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Nobel bisneto de açorianos opôs-se à edição genética de bebés, mas não a denunciou

Bengt Oberger / wikimedia

Craig Mello, professor de Medicina Molecular na Universidade de Massachusetts e Prémio Nobel da Medicina em 2006, é neto de emigrantes açorianos nos EUA.

O Prémio Nobel da Medicina Craig Mello, descendente de emigrantes açorianos nos EUA, teve conhecimento prévio da edição genética de duas gémeas bebés protagonizada pelo cientista chinês He Jiankui. Há emails que atestam que ele criticou o procedimento, mas que não o denunciou.

A Associated Press (AP) teve acesso a um conjunto de mensagens de correio electrónico trocadas entre Craig Mello, professor de Medicina Molecular na Universidade de Massachusetts, nos EUA, e He Jiankui, o cientista chinês que no final de 2018 anunciou ter conseguido ajudar a nascer os primeiros bebés geneticamente modificados, e imunes ao VIH (Vírus da Imunodeficiência Adquirida).

Num desses emails, datado de Abril de 2018 e intitulado “Sucesso!”, Jiankui contou a Mello como tinha conseguido implantar os embriões de dois bebés geneticamente modificados numa mulher, garantindo que eram imunes ao VIH.

“Fico feliz por si, mas prefiro que não me mantenha informado sobre isto“, respondeu Craig Mello, como cita a AP. “Está a arriscar a saúde da criança que está a editar”, acrescentou, assumindo que não entendia “porque” é que ele estava a proceder desta forma.

Mello foi agraciado com o Prémio Nobel da Medicina em 2006, a par do professor Andrew Fire, da Universidade de Stanford, nos EUA, pela descoberta da interferência de ARN (ou ácido ribonucleico) na codificação, regulação e expressão genéticas.

A revelação destes emails indicia que Mello omitiu os planos de Jiankui, embora estivesse ciente de que não eram eticamente responsáveis.

“Acho que está a correr um grande risco e não quero que ninguém pense que aprovo isto”, chegou a escrever Mello num dos emails divulgados pela AP.

A publicação atesta que o Nobel de ascendência açoriana pode ter tido um papel mais relevante como conselheiro de Jiankui, nomeadamente por lhe ter apresentado um colega cientista que partilhou com o investigador chinês informações sobre os “riscos pediátricos da transmissão de VIH” no âmbito da experiência de edição genética.

“Não sei de nada, mas é possível que o [gene] CCR5 tenha outras funções que não saibamos, por isso há um risco de o paciente ser deficiente“, escreveu ainda Craig Mello num noutro email citado pela AP.

“Pensei que estaria interessado em aprender mais sobre edição do genoma de embriões. Não lhe darei mais novidades no futuro”, aponta Jiankui numa das respostas ao Nobel da Medicina.

Perante o conhecimento da experiência do cientistas chinês, Craig Mello não só não fez nada, apesar da sua desaprovação, como continuou como conselheiro dele na sua empresa, a Direct Genomics.

O professor de Medicina Molecular só deixou a função em Dezembro passado, já depois de as bebés geneticamente modificadas terem nascido e de a experiência ter sido publicamente divulgada por Jiankui.

Craig Mello não quis comentar estes novos emails quando contactado pela AP, mas através da Universidade, numa comunicação anterior, tinha garantido não ter conhecimento das intenções de Jiankui, referindo-se às conversas que manteve com ele sobre o assunto como meramente “hipotéticas”.

Os bisavós de Craig Mello eram oriundos de São Miguel, nos Açores, tendo emigrado para os EUA. O professor já nasceu em solo americano, no Estado de Connecticut, há 59 anos.

ZAP //

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