Imagens cerebrais dos diplomatas norte-americanos que ficaram doentes enquanto serviam em Cuba mostraram estranhas anormalidades cerebrais após o alegado ataque sónico relatado em 2016 que podem estar relacionadas com os sintomas sentidos, revela um novo estudo.
A nova investigação, cujos resultados foram publicados esta semana na revista científica Journal of American Medical Association, é mais um esforço para resolver o mistério que a administração do Presidente Donald Trump descreveu como um “ataque sónico”.
No fim de 2016, recorde-se, e depois de serem surpreendidos por um ruídos agudos e persistentes, vários diplomatas norte-americanos que serviam na Embaixada de Cuba adoeceram, apresentando sintomas que incluíam dores de cabeça, dores de ouvidos, vertigens, náuseas e perda auditiva.
Agora, uma equipa de cientistas da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, revela que utilizou tecnologias avançadas de imagens cerebrais e detetou diferenças nos cérebros dos diplomatas norte-americanos que terão sido expostos ao fenómeno.
Os especialistas compararam os cérebros dos diplomatas com voluntários saudáveis, tal como explicou à agência Reuters o autor principal do estudo, Ragini Verma. Os cientistas dizem ter encontrado diferenças “bastantes surpreendentes”.
De acordo com o estudo agora publicado, os exames constataram que os funcionários da Embaixada tinham, em média, volumes menores de “matéria branca”, o tecido composto de feixes de nervos que enviam mensagens pelo cérebro.
Os cientistas encontraram ainda diferenças micro-estruturais e outras mudanças que poderiam afetar o processamento auditivo e viso-espacial.
Contudo, a equipa que levou a cabo os testes frisou que os resultados foram inconclusivos: as diferenças encontradas não correspondem ao que normalmente é observado numa lesão cerebral. Ou seja, o estudo não deixa claro se os padrões cerebrais observados traduzem diretamente problemas de saúde significativos.
Ainda assim, nota o co-autor do estudo Randel Swanson em declarações ao Live Science, “algo aconteceu pelo menos a um subconjunto deste subconjunto destes pacientes”. O cientista ainda que as mudanças observadas podem ter causado alguns dos sintomas relatados pelos diplomatas.
Metodologia do estudo questionada
O chefe do Centro de Neuro-ciências de Cuba, Valdés Sosa, que tem investigado as afirmações dos Estados Unidos sobre o alegado ataque sónico, disse, citado pela emissora NBC, que a metodologia utilizada no estudo contem “motivos de preocupação”.
Entre os aspetos que questiona, Valdés Sosa mencionou a composição do grupo de controlo utilizado para a comparação e as próprias alterações cerebrais que, segundo o cientista, podem ser resultado de “muitos fatores”, como “estados psicológicos”.
“O aspeto mais preocupante é a tentativa de ligar estas descobertas com um fenómeno direcional não especificado (…) As investigações nesta área foram secretamente escondidas e conduzidas pela paranoia da Guerra Fria”, apontou.
Por sua vez, Havana rejeitou o novo relatório da universidade norte-americana. “Cuba pede mais uma vez ao Governo dos Estados Unidos que cesse o uso e ponha um fim à utilização do termo ‘ataque’, que não teve subsistência antes e que não tem sustento agora”, afirmou a sub-diretora geral da Direção dos Estados Unidos do Ministério das Relações Exteriores de Cuba, Johana Tablada, citada pela Reuters.
“Cuba pede ao Governo dos Estados Unidos que ponha fim à manipulação desta questão como pretexto para impor mais medidas de agressão contra a integridade do nosso país, da economia e do povo cubano”, rematou.
Dos grilos até à histeria coletiva
Desde que os diplomatas norte-americanos em Havana começaram a relatar sons estranhos que ouviam nas suas casas, surgiram já várias teorias sobre o que terá acontecido. Há a versão do “ataque sónico”, dos grilos e até de uma histeria coletiva.
Devido ao incidente, Washington reduziu o quadro de funcionários diplomáticos em mais de 50% e acusou as autoridades de Cuba de levarem a cabo “ataques sónicos. Esta acusação tem sido questionada por vários especialistas que defendem que ainda ninguém foi capaz de criar estas armas ultrassónicas. Cuba sempre rejeitou esta hipótese.
Em janeiro de 2019, uma equipa de cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos, e da Universidade de Lincoln, no Reino Unido, apontou que o fenómeno possa ter sido produzido por um chilrear de grilos. De acordo com o estudo, os ruídos pertenciam ao grilo de cauda curta (Anurogryllus celerinictus), um inseto muito famoso pelos seus grunhidos durante o acasalamento
Contudo, o estudo foi também questionado, havendo cientistas a afirmar que o som do inseto por si só não era capaz de causar tais sintomas. Outros especialistas há que defendem a possibilidade de os diplomatas terem sofrido um fenómeno de histeria coletiva.