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Franceses indignados com isenção fiscal dada por Portugal a reformados

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Portugal também entrou no “grande debate” em França devido ao regime de isenção fiscal concedido aos reformados e que levou muitos cidadãos franceses a sugerirem a retirada de benefícios dos seus concidadãos que se instalem no país.

Opiniões e propostas partilhadas no site do “grande debate” – uma iniciativa do Presidente francês, Emmanuel Macron, para responder aos protestos dos coletes amarelos – chamam aos franceses que estão a usufruir da isenção fiscal durante 10 anos em Portugal “exilados fiscais” e a Portugal “um eldorado fiscal”.

O regime fiscal dos Residentes Não Habituais (RNH) foi criado em 2009 com o objetivo de atrair para Portugal pessoas de rendimentos elevados e profissionais de alto valor acrescentado, oferecendo isenção de IRS aos reformados e uma taxa reduzida de imposto (20%) aos rendimentos de trabalho.

“Os exilados fiscais reformados que vivem há seis meses em Portugal e, brevemente, em Itália, continuam a receber a sua pensão dada pelos organismos públicos. É fácil identificá-los. No entanto, eles continuam a vir tratar-se em França gratuitamente apesar de já não contribuírem para o nossos sistema social. É preciso que paguem os preços reais dos tratamentos médicos que recebem”, escreveu o utilizador que se identificou como V marc.

Apesar de uma parte da discussão sobre os mais diversos temas desde o funcionamento da democracia até à fiscalidade em França ter acontecido em reuniões públicas, uma parte das quase dois milhões de propostas feitas pelos franceses chegaram através da Internet. Estas propostas foram recebidas de janeiro a meados de março e serão todas analisadas de forma a darem origem a medidas a aplicar pelo Governo.

Outra proposta para sancionar quem se muda para Portugal ou outros países que promovem isenções fiscais é o corte de 50% das pensões atribuídas por França.

“É preciso fazer pagar de alguma maneira todos os reformados que partem para fugir aos impostos em França, já que como não consomem aqui, o seu dinheiro não volta a entrar na economia francesa. Eles empobrecem a França. É um verdadeiro escândalo e uma prova de grande egoísmo”, sugeriu outro utilizador no site oficial do “grande debate”.

Para além de críticas aos seus concidadãos, os franceses estão preocupados com o impacto desta medida portuguesa e pedem que haja uma análise “sem tabus” aos acordos com Portugal.

“É importante abrir um debate sem tabu sobre este dispositivo, que leva a uma dupla isenção dos reformados franceses que se mudam para Portugal. Esta dupla isenção leva a que os Estados sejam privados de receitas fiscais e promovem concorrência desleal entre os Estados-membros da União Europeia”, escreveu um utilizador que se identificou como Porto e que apelidou a sua proposta de “acabar com a evasão fiscal no eldorado português”.

O sistema adotado por Portugal para atrair reformados tem sido debatido em França depois de algumas declarações polémicas de estrelas da música e do cinema que afirmaram publicamente que se mudavam para terras lusas devido à isenção fiscal.

Em 2017, Florent Pagny, cantor e ator, disse numa entrevista que iria viver para Portugal “por razões fiscais“, enumerando todas as vantagens dadas aos estrangeiros que se instalam no país. Esta entrevista levou o ministro da Economia e das Finanças, Bruno Le Maire, a convidar o artista a ficar em França, afirmando que o Governo estava a preparar medidas adicionais para manter as grandes fortunas em território nacional.

Portugueses sem visibilidade no “grande debate”

A comunidade portuguesa residente em França não teve uma grande participação no “grande debate nacional”, disseram à Lusa eleitos locais lusos, que se mostraram pouco confiantes na eficácia desta iniciativa.

Macron encerrou oficialmente o “grande debate” esta semana com uma visita à Córsega e um último debate com a população local. A iniciativa lançada pelo Presidente para combater o movimento dos coletes amarelos teve uma grande adesão, abrangendo cerca de 98% do território, originando mais de 10.000 debates por todo o país e quase dois milhões de propostas. No entanto, em algumas cidades, a comunidade portuguesa não respondeu ao apelo.

“Em Antony, nos debates em que participei, não vi a comunidade portuguesa presente. Mas também não vi outras comunidades que poderiam lá estar. Assim como não vi juventude nem representantes dos bairros mais sensíveis”, indicou Rosa Macieira Dumoulin, portuguesa e conselheira municipal da cidade de Antony, nos arredores de Paris, onde há uma comunidade significativa de portugueses e lusodescendentes.

A eleita local pelo partido Les Republicains considera que acabaram por “participar as pessoas que participam sempre” e aponta a falta de informação como explicação: “Uma das razões para a falta de participação da comunidade portuguesa talvez tenha sido que a informação chegou tarde, portanto é preciso comunicar de outra maneira com os habitantes”, indicou Rosa Macieira Dumoulin.

Também em Bordéus, uma cidade onde o ex-presidente da câmara, Alain Juppé, cultivou desde a sua eleição um debate ativo com a população, Ana-Maria Torres, portuguesa e conselheira municipal, afirmou não ter visto um interesse ou participação intensa da comunidade lusitana.

“Estou convencida de que na sala onde estava havia portugueses, mas não aparecem como portugueses. Ninguém poderá dizer qual é a participação dos portugueses porque estão de tal forma bem inseridos em França que não há distinção. Isso acontecia, talvez, há 50 anos. Agora não”, indicou Ana-Maria Torres, eleita como independente.

Já em Metz, os portugueses apareceram preocupados com as questões da fiscalidade, reformas e aumentos dos impostos em França.

