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A um mês da extinção do SEF, 270 mil vistos de residência ainda estão “na gaveta”

Mário Cruz / Lusa

Falta de clareza nos números exatos e a expectativa de que o número possa ser ainda maior levanta preocupações sobre a capacidade da sucessora AIMA em lidar com este volume de casos.

Portugal vive um momento importante na gestão da migração e asilo com a extinção iminente do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e a sua transição para a nova Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA).

A cerca de 30 dias da extinção do SEF, a mudança surge num cenário complexo marcado pelo aumento significativo dos pedidos de visto de residência. Segundo estimativas, a AIMA herda cerca de 270 mil pedidos de visto de residência, com um ritmo médio de mil novas manifestações de interesse (MI) por dia.

Estes números incluem apenas pedidos sob os regimes de exceção do artigo 88 e 89 da Lei de Estrangeiros, que permitem a regularização de imigrantes com contrato de trabalho e contribuições para a Segurança Social.

O porta-voz oficial do SEF não revela quantos imigrantes foram, de facto, regularizados.

Numa resposta pouco clara ao Diário de Notícias refere apenas que “a implementação, em março deste ano, do novo modelo de concessão de Autorização de Residência a cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (AR CPLP) permitiu recuperar cerca de 150 mil das MI pendentes. A par da resolução das situações, cujos requerentes optaram pelo modelo de AR CPLP, já foram notificados mais de 160 mil dos cidadãos que efetuaram os respetivos pedidos de MI”.

Desde a entrada desta lei em vigor em 2017 que se tem registado um atraso significativo nos agendamentos do SEF. O volume destes casos, juntamente com aqueles que não se completam devido à falta de documentação, fez com que os agendamentos sofressem atrasos consideráveis.

Apesar dos atrasos, a população estrangeira com a situação legalizada em Portugal duplicou desde 2016, chegando a mais de 700 mil residentes no final de 2022, dos quais 400 mil serão de nacionalidade brasileira.

Durante a pandemia, o SEF tinha mais de 300 mil manifestações de interesse paradas. A agência conseguiu regularizar cerca de 150 mil, enquanto outros aproveitaram os novos vistos de mobilidade CPLP.

“Nessa altura, o SEF começou a fazer agendamentos por ordem cronológica de registos e limpou a lista até, pelo menos, fevereiro de 2022, tendo sido chamados os que tinham feito o seu pedido até essa data e ainda se encontravam no país. Conseguimos regularizar cerca de 150 mil e cerca de 140 mil aproveitaram os novos vistos de mobilidade CPLP”, sublinha uma das fontes do Diário de Notícias.

De acordo com inspetores e pessoal administrativo que acompanham esta matéria, há falta de clareza nos números exatos e a expectativa de que o número de casos pendentes possa ser ainda maior levanta preocupações sobre a capacidade da AIMA em lidar com este volume.

Adicionalmente, há preocupações em relação à formação dos funcionários civis que transitam para a AIMA, particularmente para lidar com pedidos de asilo. Foi revelado que inspetores do SEF continuarão a ser necessários na nova agência para a instrução destes pedidos, o que contradiz a ideia original de separar as funções policiais das administrativas.

Representantes sindicais do SEF têm alertado para a necessidade de formação especializada para lidar com questões de asilo, uma formação que poderia levar entre seis meses a um ano. Durante esse período, a AIMA terá de contar com a assistência de inspetores para continuar o trabalho.

Esta transição levanta várias questões importantes, como a eficácia da AIMA em gerir o elevado número de pedidos de residência e asilo, a formação dos seus funcionários e o futuro das funções policiais dentro da agência. Tudo isto ocorre num contexto onde falta clareza em vários aspetos, como o número exato de casos pendentes e o plano de formação para os funcionários da nova agência.

A transição do SEF para a AIMA é ocorre a 29 de outubro mas enfrenta ainda dificuldades face os desafios de gestão administrativa e de política migratória.

Em novembro de 2022, o ministro da Administração Interna José Luís Carneiro avançou que seria este ano que iria “concretizar-se a reestruturação do SEF, que permite separar as funções policiais de controlo e de gestão de fronteiras e as funções administrativas de acolhimento, de integração de imigrantes e de asilo”, antes adiada até à criação da AIMA.

Sabe-se já que a AIMA será equiparada a entidade pública empresarial e que os seus responsáveis terão “o estatuto de gestor público para efeitos remuneratórios”, como atesta o Diário de Notícias (DN), citando o decreto-lei que está em preparação.

O conselho diretivo da AIMA deverá ser composto por um presidente e dois vogais. O salário do presidente pode atingir “mais de 8000 euros” e o dos vogais “mais de 6000”, nota o DN.

A APMA ficará sob a alçada da Presidência de Conselho de Ministros e vai ter como missão “concretizar as políticas públicas em matéria migratória e de asilo, nomeadamente a de regularização da entrada e permanência de cidadãos estrangeiros em território nacional”, aponta o decreto-lei de reestruturação do SEF.

Além disso, vai também “emitir pareceres sobre os pedidos de vistos, de asilo e de instalação de refugiados, assim como participar na execução da política de cooperação internacional do Estado português no âmbito das migrações e asilo”.

ZAP //

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