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A honestidade é prioridade para os cidadãos — mas não para os deputados

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António Cotrim / Lusa

Uma mão a segurar um cravo na Assembleia da República, durante as cerimónias do 25 de Abril

Ética e integridade na política: estudo tentou perceber o que pensam os portugueses da democracia e da corrupção. Há divergências evidentes.

Um estudo do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, para a Fundação Francisco Manuel dos Santos, quis perceber o que pensam os portugueses da democracia e da corrupção.

A análise chama-se Ética e integridade na política, apresenta-se como inédita no país, e surge para analisar os efeitos dos episódios de corrupção que minam a credibilidade das principais instituições democráticas em Portugal: partidos políticos, Parlamento e Governo.

Com dois inquéritos, um feito a políticos e outro à opinião pública, tentou perceber-se, por exemplo: se as expectativas sobre a ética na política são as mesmas nos dois grupos, ou se os políticos têm noção das consequências da má conduta ética nas suas funções.

Uma infografia mostra uma divergência evidente: a honestidade é uma prioridade para os cidadãos – mas não para os deputados e para os autarcas.

Entre os 1020 cidadãos que participaram neste estudo, 60% consideraram que a honestidade é o valor principal em democracia; só 15% dos 66 deputados acham o mesmo e apenas 20% dos autarcas (55) também colocam a honestidade como prioridade.

Então qual é o principal valor em democracia para os deputados? Igualdade, com 62% das respostas. Para os autarcas, a prioridade é a transparência (78%).

A seguir à honestidade, os cidadãos portugueses acham que a igualdade (44%) é mais importante do que a transparência (34%) e do que a legalidade (16%).

Para os deputados, a honestidade é mesmo o valor menos importante em democracia: a igualdade sobrepõe-se à legalidade (44%), à transparência (41%) e à honestidade.

Os autarcas também colocam a honestidade no fundo. À frente estão, além da transparência, a igualdade (40%) e a legalidade (22%).

Falando sobre corrupção, os cidadãos associam sobretudo uma palavra a esse crime: “políticos”. Seguem-se “dinheiro” e “ladrões”. Já os autarcas e deputados associam corrupção a “desonestidade”, à frente de “compadrio” ou “favorecimento”.

É ou não é corrupção?

O estudo deixou também a pergunta “É ou não é corrupção?”, deixando vários exemplos para os inquiridos avaliarem entre 0 e 10, sendo que 0 correspondia a “não é corrupção” e 10 significava “é corrupção”.

Também aqui houve diferenças significativas, sobretudo neste exemplo: o Governo compra máscaras caras e sem concurso, para combater a pandemia. Neste caso, os autarcas e deputados acham que não é corrupção (nota de apenas 3,1) mas os cidadãos classificaram este caso com 7,1 – dizendo que é corrupção.

Outros dois exemplos de divergência. Um ministro nomeia genro como assessor de limpeza: 4,8 para autarcas e deputados, 7,9 para cidadãos; ou ainda um autarca que atribui contrato a construtora que financiou a sua campanha, com nota 5,5 entre autarcas e deputados e 8,2 entre os cidadãos.

Há alguns tópicos que mereceram praticamente um consenso entre os dois grupos, com avaliações próximas do 9: vereador utiliza máquinas de autarquia para obras na sua quinta, funcionário público acelera processos em troca de gratificações, ou director municipal cobra por projecto aprovado donativo para uma IPPS que esse director preside.

Inaceitáveis – só para cidadãos

Este estudo também mostrou (confirmou) que, enquanto os políticos tendem a avaliar as condutas éticas dentro de parâmetros estritamente legais e formais, os cidadãos têm uma concepção mais abrangente e a considerar inaceitáveis várias práticas e condutas que os políticos veem como normais em política.

Os políticos costumam ser intransigentes em relação à corrupção de mercado – comportamentos marcadamente ilegais e que implicam a venda de decisões – mas desvalorizam as práticas que não configurem uma violação da lei, ou que não estejam devidamente reguladas: conluio e redes de influência, por exemplo, através das quais as elites políticas procuram assegurar vantagens económicas para grupos de interesses com os quais mantêm relações estreitas.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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