/

Noivos chineses pagam por adolescentes paquistanesas (que fogem depois de se casar)

3

Hashoo Foundation / Flickr

Há uma nova mercadoria com procura em alta no mercado chinês: adolescentes paquistanesas com quem se possam casar.

Uma investigação da Associated Press, publicada esta terça-feira, desenha o caminho de uma jovem desde as vilas pobres em que vivia no Paquistão até à China, onde a pobreza se manteve igual, apesar das promessas de uma vida de luxo. Como muitas outras, acabou por fugir.

Muqadas Ashraf tinha 16 anos quando os pais a casaram com um chinês que se tinha deslocado ao Paquistão à procura de uma noiva. Menos de cinco meses depois, Muqadas está de volta ao país de origem, grávida e com acusações sérias em relação ao marido, que diz ter sido abusivo durante o breve relacionamento.

“Isto é tráfico humano”, disse Ijaz Alam Augustine, ministro dos Direitos Humanos e Minorias na província de Punjab. “O que está por de trás destes casamentos é a ganância. Eu encontrei-me com algumas destas meninas e as suas famílias são realmente muito pobres”, disse o ministro à AP.

O responsável atirou as culpas para a embaixada chinesa no Paquistão que, na sua opinião, se tornou conivente com esta prática ou escolher fornecer, sem fazer perguntas, vistos e autorizações de permanência a cidadãos chineses.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês defendeu-se dizendo que na China existe uma política de “tolerância zero” em relação às agências ilegais de casamento transnacional.

Devido à política do filho único, a demografia chinesa tornou-se um problema para os homens que têm poucas mulheres entre as quais escolher uma noiva. Esta escassez já tinha desencadeado uma procura anterior por mulheres nos países do sudeste asiático como o Laos, o Vietname ou a Coreia do Norte, mas agora a procura extravasa os meridianos mais próximos.

“É puramente um caso de oferta e procura. Os noivos chineses costumavam perguntar: tem a pele branquinha?. Agora só perguntam: é mulher?, ilustra Mimi Vu, diretora da organização Pacific Links, que ajuda mulheres vietnamitas vítimas de tráfico.

Mas os chineses não conseguem acesso a estas famílias vulneráveis sozinhos: há uma rede de padres, traficantes e informadores que contribuem para convencer estas jovens e as suas famílias das oportunidades que as esperam se casarem com os pretendentes chineses, muitos deles atualmente envolvidos na criação das infraestruturas que hão-de sustentar a nova Rota da Seda, um projeto que vai unir a economia chinesa a todo o Médio Oriente, Europa e Norte de África.

Munch Morris, padre na cidade de Gujranwala, disse à AP que conhece outros padres na paróquia e em outras próximas que trabalham com agentes matrimoniais chineses. Morris opõe-se a esses casamentos, considera-os de insulto: “São apenas por dinheiro”.

Saleem Iqbal, um ativista pela defesa dos direitos da comunidade cristã do Paquistão e jornalista numa rádio local na província de Punjab, disse à AP que “desde outubro do ano passado cerca de mil raparigas casaram com chineses em troca de dinheiro, algumas tinham apenas 13 anos”.

Mas o problema é ainda mais grave: os pais nem sempre recebem o que lhes foi prometido e as jovens não têm uma vida mais feliz, longe da discriminação que sofrem no Paquistão, um país maioritariamente muçulmano assente numa estrutura patriarcal onde as famílias das noivas têm que pagar à família do noivo para poderem casar as filhas.

O chinês que levou Muqadas Ashraf prometeu cinco mil dólares à sua mãe, Nasreen, mas a família nunca recebeu qualquer ajuda. “Acreditei mesmo que estava a ajudá-la a ter uma vida melhor e também a ajudar o resto da família aqui”, disse Nasreen à AP.

Muqadas tem a mesma história que Mahek Liaqat. Depois de os seus pais terem aceitado casá-las com chineses, ambas foram levadas para um prédio em Islamabad. Só aí viram, pela primeira vez, os seus maridos e tiveram que passar a noite com eles. Mahek, de 19 anos, disse à AP que esteve com o marido durante um mês, durante o qual ele recebeu várias outras jovens.

Simbal Akmal, de 18 anos, foi levada para um prédio parecido com aquele, que estavam irredutíveis na urgência de a casar, apesar da recusa da rapariga. Três homens chineses desfilaram à frente dela e o pai exigiu que  escolhesse um deles.

Ela disse que não queria casar, mas ele insistiu, alegando que era “uma questão de honra”. “Eles só queriam dinheiro, já me tinham prometido a um deles”, disse a jovem. Casou e fugiu, tal como a irmã. Ambas vivem agora no campo de refugiados criado por Iqbal para estas raparigas.

A organização Human Rights Watch disse em abril que “há evidências crescentes de que as mulheres e meninas paquistanesas correm o risco de serem escravas sexuais na China”.

Na segunda-feira, autoridades paquistanesas detiveram oito chineses e quatro paquistaneses em Punjab em conexão com o tráfico de mulheres. As deteções ocorreram no âmbito de uma investigação na qual os detetives participaram num casamento arranjado. A embaixada chinesa disse no mês passado que o governo de Pequim está a colaborar com o Paquistão nas investigações da atividade.

 

ZAP //

Siga o ZAP no Whatsapp

3 Comments

  1. Engracado, como ha referencia a “há uma rede de padres,…” como se os paquinatenses fossem catolicos!!!!

    O politicamente correcto a tornar-se politicamente absurdo. Chamem as vacas pelos nomes:
    Catolicos = Padres
    Muculmanos = … digam la!

    • bem visto João! Subscrevo!
      E acrescento: as famílias que agora vêm armados em virgens ofendidas e enganadas, tenham vergonha. Por serem ganaciosas venderam as filhas. É disso que se trata: tráfico sexual. Ponto. Deixemo-nos de merdas e chamemos as coisas pelos nomes.
      Em certas culturas, outra coisa politicamente incorrecta, os filhos (na verdade, principalmente as filhas) são coisas, propriedade dos pais, que deles podem dispor livremente para o que entenderem, até para a venda.
      Curiosamente, isso, como muito bem assinalou, tem tendência a ocorrer num determinado espaço geográfico e cultura/religião…

      • Acrescento ainda que na India e Paquistão os casamentos são “regra geral”, arranjados. Digo isso com certeza de conhecer a cultura pois conheci alguns Indianos nos meus contactos profissionais. Ainda dito por quem conheci, são felizes com essa escolha e dizem que não o fariam de outra forma, ou seja e resumindo, são culturas diferentes da nossa, é como é.

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.