Entre os 24.620 civis mortos de forma violenta na Faixa de Gaza , 70% são mulheres e crianças. Duas mulheres e mães palestinianas foram mortas a cada hora e cerca de 20 mil bebés nasceram “no Inferno” em três meses.
Duas mulheres e mães palestinianas foram mortas a cada hora na Faixa de Gaza desde o início do conflito, há mais de três meses em 7 de outubro, e os ataques israelitas ao enclave, indicou este sábado um relatório da ONU Mulheres.
O relatório “Alerta de género: o impacto de género na crise de Gaza” assinala que entre os 24.620 civis mortos de forma violenta na Faixa de Gaza desde 7 de outubro, 16.000 são mulheres e crianças, 70% do total de vítimas mortais.
A fome generalizada na Faixa de Gaza também incide particularmente nas mulheres e raparigas, que cedem a alimentação disponível a outros membros da família, com riscos acrescidos para as grávidas e as mães em aleitamento.
Entre as 5.500 mulheres que devem dar à luz no próximo mês, 840 têm uma elevada probabilidade de sofrer complicações com o parto devido ao deficiente acompanhamento médico, e prevê-se que a única maternidade em condições de funcionamento no norte de Gaza fique sem combustível “de forma iminente”.
Existem apenas dois refúgios para mulheres, ambos na cidade de Gaza, e que se encontram encerrados devido aos bombardeamentos.
A organização assegura que a população feminina regista maiores dificuldades no acesso a alimentos, serviços e recursos, um problema que se acentua nas famílias lideradas por mulheres, que têm de alimentar, proteger e manter a famílias, e sem qualquer fonte de rendimento.
Muitas mulheres perderam os maridos no conflito, que eram o único sustento da família. O número de mulheres que garantia rendimentos já era pequeno antes da guerra e da invasão israelita, e esse número foi muito reduzido nos últimos meses. Atualmente, cerca de 3.000 famílias do enclave palestiniano são dirigidas por mulheres, precisa a ONU Mulheres.
Em paralelo, entre as 1,9 milhões de pessoas deslocadas, cerca de um milhão são mulheres e crianças, com muitas delas a permanecerem em casa para cuidar os membros da família que, devido à sua condição física ou idade avançada, não podem deslocar-se.
Devido à escassez de alimentos, encerramento das escolas e ausência de oportunidades educativas e de trabalho, muitas jovens palestinianas receiam que as suas famílias recorram a medidas desesperadas para sobreviver e as obriguem a casar.
“As mulheres e as crianças são as primeiras vítimas dos conflitos e o nosso dever de garantir a paz é um dever para com elas. Estamos a falhar. Este fracasso e o trauma geracional infligido ao povo palestiniano nestes mais de 100 dias [de guerra] vai perseguir-nos a todos durante gerações”, indicou esta sexta-feira em comunicado Sima Bahous, diretora executiva da agência da ONU.
20 mil bebés nasceram no “Inferno”
De outra perspetiva, cerca de 20 mil bebés nasceram “no Inferno” da Faixa de Gaza desde o início, há mais de três meses, da ofensiva israelita informou a UNICEF.
“Isto representa um bebé nascido a cada 10 minutos neste conflito terrível”, realçou em conferência de imprensa, Genève Tess Ingram, porta-voz do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).
De regresso da Faixa de Gaza, alvo de bombardeamentos incessantes israelitas, Ingram relatou vários casos testemunhos da situação de pesadelo que as grávidas, as mães lactantes e os bebés estão a viver.
Uma enfermeira, chamada Webda, disse-lhe que fez cesarianas de urgência a seis mulheres mortas nas últimas oito semanas e que perdeu a conta aos abortos ocorridos por causa do ar viçado e do fumo dos bombardeamentos.
Também relatou o caso de uma palestiniana grávida de seis meses, Amal, enterrada sob os escombros depois de um ataque. O bebé não mexeu durante uma semana, até que nasceu com boa saúde, uma semana antes do encontro com Ingram. No caos da guerra, a jovem mãe não teve outra escolha que não fosse sair do hospital quase a seguir, com a sua pequena Sama, e ir para um abrigo precário nas ruas de Rafah.
“Ser mãe deveria ser uma festa. Na faixa de Gaza, isso significa pôr uma criança no Inferno“, resumiu Tess Ingram, para quem isto “ultrapassa a capacidade de entendimento”.
A representante da UNICEF apelou a uma ação internacional imediata face a uma situação que “a Humanidade não pode considerar como normal” e vincou que só tinha tido acesso à parte sul da Faixa de Gaza e que no norte a situação é “infinitamente pior”.
Indignada, detalhou: “Ver os bebés a sofrer devíamos impedir de dormir”, acrescentando: “Saber que duas crianças israelitas raptadas em 7 de outubro ainda não foram libertadas, também nos deveria impedir de dormir”.
Entre as jovens parturientes com quem esteve, Iman disse-lhe como tinha corrido aterrorizada nas ruas bombardeadas de Gaza, grávida de oito meses. “Hoje, 46 dias depois de uma cesariana, está hospitalizada por uma grave infeção e demasiado fraca para segurar o seu bebé, Ali, nos braços”, contou Ingram.
O hospital Emirados, em Rafah, acolhe a grande maioria das grávidas da Faixa de Gaza, segundo a UNICEF. Mas o pessoal, submerso com a afluência de pessoas e recursos limitados, está obrigado a fazer sair as mães três horas depois de uma cesariana.
Mas, depois do parto, o calvário apenas começou. Tudo falta: alimentação, água potável, cuidados médicos, abrigo adequado…
Para os bebés, isto traduz-se em “taxas elevadas de desnutrição, problemas de desenvolvimento e outras complicações de saúde”, indicou a UNICEF.
A Agência da ONU estima em “cerca de 135 mil” o número de crianças com menos de dois anos ameaçados de malnutrição severa.
A taxa atual de mortalidade infantil na faixa de Gaza é impossível de saber, mas “pode-se, sem problemas, dizer que as crianças morrem hoje tanto por causa da crise humanitária, como por causa dos bombardeamentos e dos tiros”, acrescentou Ingram.
“As mães e os recém-nascidos precisam de um cessar-fogo humanitário”, concluiu.
ZAP // Lusa
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