Há um novo buraco negro “no nosso quintal”

ESA/Hubble, DSS, Nick Risinger (skysurvey.org), N. Bartmann

Impressão de artista de um buraco negro à deriva pela nossa Galáxia, a Via Láctea.

A descoberta de um chamado buraco negro monstruoso, que tem cerca de 12 vezes a massa do Sol, está descrita num novo artigo submetido à revista The Astrophysical Journal, cuja autora principal é Sukanya Chakrabarti, professora de física na Universidade do Alabama em Huntsville, EUA.

“Está mais perto do Sol do que qualquer outro buraco negro conhecido, a uma distância de 1550 anos-luz”, diz Sukanya Chakrabarti, catedrática do Departamento de Física. “Portanto, está praticamente no nosso ‘quintal'”.

Os buracos negros são vistos como exóticos porque, embora a sua força gravitacional seja claramente sentida por estrelas e por outros objetos na vizinhança, nenhuma luz pode escapar a um buraco negro, pelo que não podem ser vistos da mesma forma que as estrelas visíveis.

“Em alguns casos, como para o dos buracos negros supermassivos nos centros das galáxias, podem impulsionar a formação e evolução galáctica“, explica Chakrabarti.

“Ainda não é claro como estes buracos negros não-interativos afetam a dinâmica galáctica na Via Láctea. Se forem numerosos, podem muito bem afetar a formação da nossa Galáxia e a sua dinâmica interna”.

A descoberta foi apresentada num artigo pré-publicado no arxiv e enviado para publicação no Astrophysical Journal.

Para encontrar o buraco negro, Chakrabarti e uma equipa de cientistas analisaram dados de quase 200.000 estrelas binárias divulgados durante o verão pela missão Gaia da ESA.

“Procurámos objetos que alegadamente tinham grandes massas companheiras, mas cujo brilho podia ser atribuído a uma única estrela visível”, diz. “Por isso, temos uma boa razão para pensar que a companheira é escura“.

Fontes interessantes foram acompanhadas com medições espectrográficas de vários telescópios, incluindo o APF (Automated Planet Finder) no estado norte-americano da Califórnia, os Telescópios Magalhães no Chile e o Observatório W. M. Keck no Hawaii.

“A atração do buraco negro sobre a estrela visível parecida com o Sol pode ser determinada a partir destas medições espectroscópicas, que nos dão uma velocidade de linha de visão devido ao efeito Doppler”, diz Chakrabarti.

SDSS/S. Chakrabarti et al.

A estrela parecida com o Sol, que tem como companheiro um buraco negro, está no centro desta imagem.

O efeito Doppler é a mudança de frequência de uma onda em relação a um observador, tal como a forma como o som da sirene de uma ambulância muda à medida que passa por nós.

“Ao analisar as velocidades da linha de visão da estrela visível – e esta estrela visível é semelhante ao nosso próprio Sol – podemos inferir quão massivo é o buraco negro companheiro, bem como o período de rotação e quão excêntrica é a órbita”, diz.

“Estas medições espectroscópicas confirmaram independentemente a solução Gaia que também indicou que este sistema binário é composto por uma estrela visível que está em órbita de um objeto muito massivo“.

O buraco negro tem de ser inferido a partir da análise dos movimentos da estrela visível, porque não está a interagir com a estrela luminosa.

Os buracos negros não-interativos não têm tipicamente um anel de acreção de poeira e material que acompanha os buracos negros que estão a interagir com outro objeto.

A acreção torna o tipo de interação relativamente mais fácil de observar opticamente, razão pela qual foram encontrados muitos mais deste tipo.

“A maioria dos buracos negros em sistemas binários são binários de raios-X – por outras palavras, são brilhantes em raios-X devido a alguma interação com o buraco negro, muitas vezes devido ao buraco negro que devora a outra estrela“, diz  Chakrabarti.

“À medida que o material da outra estrela cai neste profundo poço gravitacional, podemos ver raios-X”.

Estes sistemas em interação tendem a estar em órbitas de curto período, acrescenta.

“Neste caso estamos a olhar para um buraco negro monstruoso, mas está numa órbita de longo período de 185 dias, ou cerca de meio ano. Está bastante longe da estrela visível e não está a fazer quaisquer avanços na sua direção”.

As técnicas que os cientistas utilizaram também devem ser aplicáveis à descoberta de outros sistemas não interativos.

“Esta é uma nova população sobre a qual estamos apenas a começar a aprender e que nos dirá mais sobre a formação dos buracos negros, de modo que tem sido muito excitante trabalhar nisto”, diz Peter Craig, candidato a doutoramento no Instituto de Tecnologia de Rochester que é orientado por Chakrabarti.

“Estimativas simples sugerem que, na nossa Galáxia, existem cerca de um milhão de estrelas visíveis que têm buracos negros enormes como companheiros“, realça  Chakrabarti.

“Mas há cem mil milhões de estrelas na Via Láctea, por isso é como procurar uma agulha num palheiro. A missão Gaia, com as suas medições incrivelmente precisas, facilitou e restringiu a nossa procura”.

Os cientistas estão a tentar compreender as vias de formação dos buracos negros não-interativos.

“Existem atualmente várias maneiras diferentes propostas pelos teóricos, mas os buracos negros não-interativos em torno de estrelas luminosas são um tipo de população muito novo,” comenta Chakrabarti.

“Por isso, é provável que demoremos algum tempo a compreender a sua demografia, como se formam e como estas maneiras são diferentes – ou se são semelhantes – da população mais conhecida de buracos negros em interação”.

// CCVAlg

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