O cérebro cria misteriosamente mais alguns: não morremos com os neurónios com que nascemos

ZAP // Rawpixel; NightCafe Studio

O cérebro pode continuar a produzir novos neurónios na idade adulta. Mas como é que o raro nascimento destes novos neurónios contribui para a função cognitiva?

Compreender como os novos neurónios afetam a função cerebral durante a idade adulta pode oferecer novas abordagens para o tratamento da epilepsia e da demência.

Os neurónios são as células que regem o funcionamento do cérebro e o indivíduo nasce com a maior parte dos neurónios que terá durante a sua vida. Embora o cérebro passe pela maior parte do seu desenvolvimento durante o início da vida, há regiões específicas do cérebro que continuam a gerar novos neurónios ao longo da idade adulta, embora a um ritmo muito mais lento.

Se este processo de neurogénese ocorre realmente em adultos e qual a sua função no cérebro é ainda objeto de debate entre os cientistas.

Segundo o Live Science, as investigações anteriores demonstraram que as pessoas com epilepsia ou com doença de Alzheimer e outras demências desenvolvem menos neurónios na idade adulta do que as pessoas sem estas doenças. No entanto, não se sabe se a ausência de novos neurónios contribui para os desafios cognitivos que os doentes com estas doenças neurológicas enfrentam.

Uma investigação levada a cabo por uma equipa de investigadores de células estaminais, neurocientistas, neurologistas, neurocirurgiões e neuropsicólogos, revela que os novos neurónios que se formam no cérebro dos adultos estão ligados à forma como se aprende a ouvir as outras pessoas.


Os investigadores sabem que os novos neurónios contribuem para a memória e a aprendizagem nos ratos. Mas nos seres humanos, os desafios técnicos de identificar e analisar novos neurónios em cérebros adultos, combinados com a sua raridade, levaram os cientistas a duvidar da sua importância para a função cerebral.

Para descobrir a relação entre a neurogénese em adultos e a função cognitiva, os cientistas estudaram pacientes com epilepsia resistente a medicamentos. Estes doentes foram submetidos a avaliações cognitivas antes e doaram tecido cerebral durante procedimentos cirúrgicos para tratar as suas crises.

Para verificar se o número de novos neurónios de um doente estava associado a funções cognitivas específicas, procuraram ao microscópio marcadores de neurogénese.

Descobriram que os novos neurónios no cérebro adulto estão associados a um declínio cognitivo reduzido — particularmente na aprendizagem verbal, ou seja, na aprendizagem através da audição dos outros.

Isto foi muito surpreendente para os investigadores. Nos ratos, os novos neurónios são conhecidos pelo seu papel na aprendizagem e na navegação em novos espaços através da exploração visual. No entanto, a equipa de investigação não observou uma ligação semelhante entre os novos neurónios e a aprendizagem espacial nas pessoas.

Falar com os outros e recordar essas conversas é uma parte integrante do dia a dia de muitas pessoas. No entanto, esta função cognitiva crucial diminui com a idade e os efeitos são mais graves no caso de doenças neurológicas. Com o envelhecimento da população, o peso do declínio cognitivo nos sistemas de saúde a nível mundial irá aumentar.

A investigação sugere que a ligação entre os neurónios recém-nascidos e a aprendizagem verbal pode ser fundamental para o desenvolvimento de tratamentos destinados a restaurar a cognição nas pessoas.

Aumentar a geração de novos neurónios pode ser uma estratégia potencial para melhorar a saúde do cérebro e restaurar a cognição no envelhecimento e em pessoas com epilepsia ou demência. Mas, por enquanto, estas ideias são apenas objetivos e quaisquer tratamentos futuros estão ainda muito longe.

Segundo os investigadores, “é importante salientar que esta descoberta de que os novos neurónios funcionam de forma diferente em ratos e em seres humanos realça a necessidade crítica de estudar funções biológicas como a neurogénese em pessoas, sempre que possível. Isto garantirá que a investigação realizada em modelos animais, como os ratinhos, é relevante para as pessoas e pode ser transposta para a clínica”.

Os medicamentos atuais para a epilepsia têm como principal objetivo reduzir as convulsões, com um enfoque limitado no tratamento do declínio cognitivo que os doentes sofrem.

Para melhorar os resultados cognitivos dos doentes, a equipa iniciou um ensaio clínico centrado no aumento da produção de novos neurónios e da cognição em doentes com epilepsia através do exercício aeróbico.

“Estamos atualmente na Fase 1 do ensaio clínico, que procura estabelecer a segurança do estudo. Até à data, dois doentes concluíram o estudo com êxito e em segurança. Planeamos recrutar mais oito doentes para fazer exercício e concluir esta fase”, explicam o cientistas.

Ao reunir a ciência básica no laboratório e a investigação clínica nas pessoas, resultará numa melhor compreensão da regeneração cerebral pode ajudar a apoiar a saúde do cérebro ao longo de toda a vida.

Teresa Oliveira Campos, ZAP //

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