Porque é tão difícil contratar governantes?

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Mecanismo das 36 perguntas é um “passo na direcção certa” mas pode ser insuficiente; e só responde a um dos riscos no processo de escolha.

Uma, duas, três… Mais de uma dezena de demissões no Governo liderado por António Costa, em menos de um ano.

Num Governo socialista (de maioria absoluta), fica a sensação de que os sucessores escolhidos são as alternativas das alternativas.

Em conversa na rádio Antena 1, a jornalista Eduarda Maio sugeriu mesmo que os partidos – PS neste caso – estão a ir ao “fundo do baú” para escolher governantes. Está difícil captar pessoas para o Governo

Porquê? Carlos Jalali tem resposta para isso.

O especialista em Ciência Política começou por dizer que há quadros de alto nível, de qualidade, dentro dos partidos. O leque de escolhas torna-se ainda mais considerável se os partidos admitirem contratar independentes – que estejam alinhados com o programa do Governo, sem precisarem de ser militantes.

Mas depois as dúvidas instalam-se entre os eventuais eleitos. O centro das dúvidas é o quadro institucional interno de cada partido, o ambiente partidário.

E, aí, há dois caminhos. Primeiro: os eventuais eleitos perguntam se os quadros institucionais internos dos partidos atraem pessoas que querem fazer algo pela sociedade, que não querem imiscuir-se em práticas menos correctas, ilegais – “ou legais, mas eticamente reprováveis”.

Ou então, o segundo caminho: os “atalhos” que se multiplicam na política. “Questionam se o ambiente interno dos partidos propicia a ascensão na carreira daqueles que estão dispostos a cortar atalhos pelas práticas éticas”.

36 perguntas

Nesta conversa na Antena 1, o professor na Universidade de Aveiro falou sobre o novo mecanismo das 36 perguntas, ao qual os futuros ministros ou secretários de Estado vão ser sujeitos.

No processo escolha de governantes, analisou Carlos Jalali, há dois desafios para quem selecciona.

O primeiro é saber se a pessoa tem comportamentos éticos adequados; isto, antes de fazer a escolha. “Há o risco de escolher a pessoa errada porque, no momento da escolha, não é possível encontrar problemas éticos, esqueletos no armário”.

O segundo risco, mais tarde, é o risco moral: “Quando um ministro desempenha as suas funções para beneficiar os seus próprios interesses e não os interesses do país”.

Estas 36 perguntas são uma tentativa de “minimizar o risco antes da escolha, tentar fazer uma fiscalização prévia, que permita evitar que sejam seleccionadas pessoas que não cumprem esses requisitos éticos”.

Jalali acha que este é “um passo na direcção certa”. Mas falta saber “se é um passo suficiente na direcção certa”.

“E é um mecanismo que não responde ao segundo risco: o que os ministros fazem depois de serem escolhidos. E aqui entra também a questão do percurso dos ministros depois de deixarem a carreira política”, avisa.

Carlos Jalali considera que está na altura de mudar a perspectiva sobre ética: “A ética não pode ser apenas uma questão legal. Não podemos defender que ‘se é legal, é ético’. É algo que abre a porta de se contornar a lei. Porque cada lei tem uma forma de ser contornada”.

Susana Coroado, investigadora no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, acrescentou: “Há determinados valores da classe política que não estão alinhados com as expectativas da sociedade”.

“Temos sociedades mais exigentes, um escrutínio mediático cada vez maior. E estas polémicas graves, esta falta de alinhamento, falta de valores, faz com que as pessoas recrutadas para Governo ou partidos, para a opinião pública, não estejam alinhadas com o que o resto da sociedade entende como fundamental e ético”, analisou a especialista.

ZAP //

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