“Organizámos debates com quatro datas sobre as quatro temáticas escolhidas pela Governo. A data onde apareceram mais portugueses foi a que teve a ver com a fiscalidade. […] Há muitos lares, nomeadamente na comunidade portuguesa, em que trabalharam os dois a vida inteira e estão no limiar de rendimentos de reforma que não é muito alto”, contou Nathalie de Oliveira, conselheira municipal em Metz eleita pelo Partido Socialista.

A fiscalidade, como o regresso do imposto sobre as grandes fortunas e os impostos aplicados aos reformados, é um dos temas quentes nos protestos dos coletes amarelos e também no “grande debate”.

“O impacto das medidas deste Governo foi muito negativo e, mais do que um debate sobre a democracia participativa e institucional, as pessoas que participaram em Metz levantaran a questão da justiça social e fiscal”, disse Nathalie de Oliveira.

O “grande debate” teve um custo de 12 milhões de euros e levou cerca de 500 mil pessoas a encontros organizados pelas autoridades locais, mas também por associações e até igrejas. Uma grande parte das contribuições surgiu também através da internet.

Houve perto de dois milhões de propostas nos últimos dois meses, das quais sairão até ao final do verão algumas medidas sobre as quais o Governo pretende legislar, segundo indicou Sébastien Lecornu, ministor adjunto da Coesão Territorial, à publicação “Journal du dimanche”. A análise das propostas será feita através da utilização de inteligência artificial e a síntese final será entregue ao Governo pelo instituto de sondagens OpinionWay.

No entanto, nas cidades em França não há grande esperança de mudança com estas propostas. “As pessoas pensam que não serve para nada e têm o sentimento que o debate existe, mas que depois não há grandes mudanças. Falta esperança na política francesa”, lamentou Rosa Macieira Dumoulin.

Uma opinião partilhada pela eleita de Metz: “Não há nenhuma forma de esperança nos resultados deste grande debate. Até o próprio Governo diz que não vale a pena ter grandes ilusões. O Governo optou por um caminho, que a população considera injusto, especialmente muitos reformados da primeira geração de portugueses que vieram para aqui”, disse Nathalie de Oliveira, acrescentando que, em França, “sempre que há um levantamento generalizado da população está ligado ao aumento dos impostos”.

Para Ana-Maria Torres, esta iniciativa não teve qualquer impacto no movimento e, sendo Bordéus umas das cidades mais fustigadas pela violência, teme que os estragos continuem. “Na minha opinião, não teve impacto nenhum e a prova é que há sábados onde a ação dos coletes amarelos é bastante violenta. Eu penso que isto vai terminar logo a seguir às eleições europeias, até aí não há grandes mudanças”, concluiu a eleita.

O protesto organizado pelo 21.º sábado consecutivo pelos coletes amarelos registou este sábado o seu mais baixo nível de participação desde o início do movimento de contestação, em novembro, com 22.300 pessoas em toda a França e 3.500 em Paris.

ZAP // Lusa

13 Comments

  1. E não ficam indiganados com os paraísos fiscais manhosos como o Luxemburgo (para onde a França perde milhões todos os dias), com a Irlanda, a Holanda, etc?!
    Estranho…

  2. Estão preocupados c/ Portugal e as benesses que dão aos reformados de outros países mas NINGUÉM se preocupou c/ as benesses nos impostos que certos países Europeus deram e continuam a dar ás empresas dos outros países Europeus, e neste casos não serão milhares de euros mas sim MILHÕES euros.
    Até a migalha querem tirar aos mais pequenos… Senão não estão de acordo façam leis que vos protejam mais NADA. Agira não têm o direito de criticar os outros que tenham ir buscar uma fonte de receita ao turista.

  3. Os reformados querem todos vir para cá, porque como dizia o outro, isto aqui é só p*#$% e vinho verde!

  4. Eu só gostaria de ver os reformados portugueses serem tratados da mesma forma que os estrangeiros, ou seja, com isenção fiscal durante 10 anos após o início da reforma.
    O que acontece é que os reformados portugueses atingem isenção fiscal definitiva, quando morrem…
    É o país que temos…

    • Isso é mentira. Mesmo depois de mortos ainda pagam impostos, pelo menos o imposto de selo nalgumas situações pode ser exigível (obviamente que não diretamente ao falecido). E não se esqueça que também já tivemos imposto sucessório.
      Mas também me parece correto que os mortos paguem impostos. Afinal de 4 em 4 anos muitos também aparecem para votar. Se votam então também devem pagar impostos.

    • E são – desde que sejam reformados portugueses que recebam a pensão de outro país e não tenham residido em Portugal nos últimos 5 anos!
      Além disso, esses reformados só estão isentos porque o país de origem concordou com possibilidade de ser o país de residência a cobrar os impostos (e Portugal abdica deles durante 10 anos!) .
      Se a França não os cobra logo, a culpa é deles porque, se são eles quem paga as pensões, eles é que deveriam cobrar os impostos – tal como faz agora a Finlândia!!
      Os impostos devem ser sempre pagos onde é “gerada a riqueza” e, se assim fosse, não havia cá na UE, Luxemburgo’s, Irlanda’, Holandas’, etc, a recolher os dividendos do trabalho dos outros!!

      • Intendite.
        Eu falei dos reformados portugueses, para bom entendedor, daqueles que são reformados em Portugal.
        Os portugueses que recebem a pensão de outro país são reformados de outro país.
        Mas tu entendeste-me, tinhas era que tentar mostrar que sabes tudo mais e melhor.
        Assim seja.

  5. Estou a tentar saber algo… mas os meus pais estão reformados e continuam a pagar impostos!
    Será que não lhes contaram tudo e afinal andam a descontar para nada!

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