diâmetro e até duas vezes a massa do nosso Sol, ou quase 700.000 vezes a massa da nossa Terra.

No dia 17 de agosto de 2017, os astrónomos observaram pela primeira vez ondas gravitacionais, luz e raios gama da fusão de duas estrelas de neutrões. Este evento marcou o início de um novo tipo de astronomia multimensageira, combinando observações de ondas gravitacionais e eletromagnéticas.

As observações das ondas gravitacionais e da explosão de raios gama emitidos durante a fusão revelaram que as fusões de estrelas de neutrões binárias são a origem de, pelo menos, uma parte das explosões de raios gama de curta duração e dos elementos pesados.

“Só através de uma simulação numérica que tenha em conta todos os efeitos físicos fundamentais nas fusões de estrelas de neutrões binárias é que poderemos compreender o processo completo e os mecanismos subjacentes”, explica o astrofísico Masaru Shibata, diretor do departamento de Astrofísica Relativista Computacional do Instituto Max Planck de Física Gravitacional em Potsdam.

“Foi por isso que fizemos uma simulação da fusão, que teve em conta todas as implicações da teoria da relatividade de Einstein e toda a física fundamental, com uma resolução espacial mais de dez vezes superior a qualquer simulação anterior, a mais elevada de sempre”, acrescenta o investigador.

Tal como no Sol, também na estrela de neutrões

Os fenómenos altamente energéticos associados às fusões de estrelas de neutrões, como as explosões de quilonova e as erupções de raios gama, são muito provavelmente impulsionados pela magnetohidrodinâmica – a interação entre campos magnéticos e fluidos.

Isto implica que um remanescente da fusão de estrelas de neutrões binárias deve gerar um campo magnético forte e em larga escala através de um mecanismo de dínamo.

“Pela primeira vez, conseguimos determinar o mecanismo físico que gera um campo magnético de larga escala a partir de campos mais pequenos em fusões de estrelas de neutrões binárias”, diz Kenta Kiuchi, líder do grupo no departamento de Astrofísica Relativista Computacional.

“Parte deste mecanismo é o mesmo que impulsiona o campo magnético do nosso Sol. Numa fusão de estrelas de neutrões, o campo magnético de larga escala surge devido a instabilidades e vórtices na superfície onde as duas estrelas de neutrões chocam uma contra a outra.”

duas fases de amplificação do campo magnético: numa primeira fase, a instabilidade Kelvin-Helmholtz amplifica rapidamente a energia do campo magnético por um factor de vários milhares em poucos milissegundos após a fusão.

“No entanto, este campo magnético amplificado continua a ser um campo de pequena escala”, explica Alexis Raboul-Salze, investigador de pós-doutoramento no departamento de Astrofísica Relativista Computacional.

“Mas após alguns milissegundos, há uma segunda fase de amplificação do campo magnético devido a outra instabilidade, a instabilidade magnetorotacional. Esta instabilidade amplifica ainda mais o campo de pequena escala e atua como um dínamo no campo de larga escala – o mesmo mecanismo que no Sol”, acrescenta.

A estrela de neutrões altamente magnetizada, que resulta da colisão, é hipoteticamente proposta como um magnetar. Cerca de 40 milissegundos após a fusão, os campos magnéticos “levantam” um forte vento de partículas para velocidades relativistas a partir dos polos do magnetar.

Este vento forma um jato que está relacionado com os fenómenos altamente energéticos observados. Com o seu estudo, o grupo de investigação mostrou, pela primeira vez, que esta hipótese é viável.

“A nossa simulação sugere que o motor do magnetar gera explosões de quilonova muito brilhantes. Podemos testar a nossa previsão através de observações multimensageiras num futuro próximo”, conclui Masaru Shibata.

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